O ‘Livro dos Começos’, de Noemi Jaffe, marca o fim da Cosac Naify
Último lançamento da editora, obra traz ensaios poéticos sobre o começar, “estar condenado ao fim”
Por uma ironia do destino, o último livro a ser publicado pela editora Cosac Naify é o Livro dos Começos, da escritora e tradutora Noemi Jaffe. Não se trata de uma obra tradicional. O livro é uma caixa que guarda várias lâminas, cada uma com um ensaio poético sobre começar. Sem ordem pré-definida e numeração, a ideia surgiu a partir de conversas de Noemi com a editora Heloísa Jahn. Afinal, é possível começar de qualquer lugar, não necessariamente da primeira página.
“No Livro dos Começos, você começa na ordem que quiser. A ideia é não ter um começo só. Até porque todo começo é diferente”, explica Noemi. “O último livro da Cosac se chamar Livro dos Começos é como se fosse um augúrio. Uma coisa que está terminando, mas pode começar. E vários dos ensaios falam sobre isso. Se você começa algo é porque aquilo vai acabar. Começar é estar condenado ao fim”, completa.
A escritora conta que escrever sobre os começos foi uma forma de refletir sobre algo que a aflige durante toda a produção de um livro. Ela argumenta que os começos são sempre artificiais porque, na vida, as coisas nunca começam, mas seguem um fluxo. “Mais do que nomear, designar um começo é localizar algo no tempo e condená-lo à temporalidade, já que o começo é um elemento da tríade composta de passado, presente e futuro. O que agora é começo, em muito ou pouco tempo já será passado”, escreve Noemi.
“O tempo todo eu penso nisso. Ao longo da escrita de um livro, você está o tempo todo começando. Eu tento fazer com que o leitor sinta um fluxo de simultaneidade, mais do que uma série de causas e consequências, tal como é a vida. O desafio é fazer o tempo narrativo soar natural”, afirma a escritora.
Noemi é bastante ativa no Twitter. No seu perfil na rede social e em seu blog, ela escreve sobre a origem das palavras, estabelecendo relações curiosas entre elas. No domingo passado, a escritora mostrou que “idiota” e “idioma” têm a mesma raiz: próprio, peculiar. “São peculiaridades dos falantes de uma língua e dos limítrofes mentais”, escreveu. Já na sexta-feira, ela apontou um parentesco mais inusitado, entre “caralho” e “caráter”. Ambas vêm do ferro pontiagudo utilizado para marcar bois. Seu interesse pela etimologia das palavras é muito antigo e está relacionado ao seu ofício de tradutora. Noemi diz que a história de cada palavra já dá um conto.
“Quem vai fundo nas origens das palavras passa a conhecer segredos sobre a vida. Somos mais capazes de compreender alguns mistérios de como as coisas funcionam. É como se eu buscasse um tempo em que as palavras e as letras tivessem um motivo para ser do jeito que são, e não arbitrárias como hoje”, finaliza a escritora.