O Hoje, O Melhor Conteúdo Online e Impresso, Notícias, Goiânia, Goiás Brasil e do Mundo - Skip to main content

segunda-feira, 25 de novembro de 2024
PublicidadePublicidade
Autoconhecimento

O que é a antiginástica e o que ela pode fazer por você e seu corpo

Nome gera mal entendido, mas prática busca autoconhecimento do corpo

Postado em 14 de janeiro de 2018 por Lucas de Godoi
O que é a antiginástica e o que ela pode fazer por você e seu corpo
Nome gera mal entendido

A jornalista Carolina Robino, repórter da BBC Mundo, serviço em espanhol da BBC, conta abaixo sua experiência com a antiginástica:

Cada vez que conto a alguém que estou fazendo antiginástica sou bombardeada por risadas e piadas:

– Como é? Você não faz nada? É perfeito para mim.

– Você senta no sofá e assiste à televisão? Que legal!

– Perder peso sem sair de casa? Maravilhoso!

Sim, o nome pode gerar mal entendidos, mas os piadistas estão muito longe da realidade.

A antiginástica é uma prática corporal que busca autoconhecimento do corpo e o entendimento de que várias partes diferentes se conectam. O método também busca reconhecer e despertar áreas que estão adormecidas, que perderam mobilidade ou sensibilidade, com o objetivo final de aumentar o bem-estar.

Por exemplo:

Em minha primeira sessão – que, diferentemente das outras, foi individual -, passei muito tempo deitada no chão apenas mexendo a língua e a mandíbula para todos os ângulos imagináveis e possíveis, tentei com relativo sucesso mover meu dedinho sem mexer os outros dedos e sem tirar o pé do chão, e mantive uma perna levantada para o teto por vários minutos.

E isso foi tudo.

Para minha surpresa, quando cheguei em casa, deitei no sofá e dormi profundamente durante pelo menos três horas. Estava esgotada. Algo raro? Nem tanto. O esforço para mexer algo há muito tempo parado pode ser extenuante, mas tem sua recompensa.

Rompendo padrões

A antiginástica foi criada na década de 1970 pela fisioterapeuta francesa Thérèse Bertherat, que dedicou boa parte da sua vida a observar o corpo e entender tanto o potencial que ele tem, quanto os obstáculos que criamos.

Seu trabalho foi inspirado principalmente nas pesquisas de sua colega e compatriota Françoise Mézières, que analisou com profundidade a poderosa cadeia de músculos entrelaçados na parte de trás do corpo, desde a base do crânio até debaixo dos pés.

Bertherat acredita que muitos dos males que nos assolam vêm do excesso de tensão, encurtamentos e contrações dessa cadeia de músculos. Ela apostou que exercícios de alongamento ajudariam a relaxar o corpo para que, eventualmente, todos os ossos, músculos, tendões e ligamentos voltassem ao lugar, naturalmente.

“Minha mãe era uma mulher muito pragmática, estudiosa e observadora”, explica Marie, filha de Bertherat, que desde a morte da mãe, em 2014, administra o principal centro de antiginástica do mundo, em Paris.

Seu método se desenvolveu a partir de diversas disciplinas que ela investigou e praticou – psicanálise, acupuntura e rolfing (espécie de medicina alternativa), entre outros – mas, acima de tudo , da extrema observação de como nos movimentamos, paramos, caminhamos e nos sentamos.

Ela chamou de “antiginástica” um pouco por acaso, porque queria escrever sobre o tema e precisava de um nome. Nos anos 1970, era moda romper com modelos e padrões.

Seu próprio marido se ocupava com a antipsiquiatria, que defendia tratamentos mais brandos para pessoas com doenças mentais. Ironicamente, ele foi morto por um de seus pacientes.

O corpo e suas razões

Em 1976, Thérèse Bertherat publicou O corpo e suas razões, livro que virou best-seller instantâneo e expôs suas ideias a milhões de leitores em todo o mundo.

Depois de lê-lo, milhares de pessoas escreveram para ela pedindo ajuda para salvá-los e curá-los.

Isso a desconcertou. Inicialmente, ela pensou que esses leitores não tinham entendido a proposta. Se tornar uma espécie de guru era algo que estava bem longe de suas intenções.

“É uma pedagogia no sentido de que dá informações sobre si mesmo”, explicou ela.

“Mas não existe magia.”

Na antiginástica, tudo tem uma razão anatômica. Ela é direcionada a cada parte do corpo: pés, ombros, olhos, mandíbulas, costas, abdômen, períneo, diafragma, espinha, ombros, clavículas. Ao mesmo tempo, ela também se volta para as conexões entre essas partes.

Quando se esfrega repetidamente a palma de uma mão, pode-se estar, sem saber, ajudando de alguma maneira a alongar o músculo do trapézio. E, ao movimentar a língua repetidamente, estamos fortalecendo ou soltando a traqueia – ou, ainda que seja difícil notar, fortalecendo também as pernas.

Todos os exercícios são ferramentas para tomar consciência do próprio corpo e de como ele pode contar nossa história e emoções.

Bertherat descreveu essa ideia muito bem, usando uma metáfora:

“Há uma casa que tem seu nome, você é o único proprietário, mas você não pode entrar. Você fica afastado, na frente da fachada, porque você perdeu a chave (…) Mas as paredes sabem tudo, elas não se esquecem de nada.”

Dor crônica

Mariela Panero tem 47 anos e há dez descobriu a antiginástica. Ela é argentina e vive em Londres desde 1998. Sempre trabalhou com o corpo – primeiramente como bailarina e, em seguida, como professora de pilates.

“Eu acreditava que conhecia meu corpo, mas tudo que tinha feito era treiná-lo, forçá-lo e domesticá-lo”, conta.

“Como tanta gente, exigia muito (do corpo) e comecei a ter dores crônicas nas costas e na cabeça. Eu não queria passar pela rotina médica de injeções, remédios, exames. Então comecei a investigar, a ler”, diz.

Ela descobriu o livro O corpo e suas razões – e leu em dois dias.

“Vi que era o caminho que eu queria seguir”, afirma.

Panero estudou a técnica na Espanha, um dos países onde há praticantes e entusiastas do método criado por Bertherat. Há também cursos de formação em outros 32 países, como Brasil, Argentina, Chile, Colômbia, Equador, México, Peru, Uruguai e Venezuela.

Cada um por si

A antiginástica se desenvolve em ciclos de 11 ou 12 sessões. Ao fim de uma, começa outra totalmente diferente.

Ao contrário de outras técnicas de trabalho corporal, você nem sempre sabe a razão de estar fazendo aquele movimento. O instrutor dá apenas dicas, sem nunca mostrar como fazer exatamente. Também não há espelhos, para que o participante não copie o jeito de se movimentar do colega. Cada um trabalha com seu próprio corpo.

Não é necessário ter experiência ou qualquer doença, embora muitos que começam a praticar o exercício sofram de dores físicas. A antiginástica pode ser praticada por qualquer pessoa.

“Você só precisa ter um corpo”, brincou Bertherat.

“Eu vi atletas que tentaram fisioterapia ou reabilitação, e que apenas com a antiginástica conseguiram competir novamente”, diz Panero. “Mas também há pessoas que não têm nada, que ouviram falar sobre o método e ficaram curiosas” .

“Talvez uma pessoa com excesso de peso, à medida que se conhece, acaba perdendo peso, mas não é cardiovascular”, ela esclarece.

“O corpo é maleável e, até morrer, há sempre a possibilidade de ser melhor”, diz ela. “O que estamos procurando nos exercícios é ser um pouco mais felizes, mais livres e mais autônomos”.

Ela acrescenta: “O corpo gosta de bem-estar e, uma vez que o encontra, vai querer mais”.

Talvez seja por isso que as pessoas resistem e insistem nas sessões, mesmo que algumas delas sejam francamente estranhas e até mesmo desconfortáveis.

Foi o que aconteceu com Peter, um londrino de 56 anos que pratica antiginástica há cinco anos:

“Algumas das aulas podem ser exigentes, mas quando terminam sempre me sinto mais confortável com meu corpo. É algo sutil e efetivo.”

“As lições se tornaram um oásis semanal em que descubro meu corpo, com tempo e paciência. Experimentei mudanças profundas não só nele, mas também na alma”, conclui.

Voltando às piadas, encontrei uma boa metáfora para explicar o que faço: é como ir ao psicólogo, mas quem fala é o corpo. Ouvir isso é surpreendente. Você pode nos contar as coisas mais interessantes sobre a autocobrança, a importância de reconhecer nossos limites e a felicidade.

Um dia, um tempo atrás, enquanto esperava o ônibus, comecei a sorrir. Se alguém tivesse me perguntado a causa, minha resposta teria sido: “Eu apenas senti como o fêmur se move na articulação do quadril”.

Pode não parecer grande coisa, mas eu garanto que a antiginástica provoca alegria. 

(BBC)

Você tem WhatsApp ou Telegram? É só entrar em um dos canais de comunicação do O Hoje para receber, em primeira mão, nossas principais notícias e reportagens. Basta clicar aqui e escolher.
Veja também