Quinta-feira, 28 de março de 2024

Cresce casos de maus-tratos a animais durante pandemia da Covid-19 em Goiás

Dema afirma que os casos de maus-tratos e abandono de animais chegaram a dobrar durante a pandemia do novo Coronavírus | Foto: Wesley Costa.

Postado em: 08-08-2020 às 06h00
Por: Sheyla Sousa
Imagem Ilustrando a Notícia: Cresce casos de maus-tratos a animais durante pandemia da Covid-19 em Goiás
Dema afirma que os casos de maus-tratos e abandono de animais chegaram a dobrar durante a pandemia do novo Coronavírus | Foto: Wesley Costa.

Igor Caldas

Maus-tratos e abandono de animais crescem no período de pandemia do novo Coronavírus. De acordo com a Delegacia Estadual de Repressão a Crimes Contra o Meio Ambiente (Dema), as ocorrências em Goiás aumentaram 100%. Protetores de animais também relatam elevação de casos.

O titular da Dema, delegado Luziano de Carvalho, afirma que um dos grandes desafios do combate a esse tipo de crime ambiental, apontado pelo delegado, seria a falta de recursos administrativos para gerir um espaço que abrigasse os bichos mal-tratados. “Tiro o animal de alguém e levo para onde? Como vamos manter esses animais? Esse é um gargalo que existe há muito tempo. Precisamos de verba para isso”. Segundo Luziano, que está em isolamento social devido à crise do novo Coronavírus, essa é uma questão que envolve um projeto de criação de grupo especial de proteção animal dentro da Dema. “Essa é uma proposta necessária que eu venho pensado há algum tempo e ela precisa ser colocada em prática o mais rápido possível”, avalia.

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Ainda sobre a questão de verba disponível para ser aplicada no combate à infração dos direitos dos animais, o delegado aponta uma questão que tange o problema de superpopulação de animais domésticos nas ruas. “Uma coisa extremamente necessária é a castração em massa para diminuição dos bichos que foram abandonados e se multiplicam nas ruas e também são fruto de maus-tratos. Como vamos fazer isso? Precisamos pensar uma forma de gerir esse problema”, conclui.

Dados divergentes

Apesar de ONGs relatarem o aumento de casos de abandono e maus-tratos de animais em todo território nacional, e do relato do delegado Luziano Carvalho, dados da Secretaria de Segurança Pública (SSP) alegam diminuição de ocorrências relacionadas aos maus-tratos de animais. De acordo com os dados da pasta, foram 144 ocorrências entre abril e junho de 2019 comparado com 122 casos no mesmo período de 2020.

O delegado ainda alerta que, de forma geral, quando se pensa em maus-tratos de animais, apenas animais domésticos como cachorros e gatos são levados em consideração.  “Alguém fica preocupado com galinhas, porcos e bovinos que são mortos de qualquer jeito, com crueldade em muitos locais? Essas ocorrências também são consideradas como crime de maus-tratos”, defende. O delegado também cita maldades contra animais silvestres. “Muita gente faz maldade com o tatu, o tamanduá-bandeira, esses crimes contra animais também devem que ser considerados”, garante.

Luziano menciona situações que, mesmo dentro da legalidade, ele considera como maus-tratos. “Quem deu o direito ao homem de dar uma prisão perpétua ao pássaro engaiolado? Essas questões têm que ser repensadas, a situação de maus-tratos não é tão simples quanto parece”, diz.

Um dos pontos fundamentais sobre o direito dos animais apontados pelo delegado é a interpretação de que muitas pessoas encaram o animal como uma propriedade, um objeto e não como um ser. “Em muitos casos, não existe o vínculo sentimental, o animal é visto como um bem, não como um ser”. Por outro lado, ele também destaca o exagero nas relações entre humanos e animais. “Hoje a proteção do cachorro e do gato é maior do que a do ser humano, sem dúvida e em muitos casos os animais são colocados acima do ser humano”.

Protetores de animais acusam falta de interesse político  

A protetora de animais e gestora de um dos maiores abrigos da Capital, Mônica Aquino, acredita que a falta de recursos para gerir animais maltratados e abandonados é uma questão política. “Em Goiânia existem cerca de 10 abrigos de animais capacitados que podem receber bichos resgatados. Mas há falta de interesse do poder público para auxiliar esses locais”.

Ela ainda diz que o interesse está relacionado com desvio de verbas. “Se soltarem dinheiro para ONGs gerirem o problema, não conseguem fazer desvios. Por isso temos que fazer por conta própria”. A protetora dos animais cobra ações do Poder Executivo. “Não vemos nenhuma iniciativa do poder executivo municipal no sentido de eliminar o problema na causa que seria a castração em massa. Não existe política pública eficiente voltada para o direito dos animais”.

Mônica é gestora do Lar dos Animais que abriga mais de 300 bichos, entre cachorros e gatos. Toda estrutura de canis, ração, cuidados veterinários e sete funcionários é financiada por doações. “A gente recebe ajuda, mas as contas nunca fecham”, lamenta. Apesar de o abrigo ter sido aberto há menos de quatro anos, Mônica consegue cuidar de mais de 300 animais com as doações. Ela atribui o sucesso do cuidado à divulgação do trabalho para os mais de 100 mil seguidores das redes sociais do Lar dos Animais.

Aumento de casos

Para a protetora de animais Mônica Aquino, a questão do aumento recente do abandono de animais tem ligação com as consequências da crise da pandemia de Coronavírus. “Muitas pessoas, principalmente carentes, perderam seus empregos e condições de cuidar dos animais. Isso pode ser um fator que alavancou o número de abandono de animais”, afirma.

Entretanto, ela atribui o aumento de maus-tratos e abandono na época da pandemia a dois fatores distintos. Para ela, os maus-tratos aos bichos sempre foi grande, mas a aproximação com a tecnologia fez com que os casos fossem mais denunciados. “O acesso à informação deixou as pessoas com menos medo de fazer denúncias, mas o número de casos sempre foi alto. Agora, estão sendo mais notificados”, defende.

Apesar do aumento das denúncias, Mônica relata que a legislação e fiscalização de crimes contra animais ainda é falha.  “A legislação é deficiente porque dentro do sistema não existe um fluxo coeso entre os poderes e autoridades. A Dema, a Polícia Militar, o Poder Executivo, cada um trabalha isoladamente”. 

O abrigo Lar dos Animais sofreu uma série de atentados na última semana. O local foi alvo de ataques de um homem que teria envenenado e esfaqueado cerca de cinco cães do local desde o último dia 10 de julho. O autor do crime segue impune. “É muito difícil fazer com que a lei seja aplicada, mas vamos seguir.

Responsabilidade

Segundo a presidente da Comissão Especial de Proteção e Defesa Animal da Ordem dos Advogados do Brasil em Goiás (OAB-GO), Pauliane Rodrigues legalmente, a responsabilidade dos animais abandonados é dividida entre sociedade e o Estado. “Mas sempre recai sobre a sociedade porque o Estado é totalmente omisso em tudo que se refere ao direito dos animais”, pondera. Pauliane diz que há progresso na legislação favorável aos animais, mas falta fiscalização. “Tinha que haver uma delegacia especializada exclusivamente em crimes contra animais”, aponta a advogada. (Especial para O Hoje) 

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