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quarta-feira, 28 de agosto de 2024
Música

Elza Soares apresenta ‘A Mulher do Fim do Mundo’ nesta sexta

Cantora do milênio, Elza Soares apresenta show nesta sexta-feira, no Centro Cultural Oscar Niemeyer, em Goiânia

Postado em 22 de setembro de 2016 por Toni Nascimento
Elza Soares apresenta 'A Mulher do Fim do Mundo' nesta sexta
Cantora do milênio

Elisama Ximenes

Ela quer cantar até o fim. Mais do que quer, ela vai. A força é sua característica desde sempre. Aprendeu, desde cedo, a ser forte. Ela própria já disse: sabe de uma coisa? Eu sou forte mesmo. A voz rasgada e mais que afinada reforça isso. Elza Soares não só é a mulher do fim do mundo como é a cantora do milênio. É com uma bagagem de 60 anos de carreira que Elza sobe, nesta sexta-feira (23), ao palco goiano para apresentar o show que, no repertório, tem como protagonista o último álbum, A Mulher do Fim do Mundo. 

De que planeta ela veio? – um dia perguntaram. E ela  respondeu: “do planeta fome”. Hoje, suspeita-se, a resposta poderia ser “do fim do mundo”. Não o fim comum que se vê em filmes, como 2012 e outros apocalípticos, mas, como é por ela explicado, o fim das coisas feias e da pouca vergonha. No último álbum – primeiro, exclusivamente, de inéditas – Elza transborda sua luta pelo fim dos preconceito de classe, do racismo, do machismo, do sexismo e da homofobia. Desde o início de sua vida e durante a carreira, ela não esconde esse desejo, mas, em A Mulher do Fim do Mundo, ela grita por ele.

O grito é escancarado logo na canção que dá nome ao álbum. “Na avenida deixei lá a pele preta e a minha voz”, canta. Em Coração do Mar, ela é a própria imensidão, que contém o mundo em si. A Maria da Vila Matilde é a própria mulher que grita, que denuncia, que liga no 180, que dispõe de instrumentos legais para se defender da violência misógina. Precisou que a outra Maria, a da Penha, quase morresse para que isso fosse possível. A Luz Vermelha deixa a previsão: “Bem que o anão me contou que o mundo vai terminar num poço cheio de merda”. Elza é fogo que se derrete tonta. 

Foi ela quem teve coragem de falar de Benedita, mais uma travesti marginalizada que, nos versos, enfrenta as violências que lhes são impostas. E é com firmeza que Elza canta na linguagem da periferia. “Beleza, mano, fica com Deus”, não tem vergonha de desejar. Assim como é fogo, em dança ela pede que deixem que a chuva que derruba o céu a lave. E, mais uma vez, em Solto, Elza mostra sua independência, porque seu corpo caminha sozinho sem você. Por fim, ela é gratidão à mulher de sua vida. “Levo minha mãe comigo embora já se tenha ido”, repete. Depois de ouvir o álbum de Elza várias vezes, porque é impossível escutar apenas uma vez, entende-se quando ela diz que o show de amanhã é forte.

Nascida em 1937, Elza chega a 2016 com a voz que encantou desde as primeiras apresentações em shows de calouros, fosse cantando samba, bossa nova, MPB, sambalanço, samba rock ou samba jazz. Em 1999, a Rádio BBC de Londres elegeu-a a cantora do milênio. Filha de Rosária Maria Gomes e de Gomes Soares, nasceu na favela da Moça Bonita, Rio de Janeiro, mas foi criada no bairro da Água Santa. Aos 32, quando conheceu o jogador de futebol Garrincha e casou-se com ele, foi julgada, mas, hoje, cantora do milênio, é exaltada e venerada. Com uma carreira longa e consolidada, Elza não poderia deixar de cantar alguns dos seus sucessos na noite de amanhã. “Vou cantar  A Carne, Malandro e Opinião”, ela adianta. O critério para essa escolha é simples: “são músicas que eu gosto muito”.

SERVIÇO:
Show com Elza Soraes

Quando: Sexta-feira (24 de setembro)
Onde: Centro Cultural Oscar (CCON)
Quanto: A partir de R$ 46
Venda: https://meubilhete.com/elzasoaresgoiania 

 

Entrevista – Elza Soares

“Me deixem cantar até o fim” marca os trechos finais da música A Mulher do Fim do Mundo. Depois, o verso passa a ser afirmativo: “Eu vou cantar até o fim”. O que isso significa para a luta da mulher por emancipação?

Significa que a mulher está tomando o rumo da própria vida. Está no rumo certo, no caminho certo, buscando esse espaço, mostrando que é capaz.

E o seu coração é como o Coração do Mar, que é terra ninguém conhece?

Lógico, é terra que ninguém conhece, que contém o próprio mundo, como um hospedeiro.

Então você é mar?

Eu sou o mar.

Maria da Vila Matilde é música forte que fala da realidade da mulher brasileira e, principalmente, da mulher negra que representam mais de 50% das mulheres que denunciam violência doméstica. Como mulher negra, como é cantar essa música, que tornou-se símbolo feminista?

Essa música veio para mostrar a realidade da mulher que não grita, que não vai à luta porque tem medo. Agora, com a lei, ela pode denunciar, mas de que adianta se ela volta pra casa e é ameaçada? Tem que ter um amparo. Ver que isso é uma realidade principalmente da mulher negra e pobre é duro, é muito difícil. A violência é uma realidade da mulher brasileira, mas é mais difícil ainda para a mulher negra e pobre que tem menos amparo e tem medo e vergonha de denunciar.

Como você começou a cantar essas temáticas de luta?

Essas lutas me marcam, eu pertenço a essa realidade, faz parte do meu pertencimento social.

Como foi, para você, cantar na abertura da Olimpíada no Brasil?

Foi lindo, a emoção foi grande, foi tudo muito bonito.

A música Benedita fala de uma travesti e da sua realidade dura. O que você acha que tem que ser feito para que a realidade delas melhore?

Elas têm que ser mais respeitadas, como qualquer ser humano. Elas pagam impostos como todo mundo, tem que ter respeito.

Qual o conselho você daria para a juventude que está começando na carreira musical?

Tem que ter muita simplicidade, humildade e respeito.

A carne é uma das músicas que marcaram sua carreira, é impossível ler a letra sem imaginar sua voz cantando e é uma música que fala da realidade dos negros. Como é, para você, falar sobre isso?

Uma vez disseram que tinha que haver o preconceito. E essa é uma realidade horrível. Precisava que alguém falasse ou cantasse sobre isso.

Qual a expectativa para o show em Goiânia?

A expectativa é grande. Gostaria de convidar a todas e todos a comparecer.

Para terminar, quem é a mulher do fim do mundo?

É a mulher que tem fé, que acredita, que sabe que quer o fim do mundo, mas não esse que todo mundo conhece, quer o fim da pouca vergonha, das coisas feias da vida que acontecem no mundo. É a mulher que luta por isso.

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