Coluna

Combustíveis e energia explicam mais de 90% da inflação de julho

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 28 de julho de 2020

A
alta recente da inflação animou certos analistas a antecipar, desde já, uma
retomada da demanda. Nada parece mais prematuro e equivocado. Os números até
aqui sugerem uma atividade econômica ainda muito debilitada, sem fôlego para
justificar altas de preços. Então o que esteve por trás da elevação dos índices
inflacionários ou, pelo menos, do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo
(IPCA), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)? Basicamente,
os aumentos nos preços dos combustíveis e das tarifas da energia residencial,
que somados responderam por pouco mais de 91,0% da taxa de 0,30% registrada
pelo IPCA-15 de julho, que comparou os preços médios das quatro semanas
encerradas no dia 15 deste mês com as duas semanas finais de maio e a primeira
quinzena de junho.

Para
reforçar: outros indicadores começam a anotar desaceleração no ritmo de aumento
dos preços, o que sinaliza melhora nas tendências para a inflação no curto
prazo. “Melhora”, bem entendido, que não se aplica ao restante da economia, que
continua muito mal, com ociosidade elevadíssima e desemprego crescente.

Combustíveis
e energia, como se sabe, estão classificados na categoria de “preços
administrados”, ou seja, que estão sujeitos de alguma forma a decisões do poder
público. No caso dos combustíveis, por exemplo, os aumentos são decididos pela
Petrobrás, que toma como base as cotações do petróleo e de seus derivados no
mercado internacional e o impacto da variação do dólar sobre os custos
domésticos. Para o consumidor, os preços da gasolina, do etanol e do diesel
haviam experimentado recuos de 0,17%, 0,49% e de 4,39% no período de 30 dias
encerrado em 15 de junho e passaram a subir, na mesma ordem, 3,24%, 5,74% e
0,04% nas quatro semanas do mesmo mês, já refletindo o reajuste aplicado pela
estatal nos preços pagos pelas refinarias.

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O
IPCA de junho, como se recorda, havia subido 0,26% diante de uma variação de
apenas 0,02% nas quatro semanas terminadas em 15 de junho. Houve uma aceleração
de 0,24 pontos de porcentagem, dos quais 0,19 vieram do avanço registrado pela
gasolina, etanol e diesel. O IPCA-15 de julho, que mediu a variação dos preços
médios apurados entre 16 de junho e 14 de julho em relação às quatro semanas
imediatamente anteriores, registrou uma taxa de 0,30% (0,04 ponto maior do que
na medição anterior), pressionado pelos aumentos de 4,47% para a gasolina, de
4,92% no caso do etanol e de 2,50% para o diesel. Em conjunto, apenas esses
três itens responderam por 76,6% de toda a inflação do período.

Aumento igual a
zero

As
tarifas de energia vinham caindo até o final de junho, quando sofreram baixa de
0,34% e contribuíram para compensar parcialmente a pressão dos combustíveis
sobre o IPCA. Com a retomada dos aumentos, a tarifa residencial passou a subir
1,03% nas primeiras duas semanas de julho, contribuindo com pouco menos de
15,0% para a formação do IPCA-15 deste mês. Somados, gasolina, etanol, diesel e
energia elétrica explicam 91,2% de toda a inflação acumulada entre as duas
semanas finais de junho e as duas iniciais de julho. A inflação dos chamados
preços livres, que respondem por alguma coisa ao redor de 75,0% do IPCA cheio,
tem se mantido em zero desde junho, depois de recuar 0,2% em maio, segundo
estimativa do Itaú Unibanco, o que de certa forma parece refletir mais
apropriadamente o atual cenário na economia.

Balanço

·  
Entre
os preços livres, o custo da alimentação em casa, sempre considerando do
IPCA-15 de cada mês, saiu de alta de 3,1% em abril para 0,6% em maio, repetindo
a mesma taxa em junho. Mas neste mês entrou em terreno negativo, num recuo de
0,2%. Os preços de bens industriais haviam apresentado baixas de 1,0% e de 0,1%
em abril e maio, subiram 0,2% em junho, com a taxa desacelerando para 0,1% em
julho. No setor de serviços, a “inflação” mantém-se negativa desde maio, mas
com leve tendência “para cima”. Explica-se: a taxa de variação média dos preços
no setor ficou negativa em 0,5% em maio, passando a -0,3% em junho e para -0,1%
em julho.

·  
Alguns
analistas têm se apegado ao indicador que aponta o percentual de itens ou
produtos que sofreram aumentos de preços em determinados períodos – chamado de
“índice de difusão” pelos que mais preciosistas. O índice de fato avançou de
45,2% em maio para 47,1% no mês seguinte, atingindo 52,3% em julho, ainda de
acordo com o acompanhamento feito pela equipe de macroeconomia do Itaú
Unibanco.

·  
Esse
indicador, até por definição, reflete apenas, como já ressaltado, o percentual
de produtos que apresentaram elevações, ainda que mínimas, num determinado
período. Por isso mesmo, seria preciso qualificar esse índice, mostrando de
forma mais desagregada em que níveis têm ocorrido esses aumentos, em que
setores ocorrem e qual sua intensidade.

·  
Num
exemplo radical e meramente teórico, se 100% dos preços registrem aumentos,
todos na faixa de 0,1%, a inflação será necessariamente de 0,1% no mês ou muito
próximo disso. Mais claramente, o avanço do “índice de difusão” não deve ser
motivo para alarmismos, pelo menos não por enquanto, considerando-se o cenário
predominante na economia. Para complementar, o indicador registrado em julho
ainda está abaixo da média dos últimos cinco anos, mais próxima de 57%.

·  
Mesmo
índices que vinham correndo numa faixa acima do IPCA têm apresentado acomodação
e alguma desaceleração. O Índice de Preço ao Consumidor Semanal (IPC-S), aferido
pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV),
por exemplo, avançou de 0,36% no final de junho para 0,56% nos 30 dias
terminados em 15 de julho. Na semana seguinte, recuou ligeiramente para 0,53%.
A principal fonte de pressão aqui tem sido o grupo de transportes, claro, por
causa dos aumentos dos combustíveis, e ainda a energia residencial.

·  
O
Índice de Preços ao Consumidor (IPC) da Fundação Instituto de Pesquisas
Econômicas da Universidade de São Paulo (Fipe/USP), da mesma forma, havia
recuado 0,24% em maio, subiu 0,39% em junho e chegou à terceira quadrissemana
de julho a 0,22%. O período inclui os dias 23 de junho a 23 de julho, comparado
às quatro semanas anteriores, capturando ainda parcialmente a maior
liberalização das atividades na capital paulista.