A reconversão da economia poderá ser um dos caminhos para evitar a depressão

Trata-se de um auxílio ao lado formal da economia, que deixa de lado dezenas de milhões de trabalhadores informais e que serão mais gravemente atingidos pela crise que se avizinha.

Postado em: 24-03-2020 às 06h00
Por: Sheyla Sousa
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Trata-se de um auxílio ao lado formal da economia, que deixa de lado dezenas de milhões de trabalhadores informais e que serão mais gravemente atingidos pela crise que se avizinha.

A
crise gerada pela pandemia do novo coronavírus (Covid-19), na classificação da Organização
Mundial da Saúde (OMS), vai exigir que governos e empresas comecem a planejar,
desde agora, formatos para reconverter a economia e, muito especialmente, o
setor industrial. Isso já vem ocorrendo a toque de caixa na Alemanha, no Reino
Unido e, vejam só, também nos Estados Unidos. Esse processo vai demandar, no
entanto, capacidade elevada de gestão e de coordenação, qualidades que o
governo federal ainda não foi capaz de demonstrar.

Embora
parte das ações já anunciadas seja positiva, as medidas têm sido tímidas e a
intervenção mais relevante, até o momento, foi anunciada exatamente no mercado
financeiro, embora a intenção seja que o setor transforme a injeção trilionária
de recursos em créditos para empresas e famílias. De novo, trata-se de uma
ajuda ao lado formal da economia, que deixa de lado dezenas de milhões de
trabalhadores informais e que serão mais gravemente atingidos pela crise que se
avizinha.

Montadoras
de veículos, indústrias dos setores de metais, têxtil e de vestuário anunciam
férias coletivas, paralisação de máquinas, interrupção da produção, num
processo que poderá trazer perdas mais duradouras do que se imagina. O
religamento de máquinas e equipamentos tomará tempo e não deverá ocorrer
imediatamente ao final da pandemia, quando o coronovírus for finalmente
contido.

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Mas
as plantas que têm sido desativadas poderão ser reconvertidas rapidamente para
produzir, temporariamente, bens, máquinas, equipamentos e aparelhos de o País
vai precisar para enfrentar o surto, tratar seus doentes e tentar preservar
vidas. Nessa relação incluem-se equipamentos de proteção individual (máscaras,
luvas, trajes especiais, botas e outros itens), equipamentos e aparelhos
médicos, a exemplo de ventiladores e respiradores, macas, leitos hospitalares e
mesmo equipamentos mais sofisticados, a serem utilizados para receber e tratar
doentes, e ainda lençóis, roupas de cama e até mesmo plásticos especiais para
uso em máscaras de proteção (o laboratório de prototipagem da Universidade
Federal de Goiás, num exemplo, precisa de plásticos transparentes em acetato,
com espessura de 0,5 milímetro, para a produção de máscaras de proteção).

Financiamento


uma gama de produtos e de serviços associados que poderiam mobilizar a
indústria, aqui mesmo em Goiás, evitando ou reduzindo demissões neste período
crítico. Seria o caminho para tentar evitar uma depressão e todo o seu
potencial de desagregação social. Tempos de emergência demandam medidas
emergenciais e urgentes. Mas seria necessário ter pessoas capacitadas na
coordenação de todo esse processo, que consiga dialogar com setores da
indústria, do comércio, ordenar as ações, dividir tarefas e definir de onde
virão os recursos para financiar a reconversão industrial, com desprendimento,
sem “ideologias”. Recursos existem, como já se mostrou neste espaço, e os
bancos públicos – Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal e sobretudo o Banco
Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) – têm um papel importantíssimo
a desempenhar como financiadores dessa reconversão, em articulação com o setor
financeiro privado.

Balanço

·  
No
domingo, o presidente do BNDES, Gustavo Montezano, antecipou ao País o que
considera ser um conjunto de “medidas emergenciais para ajudar a mitigar os
efeitos da pandemia”. Os números do pacote são ridículos: R$ 55,0 bilhões.
Desse total, R$ 20,0 bilhões sairão do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço
(FGTS), transferidos dos fundos PIS/Pasep.

·  
Outros
R$ 30,0 bilhões dizem respeito ao adiamento de pagamentos de parcelas de
financiamentos tomados, direta ou indiretamente, pelas empresas. Os R$ 5,0
bilhões restantes estão reservados a micro, pequenas e médias empresas. Ou
seja, quase nada de recursos novos.

·  
Montezano
ainda teve a coragem de afirmar que esses recursos ajudariam o banco a manter
seus desembolsos nos mesmos níveis alcançados em 2019. Quer dizer, o banco vai
reeditar o menor nível de empréstimos e financiamentos em 23 anos, em valores
reais.

·  
O
pacote do Banco Central (BC) para o setor financeiro, destinado a reforçar a
liquidez das instituições (o total de recursos disponíveis para financiar novas
operações do setor, incluindo a concessão de crédito), foi muito mais
“agressivo”, com a promessa de liberação de R$ 1,216 trilhão, algo como 16,7%
do Produto Interno Bruto (PIB). No início da crise anterior, em 2008, o BC havia injetado R$ 117,0 bilhões, na conta da atual direção, o
que representou 3,5% do PIB.

·  
Mas
há dúvidas sobre se todo esse dinheiro vai de fato chegar ao lado real da
economia. Mesmo na crise global de 2008/2009, parte dos recursos ficou
“empoçada” no setor financeiro mesmo ou transformou-se em aumento da riqueza
financeira.

·  
Ao
longo do dia, sempre recorrendo às redes sociais, o presidente Jair Bolsonaro
anunciou um reforço de 85,5 bilhões para Estados e municípios, dos quais R$ 8,0
bilhões para o setor de saúde e R$ 16,0 bilhões, durante quatro meses, para
preservar os níveis registrados pelos fundos de participação dos Estados (FPE)
e das prefeituras (FPM) no ano passado.

·  
Pouco
mais de R$ 62,0 bilhões referem-se à suspensão do pagamento de dívidas dos
Estados à União, renegociação de dívidas de governos estaduais e municipais com
bancos e apoio para a contratação de novas dívidas pelos governos regionais.
Novamente, a concessão de recursos novos será muito baixa e limitada no tempo.

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