Programas antitabagismo ajudam fumantes a perder o vício

Em Goiânia, 10,3% da população ainda fuma. Cerca de 7 milhões de pessoas morrem ao redor do mundo por conta do cigarro

Postado em: 21-05-2018 às 16h00
Por: Victor Pimenta
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Em Goiânia, 10,3% da população ainda fuma. Cerca de 7 milhões de pessoas morrem ao redor do mundo por conta do cigarro

Victor Lisita*

Realizado no dia 31 de maio, o Dia Mundial Sem Tabaco visa
colaborar para a proteção das gerações do presente e do futuro contra o
tabagismo e os graves desdobramentos à sociedade, saúde e meio ambiente
advindos dele. Entre 2006 e 2016, o número de fumantes em Goiânia teve um recuo
de 26,5%, de acordo com o levantamento da Vigilância e Fatores de Risco e
Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel). Ainda assim,
a Capital está presente entre as cidades com maior percentual de tabagistas,
com a taxa de 10,3%, o que a deixa atrás apenas do Distrito Federal (10,7%),
Belo Horizonte (10,9%), Rio de Janeiro (11,2%), Campo Grande (11,6%), São Paulo
(13,2%), Porto Alegre (13,6%) e Curitiba (14%).

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A Agência
Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) divulgou que, anualmente, cerca de 7
milhões de pessoas de pessoas morrem ao redor do mundo em decorrência do
consumo do tabaco. No Brasil, é a principal causa de morte evitável. As
consequências do fumo sempre chegam, e não foi diferente paraocorretor de
seguros Walter Valtuille, ex-fumante há quase dez anos. Ele conta que usou o
tabaco por, aproximadamente, três décadas e, após problemas no trabalho, na
vida pessoal e com a própria saúde, tomou a decisão de procurar um tratamento.
“Fui diagnosticado com início de enfisema pulmonar um ano antes de parar.
Relutantemente, tentei evitar o tratamento porque achava que conseguiria
sozinho, tanto é que já havia tentado outras vezes, mas nunca funcionava”,
conta.

Combate

O Programa
Municipal de Controle do Tabagismo, desenvolvido pela Prefeitura de Goiânia, é
uma iniciativa com o objetivo de realizar ações, como campanhas, atividades
educativas e educação continuada, para reduzir o tabagismo na cidade. Cada
unidade básica de saúde vinculada ao Sistema Único de Saúde (SUS) recebe
inscrições de interessados em participar do tratamento, sendo em um deles que
Walter encontrou a oportunidade para dar o próximo passo. “Fumava, em média,
três a quatro carteiras de cigarro por dia. Antes do enfisema, eu já havia desenvolvido
problemas respiratórios, como falta de ar e muita tosse”, explica. A ajuda dele
veio pelo Centro de Referência em Atenção a Saúde da Pessoa Idosa (Craspi), que
possui um Grupo de Abordagem Intensiva ao Fumante.

Walter Valtuille

Aos 59 anos, o
corretor de seguros explica que começou a fumar aos 16 porque, na época, era um
ato bonito e as propagandas transformavam o consumo em algo charmoso. A
história de Walter não é muito diferente do que acontece com outras pessoas
ainda atualmente. De acordo com o Instituto Nacional de Câncer (INCA), parte
dos fumantes torna-se dependente antes dos 19 anos por fatores como publicidade
indireta voltada a jovens, uma tentativa deindivíduos serem aceitos por grupos
de amigos fumantes e, também, para se espelharem em pais e ídolos que usam o
cigarro.

A vida do corretor de seguros teve
várias situações difíceis por conta do vício. “Na época, minha filha era
pequena e se incomodava com o cheiro do cigarro, chegando a falar que, se eu
continuasse fumando, não iria chegar perto de mim”, conta. Ele também recebeu
um ultimato no próprio trabalho porque estava produzindo menos em decorrência
dos repetidos momentos que parava para fumar, visto que não podia dentro do
escritório. “Às vezes eu sentia vergonha de continuar e tentava parar, mas a
ansiedade que vem com a dependência era tão forte que eu acabava dobrando o
consumo quando deixava de tragar. O sentimento de culpa era enorme”.

Tratamento

De acordo com a
gerente Daniela Braga da Gerência de Doenças e Agravos Crônicos Não
Transmissíveis, os grupos de tratamento intensivo contra o tabagismo tem
duração aproximada de quatro a seis meses, sendo que, no início, os encontros
são semanais e podem chegar a 1h30 de duração. “O atendimento pode ser tanto em
um Centro de Saúde ou da Família, quanto um Centro de Assistência Integral a
Saúde [Cais]”, explica. Além disso, não é determinado que seja um profissional
da saúde específico à frente das reuniões, desde que tenha participado de um curso
do programa municipal. “O importante é a troca de experiência e a abordagem
comportamental para ajudar a pessoa a deixar o vício”.

Para tratar a dependência, Walter
contou com a ajuda de uma psicóloga, uma médica geral e uma geriatra, todos
integrados no Craspi. Ele explica que uma das primeiras ações feitas foi uma
triagem para aferir o grau de dependência do paciente. “O meu resultado foi o
de maior grau, o que correspondia ao uso do adesivo de 21 mg de nicotina”. Contudo,
o uso do recurso veio apenas dois meses depois de encontros semanais com
palestras sobre conscientização, apresentações de vídeos, relatos de
ex-fumantes e ensino de exercícios para os problemas respiratórios. “Começamos
o grupo com 60 pessoas e, ao final, restaram apenas 15. Algumas pessoas não
desistem de vez e acabam retornando para tentar de novo”.

Até o começo de
maio, oito grupos para tratamento já haviam sido abertos em Goiânia, sendo que
existe a previsão de mais um para começar em junho, no Centro de Saúde da
Família Crimeia Oeste. “Não existe um número determinado de interessados para
começar as sessões, o ideal é só que não seja menos de dez pessoas”, explica
Daniela. Em 2017, mais de 300 fumantes iniciaram os procedimentos, o que
totalizou 21 grupos ao longo do ano. Entretanto, apenas 124 pacientes relataram
que conseguiram parar de fumar.Segundo a gerente, estudos informam que, na
maioria dos casos, o dependente só vai largar o vício depois da terceira
tentativa.

Dentre a
população goianiense, a redução no número de dependentes foi maior nas mulheres
do que nos homens, chegando a 43%. Para eles, o número caiu apenas 12% em dez
anos, segundo a Vigitel. Já o maior número de fumantes, no total, está entre
adultos e idosos, com idades de 45 a 64 anos. Jovens entre 18 e 24 anos figuram
a taxa do menor número de tabagistas. Daniela Braga afirmou que grande parte
dos participantes, em 2017, foram mulheres e idosos.A pesquisa também aferiu
que o hábito de fumar diminui à medida que aumenta a escolaridade do cidadão. Por
exemplo, entre os indivíduos com mais de 12 anos de estudos, o percentual de
fumantes é de 9,1% para os homens e 4,1% no grupo das mulheres. Em
contrapartida, quando a escolaridade é de até oito anos, os percentuais
aumentam para 17,5% e 11,5%, respectivamente.

Walter
Valtuille conta que usou os adesivos de nicotina por 90 dias, sendo 30 para
cada mg. “Comecei com 21, então diminui para 14 e, por fim, cheguei a sete. O
recurso me dava a satisfação, apenas. Eu ainda sentia a saudade de estar com o
cigarro na mão e traga-lo, mas não era uma necessidade mais”. Quando o vício
incomodava, o corretor de seguros utilizava quaisquer artimanhas para não
consumir, como tomar água, chupar balinha e tentar protelar ao máximo. Ainda
assim, cerca de cinco anos depois de ter perdido a dependência, ele quase
aceitou um cigarro. “Um amigo, durante um café, ficou insistindo para eu fumar
e quase aceitei. Só que não fazia sentido eu ter batalhado tanto para parar e
voltar por isso”, conta.

Vida Nova

Sem o cigarro,
o enfisema de Walter parou de crescer e ele garante que a vida melhorou em todos
os aspectos, desde o lado pessoal até o profissional. “Passei a respirar
melhor, a sentir meu próprio cheiro e até a me alimentar direito. Geralmente, as
pessoas costumam se distanciar um pouco quando se fuma”. Depois de parar, o
corretor desenvolveu mais intimidade com a família e com os amigos. “O único
problema é possuo marcas por conta das décadas sendo fumante. Meu pulmão ainda
possui as ‘cicatrizes’, desenvolvi arritmia cardíaca e, às vezes, ainda sinto
falta de ar”, explica.

O Ministério da Saúde avalia que o
aumento no preço do cigarro é uma das medidas mais efetivas para o controle do
consumo. Se o valor subisse 50%, em 10 anos, seria possível evitar 136.482
mortes, 507.451 infartos agudos do miocárdio e eventos cardíacos, 100.365
acidentes vasculares cerebrais e 64.383 novos cânceres. Mesmo tendo parado por
quase uma geração, o reflexo do tabagismo ainda deixa Walter cansado
regularmente. “É preciso haver uma conscientização maior sobre os malefícios do
cigarro. Os programas existem, são eficientes e são acessíveis. A chave
principal é a boa vontade para parar. Isso já vale metade do tratamento”.

Hipnose tem 98% de eficácia no tratamento contra o tabaco

Considerada uma técnica mística e
mágica, tornou-se normal deixar a hipnose como última opção de tratamento para
quem busca mudanças de vida, isso quando ela é sequer lembrada como
possibilidade. O que muitos não sabem é que a técnica é uma ciência, sendo
qualificada e eficaz no tratamento de traumas, medos e determinadas doenças. A
hipnose nada mais é do um estado natural do ser humano, uma condição tão normal
quanto a respiração. O trabalho do profissional da área é proporcionar uma
amplificação deste estado e, assim, recondicionar o problema posto.

De acordo com o
hipnólogo Marcos Dias, de Goiânia, a hipnose clínica para tratar qualquer tipo
de trauma, fobia e mudança de comportamento demanda cerca de seis sessões,
tendo 98% de eficácia. “Após um tempo, o paciente pode até sentir vontade de
fazer uso de outra droga, por exemplo, mas ele não volta para o mesmo produto
do tratamento”, explica. O profissional afirma também que o método é mais
rápido e natural que a psicanálise clínica e a psicologia cognitiva.

O paciente não
é considerado viciado no tratamento, mas sim “condicionado” ao ato de fumar.
Partindo deste princípio, tudo o que foi condicionado pode ser recondicionado,
desconstruído. As mudanças ocorrem quando a pessoa se permite chegar ao “transe
hipnótico”, ou “relaxamento profundo”, durante a sessão. “É como se fosse
aquele sonho em que a pessoa acaba interagindo pelo corpo com risadas ou
falas”, explica Marcos. O ser humano adentra esta condição algumas vezes por
dia, como quando perde a noção de tempo e espaço em uma viagem longa de carro
ou ônibus. Existe a consciência de que a pessoa estava sentada, mas, por alguns
instantes, ela não notava nada ao redor.

A mente humana
funciona de duas formas: com o consciente e o inconsciente. É no último
conceito que estão os poderes de decisão e escolha, além de habilidades como
andar, falar e escrever. A relação entre todas é que foram ações aprendidas,
ninguém nasceu sabendo. Marcos Dias evidencia que o vício no tabaco ou outras
drogas também está neste lado da consciência. “A pessoa aprendeu o ato e
tornou-se natural por conta da repetição. O profissional trabalha com a hipnose
para descobrir quando o indivíduo começou e desconstruir o pensamento”.

Todos os
trabalhos são feitos com diálogos. O processo para que a pessoa alcance o
transe e, então, o hipnólogo chegue ao inconsciente dela se dá através de
palavras que remetam a imagens conhecidas da pessoa, como pedir que o cliente
se imagine em uma praia e sinta a brisa no rosto. Na primeira sessão, o
profissional retira o efeito “fissura” pelo narcótico. Já na segunda, ocorre a
busca da origem do que o paciente quer “fugir” quando a utiliza. “Não existe
nenhum ser humano que usa drogas que não queira relaxar ou desprender-se. Qualquer
que seja o condicionamento é uma busca por alívio. Em casos de vício, sempre
existirá um trauma por trás, e que talvez nem a pessoa saiba que possui”, frisa
o profissional.

Não existe nenhuma contraindicação
para começar a frequentar sessões de hipnose, visto que o tratamento é voltado
para todo ser humano. Em consequência, também não é possível traçar um perfil
de quem procura mais ou menos. “Qualquer pessoa pode se tratar, o crucial é
querer”, afirma Marcos, assegurando que o próprio tratamento garantirá que paciente
chegue ao fim. “Ele também é condicionando a ter uma vida melhor, com mais
alegria e liberdade”.

Com um período de mais de dez anos
trabalhando com hipnose, Programação Neurolinguística (PNL) Comportamental e
psicanálise clínica, Marcos Dias reforça que este método não é um mito e que os
interessados devem procurar um especialista gabaritado para não caírem em
nenhum golpe. “O tratamento é clínico, e é cientificamente provado e atestado
pela Organização Mundial da Saúde (OMS). É o tratamento mais seguro que tem,
pois não altera fisicamente o corpo como fazem os psicotrópicos. Todo o potencial
do ser humano é trabalhado”.

*Victor Lisita é integrante do programa de estágio do jornal O Hoje, sob a supervisão de Naiara Gonçalves.

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