Quinta-feira, 28 de março de 2024

Redução de gastos nas eleições desafia partidos

Nova legislação proíbe doação de empresas e impõe limite rigoroso no uso de recursos para financiar as campanhas eleitoras este ano

Postado em: 24-02-2018 às 06h00
Por: Sheyla Sousa
Imagem Ilustrando a Notícia: Redução de gastos nas eleições desafia partidos
Nova legislação proíbe doação de empresas e impõe limite rigoroso no uso de recursos para financiar as campanhas eleitoras este ano

Lucas de Godoi*

Continua após a publicidade

As eleições desse ano trouxeram para os candidatos e para os partidos políticos mais um desafio: adequar as campanhas às novas regras eleitorais, que entre outras mudanças, limitam drasticamente os gastos. A nova legislação entrou em vigor com a aprovação de duas leis e valerá para o processo eleitoral deste ano. Será a primeira disputa com tempo e dinheiro reduzidos. 

Para o mestre em Direito Eleitoral e analista do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) de Goiás, Alexandre Azevedo, a medida é válida, mas não resolve os problemas de abusos financeiros, praticados geralmente com suporte de caixa dois. “Essa é uma medida positiva, porque limita o gasto eleitoral e reduz a influência do poder econômico”, comentou sobre a principal mudança. Outro ponto a se levar em conta é que agora existe um orçamento específico para as campanhas com verba pública. “Nós temos o fundo especial das eleições, que é público e que será administrado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e dividido pelos partidos políticos, nos termos que a lei determina”, ressaltou. 

A reforma parece contar com a simpatia dos partidos, pelo menos nesse primeiro momento, já que as aplicações práticas só serão sentidas quando iniciar o pleito. “Essa reforma política não resolve tudo, mas vai amenizar algumas coisas no combate à corrupção, na organização e estruturaçãodas campanhas. Nós esperamos que a consequência disso seja abrir espaço para que as disputas eleitorais sejam mais democráticas e mais representativas”, pontuou Katia Maria, presidente do PT em Goiás. 

As novas exigirão dos candidatos um maior contato corpo a corpo, além do apoio dos eleitores com doações pessoais. O MDB de Goiás viu na limitação de gastos uma decisão benéfica, principalmente para o eleitor. “Esse foco em propostas e o contato entre candidatos e eleitores são os principais ganhos do financiamento público de campanha. A limitação do valor vai também evitar a opressão financeira”, disse o deputado federal Daniel Vilela, presidente do MDB goiano, que acredita que esta será uma eleição mais colaborativa. “Com valores máximos limitados para cada nível de candidatura, a disputa ficará mais igualitária. Caberá aos candidatos que estiverem em partidos que não consiga financiá-los com o fundo buscarem doações entre seus eleitores. Será uma campanha mais colaborativa e competitiva”, pontuou.  

Controlar uso de caixa dois ainda é difícil 

Enquanto a legislação caminha a passos lentos para democratizar a disputa, fica em aberto uma questão importante, que é mapear e penalizar o uso de caixa dois. “Infelizmente reduz de um lado, mas faltam instrumentos práticos para isso, porque o caixa dois é algo muito difícil de ser, primeiramente identificado e, depois, combatido. A apuração dele não é algo simples de se fazer, tem que haver investigações que incluem quebra de sigilos, e isso na maioria das vezes só é conseguido através de denúncias de pessoas próximas aos candidatos“, explica Alexandre, analista do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) de Goiás. 

A aprovação de leis mais rígidas também se deve ao efeito da Lava Jato, observou o presidente estadual do Democratas, senador Ronaldo Caiado. “A Lava Jato expôs tudo aquilo que já denunciávamos desde a época que fui relator da reforma política, na década passada. Vai ser uma eleição onde o espaço para pirotecnias, para ficções, estará extremamente reduzido”, falou em referência ao tempo da propaganda eleitoral, que foi reduzido.  “As campanhas tinham se tornado verdadeiras peças cinematográficas, sem qualquer conexão com a realidade.”, mencionou sobre os benefícios da nova legislação. 

“Essa reforma política não resolve tudo, mas vai amenizar algumas coisas no combate a corrupção, na organização e estruturação das campanhas”, reconheceu a presidente do PT em Goiás, Katia Maria, sobre a realidade de trabalhar com orçamento muito inferior aos anos anteriores. 

Além de trabalhar com orçamento enxuto e prazo reduzido, quem estiver na disputa terá que se adaptar a um ritmo acelerado para a prestação de contas, já que as movimentações financeiras deverão ser informadas ao Tribunal Regional Eleitoral, tanto pelas instituições bancárias quanto pelos próprios candidatos, em até 72 horas. 

Já no TRE-GO, apesar de ainda ser uma preocupação, os processos para fiscalização já foram formatados e terão “uma equipe formada por servidores com a função de examinar as contas de campanha eleitoral e verificar, quase que em tempo real, a arrecadação e gastos dos candidatos e partidos políticos”, adiantou Alexandre Azevedo, sobre como o trabalho será realizado.  

“Reforma dá privilégio a pessoas que têm dinheiro” 

A reforma aprovada não traz alteração prática para as campanhas dos partidos pequenos, já que os gastos não representam nem a metade dos principais partidos. “Os tetos estão longe da nossa realidade. Mesmo em locais em que temos mais capilaridade eleitoral, como no Rio de Janeiro, não chegamos nem perto de 1/5 do teto”, falou Flávio Marcos, presidente municipal do PSOL. 

Ainda assim, ele acredita que “o teto de gastos para campanhas eleitorais representa um pequeno avanço na farra que existia, porém continua bastante elevado”, excluindo alguns setores da sociedade da disputa. “Como trabalhadores, camponeses, indígenas ou quilombolas podem participar de uma campanha para deputado que o teto está na casa dos milhões?”, questionou Flávio. 

“Em Goiás a nossa realidade é mais complicada. A campanha de todos e todas os candidatos e candidatas do PSOL não chega a 15% do que foi gasto pela média dos 17 deputados federais eleitos em 2014”, exemplificou sobre o pouco recurso disponível nos caixas do partido. 

“A reforma política no Brasil privilegia hoje as pessoas que têm mais dinheiro, vide que as campanhas podem ser financiadas 100% pelo candidato ou candidata. Nesse processo pessoas ricas cada vez mais serão maioria nos espaços do poder municipal, estadual e federal”, sentenciou Flávio Marcos.  

NOVAS REGRAS 

Entenda as principais mudanças nas regras para as eleições de outubro 

Tempo de campanha

A campanha agora terá duração de 45 dias, a metade dos pleitos anteriores. 

Sem financiamento de empresas

Essas serão as primeiras eleições gerais sem a possibilidade de financiamento das empresas. Apenas pessoas físicas podem doar, respeitando o limite de 10% de seus rendimentos do ano anterior. 

Propaganda no rádio e na TV

O período de propaganda eleitoral gratuita em cadeia de rádio e televisão será de 35 dias. Além disso, não será permitida propaganda paga no rádio e na televisão.

Propaganda na internet

Agora é permitido fazer publicações impulsionadas, que é pagar para que as postagens tenham maior alcance nas redes sociais. 

Teto de gastos

O limite de gastos leva em conta o número de eleitores da unidade da federação. De acordo com estatísticas de 2016 do TRE-GO, Goiás possui mais de quatro milhões de eleitores, ficando definidos os seguintes valores: 

Para governador: R$9,1 milhões para Goiás; Senador: R$ 3,5 milhões; Deputado Federal: R$ 2,5 milhões; Deputado Estadual: R$1 milhão. 

Debates na TV

As emissoras agora são obrigadas a convidar candidatos de partidos com no mínimo 5 parlamentares, somando deputados e senadores. 

Autofinanciamento

A resolução número 23.553 do Tribunal Superior Eleitoral, publicada em 2 de fevereiro liberou o autofinanciamento de candidatos. O texto autoriza o candidato a usar todo seu dinheiro na própria candidatura, desde que respeite o limite imposto pela lei eleitoral. 

Veja Também