BC reconhece que economia vai mal das pernas e finge que não tem nada com isso

Lauro Veiga

Postado em: 14-05-2019 às 18h58
Por: Sheyla Sousa
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Lauro Veiga

A
alta cúpula do Banco Central (BC), reunida no Comitê de Política Monetária
(Copom), reconheceu o óbvio e já admite, em ata oficialmente assinada pelos
componentes do conselho dos juros altos, que a economia poderá mesmo sofrer um
novo retrocesso neste primeiro trimestre de 2019, contrariando as expectativas
de alguma possibilidade de melhoria alardeadas ao fecharem-se as urnas em
outubro do ano passado. E daí? E daí nada. O BC acredita que a retomada virá
mais adiante, sabe-se lá quando e por força do que (talvez por inspiração
divina), e que, por isso, considerando-se as incertezas em relação ao processo
de ajuste fiscal e na aprovação da “mãe de todas as reformas” (claro,
referência à reforma da Previdência), não seria o momento de mexer na taxa
básica de juros.

Talvez
mais à frente, quem sabe, se o retrocesso na economia, já antecipado pelos
indicadores do primeiro trimestre, tornar-se ainda mais desastroso, o Copom
tome a decisão de reduzir os juros, algo ali na faixa do “depois da vírgula”,
com cautela para não acirrar os ânimos no mercado financeiro. A equipe do Itaú
Unibanco acredita que os juros deverão sofrer novo corte na reunião de outubro
do Copom.

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A
turma do Bradesco acha que a ata do Copom, divulgada ontem, “deixou aberta a
possibilidade de uma discussão sobre corte de juros em algum momento do ano,
ainda que tal movimento não ocorra no curto prazo. Evidentemente, essa
possibilidade dependerá de um contexto de expectativas de inflação bem
ancoradas e recuperação lenta da atividade”.Quer dizer, se tudo piorar ainda
mais, o BC deverá finalmente se mover, ainda que isso signifique sacrificar as
possibilidades de uma retomada mais robusta da atividade econômica, com
consequente redução do desemprego e de melhoria nas receitas dos governos
(ajudando a melhorar o cenário fiscal).

Se é para
complicar…

Para
complicar um pouco mais, a primeira (e única até o momento) reação da equipe
econômica aos prognósticos de uma “recessão técnica” veio sob a forma de novo
“contingenciamento” dos gastos federais – quer dizer, mais cortes de despesas,
o que tenderá a afundar a economia na crise. Quando se fala em cortes, deve-se
levar em conta o alvo preferido de todas as equipes econômicas: os
investimentos, que poderiam, a esta altura, estar cumprindo um papel
“anticíclico” (quer dizer, poderiam estar ajudando a aquecer a atividade
econômica). No primeiro trimestre deste ano, a União realizou investimentos de
R$ 6,232 bilhões, em valores já atualizados com base na inflação, o que
significou queda de 30,2% em relação ao mesmo trimestre de 2018, num corte de
R$ 2,698 bilhões. Foi o segundo pior número para o período em toda a década e
significou um tombo de 87% frente aos R$ 27,438 bilhões investidos pelo governo
federal nos primeiros três meses de 2014. Em cinco anos, o investimento federal
perdeu R$ 23,904 bilhões.

Balanço

·  
Na
leitura do pessoal do Itaú, ainda que “desapontado” com o ritmo da recuperação
e diante da possibilidade de contratação do Produto Interno Bruto (PIB) no
primeiro trimestre, “o Copom segue bastante confortável com o patamar atual da
taxa Selic” (quer dizer, com os 6,5% ao ano fixados pelo mesmo comitê par aos
juros básicos).

·  
A
ata do Copom, ainda na interpretação do banco, revela a crença do BC de que as
incertezas “sobre a sustentabilidade fiscal” do setor público poderiam estar
amarrando a retomada e impedindo que a economia volte a explorar todo seu
potencial, passando a crescer a taxas mais aceleradas.

·  
O
diagnóstico deixa de fora a peça central para se entender o momento atual na
economia: falta demanda para que a atividade deslanche.

·  
A
preservação dos juros em níveis ainda elevados diante da conjuntura econômica
em curso e mais cortes de despesas vão contribuir para inibir ainda mais a
demanda, minando as chances de uma retomada mais acelerada e adiando decisões de
investimento no setor privado, num círculo vicioso que resultará em maior
debilidade para a economia.

·  
A
alta direção do BC prefere acreditar que a mera aprovação da reforma da
Previdência (que só terá impactos sobre a situação fiscal no médio e no longo
prazo) deverá destravar as amarras da economia, levando a uma forte aceleração
da atividade.

Mas nem o banco acredita nessa possibilidade.
Para o Itaú, a aprovação da reforma é “condição necessária, mas não suficiente”
para levar a economia de volta ao crescimento.Sintomaticamente, o banco reduziu
as previsões para o crescimento em 2019 (de 1,3% para 1,0%) e em 2020 (de 2,5%
para 2,0%). 

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