Coluna

Em meio à pandemia, “riqueza” financeira aumenta R$ 450,0 bi

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 06 de agosto de 2020

A
dívida das empresas e das famílias atingiu novo valor histórico em junho,
embalada principalmente pelo avanço do endividamento em moeda estrangeira –
neste caso, explicado em grande parte pela escalada do dólar nos primeiros
meses deste ano. A contrapartida foi um crescimento ainda mais vigoroso da
“riqueza financeira”, quer dizer, da soma total das aplicações em caderneta de
poupança, em títulos públicos e privados e em quotas de fundos de investimento.
Se há correlações possíveis entre esses dados, uma delas sugere que os donos do
dinheiro têm conseguido ampliar sua riqueza, num ritmo superior à dívida
acumulada ao longo do segundo trimestre deste ano, em plena pandemia. Mas,
claro, a culpa é dos servidores públicos, que ganham muito e gastam demais.

Entre
março e junho deste ano, a dívida total das famílias e das empresas aumentou
2,51%, ao avançar de R$ 6,174 trilhões para R$ 6,328 trilhões, saindo de 84,2%
para praticamente 88,0% do Produto Interno Bruto (PIB). Houve um acréscimo de
R$ 154,70 bilhões no saldo daquela dívida no trimestre analisado. Perto de
85,0% desse acréscimo está relacionado ao crescimento de 7,7% no saldo da
dívida externa daqueles setores, que saiu de R$ 1,699 trilhão para quase R$
1,830 trilhão. Convertida ao valor médio do dólar, a dívida em moeda
estrangeira apresentou variação muito próxima de 1,2%. Mas, em reais, a alta
foi turbinada pela variação de 6,41% acumulada no período pela moeda
norte-americana.

A
soma de todas as aplicações financeiras avançou de R$ 6,897 trilhões em março
para R$ 7,347 trilhões em junho, alcançando novo recorde e crescendo 6,52%. A
“riqueza financeira”, que já havia cruzado em abril a barreira dos 100% do PIB,
passou a representar 102,13% do total de riquezas geradas pelo lado real da
economia, participação que se compara aos 94,04% registrados em março.Em meio à crise, enquanto milhões perdem seus empregos,
milhares de pequenos negócios fecham as portas definitivamente e a economia
desmancha, os donos do dinheiro conseguem acumular um patrimônio financeiro
maior do que tudo o que é produzido pela economia real, aquela que trabalha e
produz.

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Três vezes mais

Na
comparação entre as novas dívidas contratadas pelas famílias e pelas empresas
com o fluxo de novos investimentos no mercado financeiro, a diferença chega a
quase três vezes. Afinal, os donos do dinheiro engordaram suas aplicações em
mais R$ 449,574 bilhões em apenas três meses. O valor corresponde a 6,25% do
PIB estimado pelo Banco Central para junho deste ano, perto de R$ 7,194
trilhões (obviamente, numa aproximação que considera o PIB acumulado em 12
meses até junho deste ano). Não chega a surpreender que a variação observada
entre o final do primeiro trimestre e o último mês do trimestre seguinte tenha
representado mais da metade (53,6% na ponta do lápis) de todo o aumento acumulado
em 12 meses pelo saldo de todas as aplicações no mercado financeiro.

Balanço

·  
Em
12 meses, tomando junho do ano passado como referência, as riquezas financeiras
passaram de R$ 6,508 trilhões (92,34% do PIB) para os atuais R$ 7,347 trilhões,
crescendo 12,89% (ou seja, mais R$ 838,959 bilhões, algo como 11,66% do PIB).
As contribuições mais relevantes para esse desempenho vieram do salto de quase
27,0% no estoque de recursos estacionados em títulos privados emitidos pelo
sistema financeiro nacional (bancos, financeiras, corretoras e outras
instituições), do aumento nas aplicações em quotas de papéis públicos e
privados alocados em fundos de investimentos diversos e da tradicional
caderneta de poupança.

·  
A
carteira de títulos privados avançou de R$ 1,701 trilhão para R$ 2,155
trilhões, num acréscimo de R$ 454,065 bilhões – o que correspondeu a 54,12% do
incremento observado para o estoque total de aplicações financeiras. Esse tipo
de aplicação passou a responder por 29,3% do total frente a 26,1% em junho de
2019.

·  
Os
fundos observaram alta mais discreta em seu saldo de investimentos, numa
variação de 5,19% entre junho de 2019 e igual mês deste ano (R$ 3,376 trilhões
para R$ 3,457 trilhões). Como respondem por uma fatia mais gorda do total da
“riqueza financeira” (pouco mais de 47,0%), a variação em valores absolutos
atingiu R$ 175,169 bilhões, numa contribuição de 20,9% para o crescimento
geral.

·  
O
saldo das cadernetas apresentou elevação de 17,33%, saindo de R$ 804,275
bilhões para R$ 943,638 bilhões (quer dizer, R$ 139,363 bilhões a mais). Isso
significou perto de 17,0% do aumento acumulado pela “riqueza financeira” total.

·  
Em
termos proporcionais, as operações compromissadas (realizadas mediante o
compromisso de recompra) lastreadas em títulos privados registram o segundo
maior aumento, com alta de 25,4% (de R$ 58,920 bilhões para R$ 73,754 bilhões).
Mas foram o destino de apenas 1,0% dos recursos destinados aos donos do
dinheiro para aplicações financeiras.

·  
A
dívida ampliada de empresas e famílias, que contempla o saldo de empréstimos e
financiamentos, a dívida externa e outros títulos de dívida privada
(debêntures, promissórias, certificados de recebíveis imobiliários e do
agronegócio), aumentou 16,8% entre junho do ano passado e o mesmo mês deste ano
(de R$ 5,417 trilhões para R$ 6,328 trilhões, com R$ 911,0 bilhões a mais). Em
relação ao PIB, a dívida saiu de 76,9% para 88,0%.

·  
A
dívida externa contribuiu com pouco mais de 56,0% para a variação observada no
período, já que saiu de R$ 1,317 trilhão para R$ 1,830 trilhão (aproximadamente
R$ 512,2 bilhões a mais, num salto de quase 40,0%). Em grande medida, o aumento
está relacionado ao salto de 34,7% na cotação média do dólar entre junho de
2019 e igual período deste ano.

·  
A
segunda maior contribuição veio das dívidas bancárias, que avançaram de R$
3,387 trilhões para R$ 3,714 trilhões, em alta de 9,6% (ou R$ 326,50 bilhões).