Coluna

A economia mundial sob o domínio de líderes desequilibrados e populistas

Publicado por: Sheyla Sousa | Postado em: 04 de janeiro de 2020

O
ataque dos Estados Unidos para assassinar em solo iraquiano um dos principais
líderes militares e políticos do Irã é o mais direto exemplo de como o mundo e
toda a economia, por consequência, estão sujeitos a variações de humor e a
decisões intempestivas de lideranças mundiais desequilibradas, populistas e
autoritárias. A essa altura dos acontecimentos, não se pode descartar a
hipótese, mencionada por muitos, de que a decisão do ataque tenha obedecido
muito mais a uma lógica política do que militar, com olhos voltados
principalmente para as pressões que administração Donald Trump tem sofrido
internamente.

Qualquer
que tenha sido a motivação, amudança no cenário econômico desenhada momentos
antes da virada do ano, sugerindo um ambiente mais favorável, com crescimento
para a economia global, acaba de sofrer uma reviravolta a partir do bombardeio
no aeroporto de Bagdá, o que fez disparar os preços do dólar, açulando os
temores de turbulências crescentes no horizonte de curto prazo.A depender dos
desdobramentos da crise entre EUA e Irã e da capacidade de discernimento e
moderação dos donos do poder global (uma expectativa movida muito mais pela
esperança de algum equilíbrio do que por fatos concretos), o ataque
norte-americano tenderá a lançar a economia mundial a novos desafios e a
demandar esforços adicionais para preservar as expectativas de algum
crescimento em 2020. De qualquer forma, será preciso aguardar com cautela e
atenção o que virá daqui para frente como consequência de um agravamento das
tensões entre aqueles dois países.

Governos
e ministros da área econômica certamente devem se manter alertas, mas a tomada
de decisões num momento de extrema incerteza pode não ser o melhor caminho. Por
aqui, com o açodamento usual, o ministro dos mercados, seus assessores e a alta
direção da Petrobrás já haviam detonado estudos para aumentar os preços dos
combustíveis, antes mesmo de se ter clareza sobre como as cotações do petróleo
tenderão a se comportar no mercado internacional. Algumas consultorias, com
igual rapidez, já estimam que o barril poderá atingir US$ 80 na sequência da
morte do general Qassim Suleimani, comandante da divisão de elite da Guarda
Revolucionária do Irã.

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A pressa e seus
riscos

Trata-se,
por enquanto, de uma projeção arriscada, ainda que nada indique que não possa
ocorrer. Nos primeiros momentos, o preço do barril do petróleo tipo Brent (classificação
em geral aplicada ao petróleo extraído do Mar do Norte, no Reino Unido) chegou
a saltar US$ 3,40 entre o nível mais baixo alcançado no início da tarde de
quinta-feira, dia 2, até o começo da manhã do dia seguinte, saindo de US$ 65,77
para US$ 69,17 (alta de 5,17%). Desde lá, no entanto, o mercado vinha se
acomodando, com o preço do barril recuando ligeiramente para US$ 68,62 horas
mais tarde, numa redução de 0,8% desde o pico do dia (até ali).Mas em
comparação ao dia anterior, vinha se configurando uma elevação de 3,6% (US$
2,37 por barril a mais, frente a uma cotação média de US$ 66,25 na quinta-feira).
Nos últimos 30 dias, tomando a cotação registrada no meio da tarde de ontem,o
petróleo acumulava aumento de quase 12,5%, comparado ao preço médio de US$
60,92 por barril alcançado em 2 de dezembro passado.

Balanço

·  
A
aparente acomodação ao longo do dia de ontem, evidentemente, pode não ser real,
já que movimentos de realização de ganhos no mercado futuro tenderiam a
produzir alguma redução após a forte elevação observada durante as rodadas de
negociações ocorridas durante a manhã. Mas sugerem, ao menos, a necessidade de
lucidez e moderação antes de adotar mexidas nos preços dos combustíveis.

·  
Como
parece óbvio, os efeitos da turbulência tendem a afetar outros mercados, com
destaque para o câmbio, podendo-se antecipar mudanças repentinas de direção nos
preços da moeda norte-americana e impactos sobre exportações e importações, com
aumento da incerteza e provavelmente alguma desaceleração adicional no comércio
mundial de bens, produtos e serviços.

·  
Em
novembro passado, a Organização Mundial do Comércio (OMC) havia revisado para
baixo sua previsão para o crescimento do comércio global de 2,6% para 1,2%
(lembrando que a projeção inicial, antecipada no final de 2018, sugeria um
avanço de 3,7% no volume das transações comerciais entre todos os países). A
projeção para este ano havia sido igualmente rebaixada de 3,0% para 2,7%.

·  
A
intensidade das revisões esteve relacionada principalmente ao conflito
comercial entre Estados Unidos e China, ainda hoje sem uma solução definitiva,
oscilando entre os (maus) humores do presidente dos EUA e sua pretensa
proximidade com o líder chinês Xi Jinping.

·  
Em
meio aos riscos nada desprezíveis de agravamento da crise, que pode ser
antecipada numa eventual escada das tensões mundiais, o Brasil poderia se
beneficiar de alguma forma, graças ao cenário de crescimento da produção
doméstica de petróleo e da situação positiva na balança comercial do petróleo
(considerando aqui apenas as exportações líquidas de óleo cru).

 Nos
primeiros 11 meses de 2019, já descontado o gasto com a importação, o País
exportou 325,15 milhões de barris de petróleo, segundo estatísticas da Agência
Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), com uma receita
igualmente líquida de US$ 16,844 bilhões, a um preço médio de venda de US$
51,80 o barril. Caso venha a se consolidar um valor médio ao redor de US$ 60
por barril, as exportações poderiam registrar, em tese, um ganho líquido
próximo a US$ 2,91 bilhões. A conta, por óbvio, não inclui o impacto de um
desaquecimento na economia e no comércio mundiais e seus reflexos
sobre a atividade econômica aqui dentro.