Estudantes de escolas públicas são maioria

Pesquisa divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revela que dois terços dos estudantes das Instituições Federais de Ensino vêm de escolas públicas

Postado em: 20-05-2019 às 06h00
Por: Sheyla Sousa
Imagem Ilustrando a Notícia: Estudantes de escolas públicas são maioria
Pesquisa divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revela que dois terços dos estudantes das Instituições Federais de Ensino vêm de escolas públicas

Igor Caldas*

Levantamento feito pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revela que cerca de dois terços dos estudantes da Instituições Federais de Ensino (IFE) são oriundos de escola pública. Os dados são da V Pesquisa do Perfil Socioeconômico e Cultural dos Estudantes de Graduação das Universidades Federais divulgados na manhã da última sexta-feira. Os dados foram levantados entre fevereiro e junho do último ano. 

A pesquisa registrou 424.128 questionários validados, aproximadamente 35,34% dos discentes e mostra que cerca de dois terços de estudantes das IFEs vieram do ensino médio público. Mais da metade (64,7%)  deles estudaram integralmente, ou na maior parte do tempo, em escolas públicas de ensino médio, enquanto 35,3% vieram do ensino particular.

Continua após a publicidade

Eduardo Augusto Moreira Santos cursa licenciatura em Física no Instituto Federal Goiano (IFG).  Ele estudou a vida inteira em escolas públicas e agora considera que o ingresso no curso superior em uma IFE foi uma grande conquista na sua vida. Na parte materna de sua família, apenas ele e sua irmã entraram na Universidade. “Minha irmã acabou de se formar em pedagogia e está se preparando para entrar no mestrado”, afirma Eduardo.

O estudante que é apaixonado por ciência vai se tornar professor um dia e revela preocupação com o reflexo dos últimos cortes feitos na educação. O Ministério da Educação (MEC) anunciou bloqueio de uma parte do orçamento das 63 universidades e dos 38 institutos federais de ensino no final do mês abril. Ele considera que o corte foi uma chantagem para facilitar a aprovação da reforma da previdência nos moldes do governo.

“A situação vai ficar bem complexa. Este corte está sendo feito basicamente por ideologia política partidária. É uma chantagem para conseguirem aprovar o que eles querem. Serve apenas como uma manobra. O problema é que 95% das pesquisas de ensino partem de instituições públicas. Isso vai ter reflexo em toda sociedade no futuro”, lamenta Eduardo. 

A empresa norte-americana Clarivate Analytics realizou o estudo “Pesquisa no Brasil – Um relatório para a CAPES” que aponta que a produção científica brasileira é feita quase exclusivamente dentro das instituições públicas de ensino. De acordo com a pesquisa,  no período entre 2011 a 2016 foram produzidos 250 mil papers que fazem parte da base de dados internacional Web of Science. Os Papers são artigos, ensaios ou dissertações publicados em periódicos especializados e anais de congressos.

O estudante de física se sente agradecido pelo apoio que seus pais dão para ele concluir os estudos. Mas por vir de família de baixa renda, nem sempre pode se dedicar exclusivamente à formação acadêmica. “O apoio dos meus pais tem sido importante. Na medida do possível, tudo que eu preciso eles sempre fornecem. Não me dedico integralmente por que às vezes tenho que intercalar o estudo com uns bicos que faço para complementar renda de casa”, afirma Eduardo.

João Marcos de Oliveira é colega de curso de Eduardo no mesmo instituto. Ele também foi criado em família de baixa renda e cursou o ensino médio também no IFG. Segundo ele, os estudantes do ensino médio do instituto tem alto índice de aprovação no ingresso das IFEs,  João Marcos revela que a maior parte dos seus colegas de escola estão fazendo curso técnico ou superior na Universidade Federal de Goiás (UFG) e no Instituto Federal Goiano (IFG). 

“O IFG tem uma taxa alta de aprovação nas universidades. A maior parte dos meus antigos colegas de escola estão ou aqui ou na UFG”, afirma João. Ele também revela preocupação com o futuro da educação no país. “Não tem como não olhar a situação com pessimismo. Mas normalmente quem quer ser professor, faz por que gosta.  Meu pai deu aula em escola estadual a vida toda e nunca foi fácil. Eu me inspiro nele”. Seu pai é professor de história na rede estadual de ensino.

Ele fala sobre como houve melhora no ingresso de pessoas de baixa renda dentro das universidades. “Normalmente, para o pessoal oriundo de escolas publicas, essa é a primeira geração que veio para a universidade. As famílias dessas pessoas ficam orgulhosas quando o filho entra no ensino superior, mas não dão tanto apoio no caminho até a formatura”, o estudante ainda afirma que em famílias de baixa renda, o jovem que recebe uma cobrança para trabalhar e ajudar em casa  pode ser enxergado como vagabundo por tentar se dedicar exclusivamente aos estudos.

A pesquisa divulgada pelo IBGE mostra ainda que mais de 60% dos estudantes das IFEs tem a trajetória exclusiva em escolas públicas de ensino médio desde 2014. Também revela que a maioria absoluta dos estudantes vem de família em que, nem o pai, nem a mãe, tiveram acesso ao ensino superior.

João explica que o ingresso de pessoas de baixa renda na universidade aumentou, mas o mercado não conseguiu acompanhar o crescimento para empregar as pessoas recém-formadas. “Eu vejo que quem se identifica com pautas progressistas, às  vezes cai no caminho perigoso de apenas lembrar como os governos petistas ajudaram muito na educação. Eles esquecem ou custam lembrar que o filho de empregada virou engenheiro, mas o engenheiro teve que virar motorista de aplicativo. Temos mais gente vindo de escolas pública formados, mas a economia não atendeu essa demanda”.

O futuro professor de física acredita que o discurso de “balbúrdia” do governo Bolsonaro está sendo vendido para beneficiar instituições privadas e sucatear a universidade pública.“O presidente Bolsonaro falou que tem muita balbúrdia. Acho que está acontecendo uma propaganda sistemática contra a educação pública que se aproxima de uma ideologia para tentar dar vantagem paras instituições privadas. Eles vão tentar falar que algumas disciplinas não são úiteis para a sociedade, mas a definição de utilidade de conhecimento é muito subjetiva”. Ele acredita que havia menos concordância com esse pensamento no passado. (*Especial para O Hoje) 

Número de estudantes pretos, pardos e indígenas aumenta nas IFEs 

Segundo o estudo divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística na última sexta-feira, no ano de 2005, 96,9% dos alunos ingressaram nas universidades por ampla concorrência, ao passo que apenas 3,1% entrararam pelo sistema de cotas. Até 2018, o cenário mudou: 51,7% ingressaram por ampla concorrência enquanto 48,3% via cotas.

O estudo revela que a população das IFEs ainda é menos negra do que a população brasileira se comparada aos dados levantados pela V Pesquisa com os dados da PNAD-C (2018). Os números mostram que apenas 51,2% dos estudantes são negros, enquanto a população negra no País equivale a 60,6%. Em uma margem de 15 anos, o estudo mostra que as ações afirmativas fizeram o número de estudantes pretos(as) e pardo(as) crescer de 160.527 para 613.826. A variação foi de 282%.

O número de estudantes preto(as) quilombolas elevou mais que o dobro. O número de 4.231 alunos em 2014, saltou para 10.747 no ano passado. A quantidade de estudantes indígenas aldeados também sofreu variação significativa, tendo em vista que o último levantamento apontou para 4.672 estudantes nessas condições, enquanto em 2014, o número era de 2.329. Ou seja, o resultado mais que dobrou novamente.

 

Veja Também