Jovens entre 16 e 17 anos estão desiludidos com a política

Eleições de outubro em Goiás deve ter o menor número de eleitores entre 16 e 17 anos, que não são obrigados a votar, dos últimos 20 anos

Postado em: 21-04-2018 às 06h00
Por: Sheyla Sousa
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Eleições de outubro em Goiás deve ter o menor número de eleitores entre 16 e 17 anos, que não são obrigados a votar, dos últimos 20 anos

Lucas de Godoi*

As eleições deste ano apresentam o menor número de eleitores com idade entre 16 e 17 anos nos últimos 20 anos. De acordo com dados de janeiro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), haviam se alistado até aquele mês cerca de 47 mil eleitores não obrigatórios. São 15 mil votantes a menos do que nas eleições de 1998, quando mais de 62 mil pessoas estavam aptas a irem às urnas. Os números começam a cair no mesmo tempo em que aparecem diversos escândalos políticos. 

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O movimento não se trata apenas de um descaso por parte dos jovens, mas diz respeito à desilusão. Para o mestre em direito eleitoral e analista do TRE Alexandre Azevedo, o desinteresse dos jovens pode ser uma reação direta ao comportamento corrupto de uma parcela de políticos brasileiros e sinaliza uma desilusão. “Essa queda pode ter relação com certa desilusão com a classe política, com a classe governante, dada essa grande gama de corrupção que sempre são noticiadas. Isso leva o jovem a desacreditar-se com a política e com a própria democracia, pensando que com a votação nada se resolve”, analisa. 

Corrobora com o pensamento de Alexandre os últimos rebuliços políticos, que foram amplamente noticiados pela imprensa nacional. Até 2006 o número desse perfil de eleitor no estado crescia. Nessa época explodiu o caso do Mensalão, que envolvia políticos à compra de votos de parlamentares no Congresso Nacional. A partir daí, nota-se uma queda nos alistamentos eleitorais. 

“São vários escândalos sucessivos. À medida que eles vêm surgindo, os personagens políticos são praticamente os mesmos e não há renovação da classe política”, pontua Alexandre, enfatizando que a falta de alternância de governo “infelizmente é outra alavanca para a saída desse jovem da vida política, no sentido de [não] querer votar e [nem] querer escolher os governantes”, conclui.

Ainda de acordo com dados do TSE, nas eleições estaduais de 2010 houve redução de mais de 12% dos eleitores menores de 18 anos, em comparação com o pleito de 2006. Além da revolta, existe outra possível causa por manter esses eleitores longe das urnas. O historiador e cientista político Nasr Fayad Chaul observa que os candidatos utilizam diálogo ineficaz com este público específico. “Os tempos são outros e a linguagem não mudou. A política e o discurso são arcaicos, vivem ainda no século XIX, a educação pouco mudou também. O mundo mudou e as gerações também”, critica Nasr sobre a falta de inovação para lidar com pautas como a Educação.

Cada episódio diminui o interesse. A Operação Monte Carlo, montada pela Política Federal para desarticular a organização que explorava jogos ilegais em Goiás acertou o estado em cheio e expôs diversos políticos envolvidos com os negócios ilegais de Carlinhos Cachoeira. Esse alvoroço precedeu as manifestações de 2013, que levaram muitos jovens para as ruas a cobrar inicialmente melhoria no transporte público e depois as mais diversas pautas. Mesmo com o debate político desse cenário, as eleições do ano seguinte levaram 17.844 pessoas a menos aos colégios eleitorais. Uma queda de 27,1% em comparação com as eleições estaduais anteriores. Está é a maior queda do eleitorado não obrigatório em Goiás até hoje. 

“Quando o custo do ato de votar é muito maior do que o benefício, o peso que o voto tem de fato, a grande pergunta que fica é: porque as pessoas participam não é?” A provocação é do professor universitário e cientista político Pedro Mundim sobre o sistema político brasileiro. Ele avalia que o eleitor não considera seu papel importante na definição de uma candidatura, visto o peso que o voto individual possui. E conclui mencionando estudos que dão conta que “as pessoas que gostam e valorizam essa participação é muito baixa, porque política é um assunto chato” para a maioria, argumenta.  

Campanhas agressivas espantam eleitores 

Uma reação comum diante de embates é se afastar do processo eleitoral, observa o professor e cientista político Pedro Mundim. “Existem estudos que mostram que campanhas muito negativas, em que tem muito ataque de um lado e de outro e quando os ânimos estão muito acirrados, que o efeito disso no comparecimento eleitoral é de retração”, explica, emendando que esse pode ser um dos motivos que desestimularam os jovens nas eleições dos últimos anos. 

“É possível que essa queda seja um reflexo dessa conjuntura política que nós estamos vivendo. Estou levantando a possibilidade de isso ter ocorrido”, elenca. Mundim também avalia que a participação do voto jovem não é decisiva, por corresponder a um percentual inferior a 2% da base eleitoral de Goiás. “O efeito que isso tem na eleição é praticamente irrelevante, principalmente nas eleições majoritárias, que são para governador, presidente, etc. Pode haver um impacto maior em algum município que seja muito pequeno, mas é difícil de avaliar”, conclui. 

Para Alexandre Azevedo, mestre em direito eleitoral e analista do TER-GO, a solução é incluir a população, sobretudo os jovens, nas discussões políticas e partidárias. “Nós, como Nação, precisamos tratar melhor os nossos jovens. Fazendo isso, será o maior incentivo para que eles participem dessas políticas. E claro, com campanhas publicitárias voltadas para o público jovem, com a linguagem própria para eles”, acredita. 

O desinteresse existe

Doutor em história social, Nasr Fayad Chaul cobra dos jovens, de quem enxerga como desconectados, a participação efetiva no processo político. “Eu penso que os jovens hoje são praticamente os mesmos em qualquer parte do mundo, quase uma mesma tribo vivendo em rede. Pouco preocupados com o passado e desconectados de um futuro pré-determinado. É outra viagem em outro tempo. Mais para Star Wars do que para E O Vento Levou”, compara Nasr. 

A veterinária Isabela Ferreira, 23 anos, compõe o grupo de eleitores goianos que só se apresentam para votar após a obrigatoriedade. Ela justifica sua decisão por não acreditar nas promessas dos candidatos. “Não tive e nem tenho motivação para acreditar em promessas que não serão cumpridas, então não dou importância para votação”, sentencia cobrando seriedade para cumprir as propostas de campanha. 

Aos candidatos, cabe entusiasmar esse coletivo jovem, para que a participação cresça. O professor e cientista político Pedro Mundim cita que candidaturas ideológicas podem despertar a atenção do eleitorado. “Alguns candidatos acabam entusiasmando um grupo específico de eleitores, que tendem a participar por causa disso. Um exemplo mais claro é o caso do (ex-presidente dos Estados Unidos) Barack Obama. A taxa de comparecimento dos eleitores afrodescendentes nos Estados Unidos, que geralmente é baixa, cresceu substancialmente justamente porque primeiramente, ele era negro e gerou identificação e segundo, ele entusiasmou grande parte desse eleitorado que não participava”, exemplifica. 

“Vivemos uma era sem questões ideológicas capaz de jogar luz por sobre as diversas dimensões da política. Temas como a ecologia não se situam nem à esquerda e nem à direta. Que ideologia move essa geração?”, instiga o professor Nasr. 

Sentimento de missão

O servidor público Guilherme Araújo, 22 anos, votou pela primeira vez nas eleições municipais de 2012. Ele encara sua participação como uma contribuição para a democracia. “Eu quis fazer parte do processo exercendo o meu direito de democracia que já era garantido, o direito de escolher os meus candidatos, naquela situação os municipais, tendo a ciência que meu voto faria toda diferença”, acredita. 

Estudante universitário, Igor Afonso, 18 anos, partilha do mesmo sentimento. Mesmo sem conhecer muito do processo eleitoral, ele diz saber a importância do seu papel. “Eu tinha o direito de escolher votar ou não, então escolhi votar. Queria passar pela experiência, ver como funciona”, enfatiza dizendo que irá “votar para exercer meu papel como cidadão” e provavelmente atuará como mesário voluntário com a intenção de servir o país. 

Guilherme diz influenciar os jovens para que votem e compreendam a extensão da política. Ele condena o “o desinteresse dos eleitores” e considera a participação do jovem como essencial. “É preciso entender que tudo gira em torno da política, se você não faz parte dela, alguém a faz pra você. Ter o mínimo de noção que num futuro próximo nós jovens seremos os protagonistas, ter autonomia, instinto de liderança e interesse”, arremata.  (*Especial para O Hoje) 

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