Dias e dias distante do meu tutor
Médica veterinária explica como lidar com o comportamento dos cães na ausência de seus donos
Elisama Ximenes
Os pais de Rebeca viajaram no início do mês de julho. Desde então Bilbo, o cão da casa, mudou o comportamento. O vira-lata, que costumava ser agitado e brincalhão, agora anda triste, quieto e muito carente. A ausência dos seus tutores causou a mudança e levanta uma reflexão sobre a possibilidade de os pets sentirem saudade. A quietude de Bilbo, no entanto, não é um comportamento único em todos os cães com saudade. Alguns ficam mais agressivos ou mais agitados, fazendo-se irreconhecíveis. A médica veterinária Patricia Lorena Neves, doutora em Ciência Animal, explica como isso funciona e por que há essa disparidade de comportamentos entre os animais.
A doutora elucida que o que os cães sentem é, na verdade, uma síndrome da ansiedade da separação. O seu comportamento varia de acordo com o tipo da sua criação e também tem influências genéticas. Quer dizer, um cão que foi educado a se comportar vai ficar mais quieto, e o contrário também ocorre. Já com relação à herança genética, raças com tendências mais agitadas apresentarão um comportamento mais agitado também. No caso de Bilbo, Rebeca conta que ele foi criado de um modo mais agitado, sempre brincando e recebendo atenção, no entanto, o comportamento na ausência é de quietude. Doutora Patrícia explica que isso ocorre porque a síndrome da ansiedade pode resultar em uma depressão.
Além do comportamento resguardado, o vira-lata também apresentou dificuldades para comer. “Isso é causado pela ansiedade que é gerada no animal”, explica a veterinária. Ela recomenda, ainda, que a pessoa que estiver cuidando do cão, durante este tempo de ausência dos tutores, busque ajuda e procure recursos que evitem que o cão fique desnutrido ou depressivo. “A gente chegou a dar comida na boca dele, quando ele se recusava a comer; também misturo com um pouco de carne na ração”, conta Rebeca. No caso da tristeza, a veterinária indica que os cuidadores deixem brinquedos disponíveis para o pet. “Deixar um som ambiente, quando ele estiver só, também ajuda, porque diminui a sensação de solidão”, explica Patrícia. Segundo ela, outra dica é deixar roupas usadas com o cheiro do tutor disponíveis para que o cão não sinta tanto a sua falta.
De acordo com a veterinária, é fundamental que medidas para compensar essa recusa a comer, beber água ou, em alguns casos, dormir, deve ser tratada, porque influencia na qualidade de vida do cão. Caso as recomendações feitas por Patrícia não sejam suficientes, ela recomenda que o pet seja levado a uma clínica veterinária, onde prescreverão remédios para tranquilizar o cão. Ainda como forma de prevenção, Patrícia Neves aconselha que os pets passem por treinamentos para ausência e presença do tutor.
A doutora, que é mestre em sanidade animal, explica, ainda, que a tristeza se dá porque o cão se sente abandonado independente do tempo de duração da ausência. “Ele sente isso desde o momento em que percebe que o dono vai sair, tanto que não sai de perto, ou fica muito carente quando o dono está se arrumando para trabalhar”, exemplifica a veterinária. No Bilbo, esse comportamento é comum. Rebeca conta que ele já fica muito carente e começa a seguir os donos por todos os lados quando percebe que vão sair. Por esse mesmo motivo, a alegria do animal quando o tutor retorna é intensa.
Bilbo é um cão que tem atenção o dia inteiro. Toda a hora do dia tem alguém em casa e, pelo menos uma vez ao dia, alguém sai para passear com ele. No momento da ausência dos principais donos, o único momento em que fica alegre é quando Rebeca ou o tio Márcio o chamam para passear. No caso de pets que ficam sozinhos a maior parte do dia, a veterinária esclarece que o momento do passeio é essencial. “O exercício físico deixa o cão mais tranquilo e mais próximo do dono também”, explica.
Diferente de Bilbo, muitos cães transformam o sentimento de abandono em choros, uivos e latidos repetitivos. “É preciso estar atento a essa vocalização, porque isso pode provocar transtornos com os vizinhos”, ressalta Patrícia. Ela ainda lembra que a Lei nº 3688/41 prescreve, no parágrafo 4º do Artigo 42, que provocar ou não impedir barulhos provocados por animais pode incorrer em punição com multa ou, até mesmo, prisão do dono. Por isso é importante que o dono conheça o seu cão, saiba como ele se comporta na ausência e aja na prevenção e tratamento desse comportamento. No caso de viagens, se o período da ausência for muito longo, a veterinária recomenda que o cão seja levado, porque os pets sentem amor pelos donos. “Isso para viagens de mais de três meses ou anos”, explica.