Coluna

Estrangeiros reduzem investimentos (mesmo com queda do risco Brasil)

Publicado por: Sheyla Sousa | Postado em: 31 de outubro de 2019

Ao
que parece – e as aparências neste caso sempre enganam –, os mercados teriam
tomado a decisão de desprezar a tão decantada classificação de risco do Brasil,
que vem melhorando há 15 meses, persistentemente, enquanto a economia derrapa
na ociosidade, no desemprego e na falta de demanda. Está certo que as agências
que fazem esse tipo de classificação, que considera muito mais a capacidade de
cada país honrar dívidas assumidas com os grandes banqueiros internacionais,
nunca foram exatamente experts em avaliar o lado real da economia. Mas não
deixa de ser um tanto constrangedor observar que as decisões de investidores
internacionais parecem seguir na contramão das direções sugeridas pelas
agências internacionais, como Fitch e Moody’s – as queridinhas dos mercados.

Segundo
manchete estampada pela edição de ontem da Folha de S.Paulo, o índice de risco
do País havia atingido, no dia anterior, o nível mais baixo desde maior de
2013, antes da “grande crise”, fixando-se em 117 pontos e sugerindo que o
Brasil havia consolidado sua posição no mercado internacional como bom pagador
e, portanto, um atrativo para as aplicações dos muito endinheirados, num mundo
onde sobra dinheiro. Se é assim, os donos do dinheiro global deveriam estar
inundando o País com seus dólares, em busca de aplicações rentáveis.

Mas
não é isso o que vem ocorrendo. A queda dos juros, claro, poderia representar
um desestímulo ao investidor estrangeiro. Deve-se lembrar, no entanto, que os
juros estão muito próximos de zero nas maiores economias do mundo (em alguns
casos, até negativos). O câmbio, da mesma forma, poderia significar outro fator
de desestímulo, mas o dólar tem se mantido muito bem-comportado nas últimas
semanas. Na média, com base no levantamento realizado diariamente pelo Banco
Central (BC), a cotação do dólar tem se mantido relativamente estável desde
agosto, saindo de quase R$ 4,02 naquele mês para R$ 4,12 em setembro e fechando
em R$ 4,09 na média registrada entre os dias 1º e 30 de outubro. É claro que um
processo de nítida valorização do real, rotineira nas últimas décadas, geraria
perspectivas mais atrativas para especuladores de fora, mas a estabilidade
virtual nesta área não é motivo para afugentar investidores de fato.

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Fuga de dólares

O
mais provável é que o clima de instabilidade política e a falta de crescimento
venham operando como um dado mais forte a ser considerado nas decisões de
investimento de estrangeiros (e, claro, também de residentes no País). Nos
números do BC, o investimento direto de estrangeiros aqui dentro caiu 20,4% em
setembro deste ano, saindo de US$ 7,917 bilhões no mesmo mês do ano passado
para US$ 6,306 bilhões. No acumulado entre janeiro e setembro, a queda foi de
praticamente 12%, com o investimento recuando de US$ 53,953 bilhões para US$
47,519 bilhões (ou seja, uma redução equivalente a US$ 6,434 bilhões).

Balanço

·  
Não
foi só o investimento direto que sofreu baixas. A participação de estrangeiros
na dívida federal vem caindo desde maio e sofreu forte queda na passagem de
agosto para setembro, segundo relatório da Secretaria do Tesouro Nacional
(STN).

·  
Em
maio deste ano, pessoas não residentes no Brasil detinham 12,74% de todos os
títulos federais em circulação no mercado, somando R$ 476,039 bilhões. Em
agosto, esse valor recuou discretamente para R$ 474,976 bilhões, representando
12,14% do estoque da dívida federal.

·  

em setembro, a participação desabou para 11,42%, o que significou R$ 19,106
bilhões a menos em mãos de investidores estrangeiros, com sua posição na dívida
pública federal em poder do mercado recuando para R$ 455,870 bilhões.

·  
A
despeito das altas experimentadas pelo mercado de ações, os estrangeiros vêm se
desafazendo de seus papéis. Conforme publicado na edição de ontem do jornal
Valor Econômico, ao longo dos primeiros 25 dias de outubro, aqueles
investidores retiraram do chamado mercado secundário de ações algo como R$ 9,7
bilhões.

·  
No
acumulado desde janeiro deste ano, ainda com o dado preliminar de outubro, pelo
menos de R$ 30,4 bilhões foram retirados das bolsas pelos estrangeiros (ou
seja, o fluxo de saída dessas aplicações superou largamente a entrada de novos
investimentos, deixando um saldo negativo para a Bolsa).

·  
Por
enquanto, essa fuga de investidores estrangeiros, talvez preocupados com a
retórica beligerante e rasteira que viceja no Palácio do Planalto, não deve ser
causa de preocupação, embora a tendência não seja mais tão positiva quanto
antes.

·  
No
acumulado em 12 meses, os investimentos diretos no País baixaram de US$ 76,817
bilhões em dezembro de 2018 para US$ 70,382 bilhões em igual período de 12
meses encerrado em setembro deste ano, num recuo de 8,38% (ou US$ 6,435 bilhões
a menos). O volume ainda é expressivo e representa 88% a mais do que o déficit
em transações correntes de US$ 37,435 bilhões acumulado até setembro. A anotar:
o rombo em transações correntes saltou 83,4% na co
mparação entre os primeiros nove meses deste ano e o mesmo período de 2018, de US$ 18,566 bilhões para US$ 34,056 bilhões.