Cuba elege presidente após 60 anos de governo dos irmãos Castro

O novo líder será o primeiro, desde a Revolução Cubana, com outro sobrenome e representando uma geração mais jovem do que aquela que pegou em armas para derrubar a ditadura de Fulgencio Batista

Postado em: 18-04-2018 às 08h45
Por: Márcio Souza
Imagem Ilustrando a Notícia: Cuba elege presidente após 60 anos de governo dos irmãos Castro
O novo líder será o primeiro, desde a Revolução Cubana, com outro sobrenome e representando uma geração mais jovem do que aquela que pegou em armas para derrubar a ditadura de Fulgencio Batista

A Assembleia Nacional de Cuba se reúne nesta quarta-feira
(18) para escolher o próximo presidente da pequena ilha caribenha que, nas
últimas seis décadas, foi governada pelos irmãos Castro: Fidel, que morreu aos
90 anos, e Raúl, que prometeu se aposentar aos 86. O novo líder será o
primeiro, desde a Revolução Cubana, com outro sobrenome e representando uma
geração mais jovem do que aquela que pegou em armas para derrubar a ditadura de
Fulgencio Batista (1952-1959) e desafiar os Estados Unidos (EUA), estabelecendo
um regime socialista a 150 quilômetros de sua costa.

O novo presidente de Cuba assume em um momento delicado. A
Venezuela, que fornece petróleo e sustentava o regime cubano, hoje enfrenta
grave crise econômica, marcada pela hiperinflação, o desabastecimento e o
isolamento internacional. Com a mudança de governo em 2017, os Estados Unidos
voltaram atrás no processo de reaproximação – primeiro passo para o fim do
bloqueio econômico, comercial e financeiro que continua impondo à ilha. O
presidente Donald Trump, (eleito também com o voto dos cubanos que imigraram
para os EUA e que exigem a derrubada do comunismo na ilha) voltou a limitar as
viagens e os investimentos dos norte-americanos no país caribenho.

Continua após a publicidade

Raúl Castro diz que foi eleito presidente para “defender,
manter e continuar aperfeiçoando o socialismo cubano –  e não para destruí-lo”.

A eleição representa o fim de uma era, mas muitos
observadores acham que, na prática, pouca coisa mudará na vida dos 11,5 milhões
de cubanos: o Partido Comunista de Cuba (PCC) continua sendo o único e Raúl
Castro seu chefe.

“O Partido Comunista é o órgão máximo de decisão política,
de acordo com a Constituição cubana. Raúl Castro deixa a presidência do país,
mas não o cenário politico”, disse Erika Guevara-Rosas, diretora para as
Américas da Anistia Internacional, uma organização de defesa dos direitos
humanos. “Lamentavelmente, Cuba continua sendo um país que violenta, de forma
massiva, as liberdades civis, políticas e de expressão”, acrescentou, em
entrevista à Agência Brasil, ao lembrar que é o único país do continente que não
permite acesso oficial à Anistia Internacional.

A expectativa é de que o cargo seja ocupado pelo atual
vice-presidente, Miguel Díaz-Canel, de 57 anos, que nasceu depois da revolução,
não usa farda, mas defende os ideais do Partido Comunista Cubano (PCC), onde
atua desde jovem. “Sou como muitos neste país”, disse Díaz-Canel. “Formamos
parte de uma geração que nasceu nos anos 60 e agradecemos muito toda a formação
e as possibilidades brindadas pela revolução. Tivemos a oportunidade de
participar dos processos de decisão nas organizações de base estudantis e da
juventude”.

Reformas

Até agora, só houve uma sucessão presidencial na Cuba
revolucionária e ela foi programada. Em 2006, Fidel Castro entregou o comando
do país ao irmão caçula – primeiro interinamente, depois oficialmente. Fidel
estava doente e morreu dez anos depois. Nos últimos 12 anos, Raúl Castro adotou
algumas medidas de abertura. Meio milhão de cubanos hoje trabalham no setor
privado. Desde 2013, quem quiser pode deixar o país, sem precisar de
autorização para viajar ou ter que fugir de barco, numa perigosa travessia para
a costa da Flórida. A compra e venda de imóveis e carros, mesmo limitada, foi
permitida. E a internet chegou à ilha, onde existem mais de 600 áreas publicas
com conexão wifi.

No cenário internacional, Cuba participou da 7ª Cúpula das
Américas em 2015. Foi a primeira reunião de líderes dos 35 países do Continente
Americano com a participação do governo cubano, que até então tinha sido vetada
pelos Estados Unidos. A notícia foi o histórico aperto de mão entre Raúl Castro
e o então presidente norte-americano, Barak Obama, marcando a reaproximação dos
dois países, depois de mais de meio século de guerra fria.

Apontada como responsável por disseminar revoluções
comunistas na região, Cuba patrocinou o acordo de paz entre o governo
colombiano de centro-direita, do presidente Juan Manuel Santos, e os rebeldes
das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc). Sete mil rebeldes
entregaram as armas, depois de 50 anos de conflito, para formar um partido
político, que este ano disputou as primeiras eleições legislativas.

Com a morte de Fidel em 2016, a pergunta era sobre o futuro
do país. Raúl Castro propôs ao partido limitar a idade (70 anos) e o mandato
(dois períodos de cinco anos) dos dirigentes do PCC, além de uma reforma
constitucional. E anunciou que deixaria a presidência, por decisão própria, em
abril deste ano.

Renovação

Para ex-combatentes da revolução, o sucessor de Raúl Castro
representa a renovação da cúpula do regime comunista cubano, mas a continuidade
de seus ideais. Alejandro Ferras Pellicer, de 94 anos, aposta nesta nova
geração que, ao contrário da anterior, nasceu com direito à educação e que,
segundo ele, estará mais preparada – intelectualmente e tecnologicamente – para
lutar por uma sociedade mais igualitária.

O próprio Raúl já sinalizou, em mais de uma ocasião, que a
ideologia não está em jogo – não importa quem seja o novo presidente de Cuba ou
que pressões ele terá de enfrentar. “O substituto de Fidel só pode ser o
Partido Comunista”, disse, quando os cubanos tentavam imaginar o futuro sem o
pai da revolução.

O analista politico cubano Rafael Hernández acredita que o
novo governo enfrentará pressões internas por mudanças, porque as expectativas
de melhores condições de vida vêm de longa data e cresceram com o tempo.
Segundo ele, apesar de Cuba enfrentar hoje uma conjuntura internacional menos
favorável, a ilha não está na mesma encruzilhada dos anos 90, quando a União
Soviética (principal fornecedora de petróleo a Cuba e financiadora de partidos
comunistas no hemisfério internacional) se dissolveu em 15 repúblicas separadas
– entre elas, a Rússia. 

“Nesses 60 anos, Cuba demonstrou ser capaz de sobreviver a
várias crises – até à pior delas, nos anos 90, quando muitos pensavam que
ficaria isolada e seria obrigada a mudar”, disse, em entrevista à Agência
Brasil, o analista político argentino Rosendo Fraga. “Com a saída de Castro,
uma nova geração subirá ao poder. Mas a renovação será feita para manter o
mesmo sistema em vigor”.

 Com informações da Agência Brasil. 

Veja Também