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sexta-feira, 27 de dezembro de 2024
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Exigências

Lei de Cotas muda nas universidades federais e medida já está em vigor

Informações repassadas à universidade durante escolha de curso serão confrontadas. Também haverá análise visual de quem se inscrever no sistema de cotas

Postado em 12 de março de 2018 por Sheyla Sousa
Lei de Cotas muda nas universidades federais e medida já está em vigor
Informações repassadas à universidade durante escolha de curso serão confrontadas. Também haverá análise visual de quem se inscrever no sistema de cotas

Marcus Vinícius Beck*

Com a intenção de evitar fraudes no sistema de cotas, a Universidade Federal de Goiás (UFG) criou no início deste mês uma comissão que irá avaliar se o aluno calouro atende as exigências para ingressar na instituição por meio da Lei de Cotas. A medida já está valendo para quem assegurou uma vaga no último Sistema de Seleção Unificada (Sisu) e foi aprovado para este semestre em algum curso ofertado pela UFG. No momento da matrícula, a universidade fará com que o estudante formalize sua autodeclaração cotista em documento.

As informações passadas pelo aluno à instituição devem ser confrontadas com os dados disponibilizados por ele quando preencheu o campo da escolha do curso, na página do Sisu. Já os alunos que se candidatarem a uma vaga pelo sistema de cotas étnico racial da UFG terão de assinar um documento de autodeclaração no ato da matrícula. Na sequência, o estudante passará por uma análise em que serão checadas suas características na aparência. Desta forma, a matrícula só poderá ser feita pelo próprio aluno e não por meio de procuração. 

Atuante no movimento negro, o estudante de Direção de Arte Bruno Borges, 21, contou que entrou na UFG por meio do sistema universal e não sentiu dificuldade para conseguir uma boa nota no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), uma vez que seus pais conseguiram lhe custear educação nos melhores colégios de Goiânia. “As cotas são destinadas para 50% dos estudantes, mas a gente não vê bem isso quando entra na universidade: o espaço de conhecimento ainda é branco, colonizado, elitista e de classe média”, afirmou.

Além da falta de representatividade nas universidades de grupos marginalizados, os casos de fraude são comuns e cerceiam o direto destinado a quem é de fato cotista, e não consegue concorrer pelo sistema universal. Tanto que os próprios alunos da UFG, que conversaram com O Hoje na última semana, disseram que não é raro encontrar pessoas que usem do advento das cotas para ingressar, de forma mais fácil, na Academia. 

A estudante de Direito, Ellen Roche, 20, garantiu que as fraudes no sistema de cota não é uma realidade apenas da UFG, mas também de todas as universidades públicas que possuem o sistema destinado aos cotistas. Ele ainda frisou que, ao se autodeclarar estudante de escola pública, negro ou pardo, é necessário que haja esse reconhecimento por parte da comunidade civil acerca da afirmativa. “O propósito da Lei de Cotas é inserir as pessoas que pertencem a grupos racializados e, portanto, a medida da UFG intimida fraudadores”.

A lei

Embora esteja em vigor há mais de dez anos, a Lei de Cotas ainda gera polêmica que são muitas vezes baseadas em informações inverídicas e equivocadas. No âmbito nacional, outras instituições públicas, como a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), foram acusadas de instaurar um “tribunal racial”. Professores da Universidade Federal de Goiás (UFG) afirmam que autodeclaração é um documento que pode ser checado em qualquer momento. 

A estudante de Letras em Estudos Literários da UFG, Rafaela Lincoln Lima, 23, disse que a comissão criada pela UFG contemplou as pautas do movimento negro. “Certamente, de agora em diante, os fraudadores irão pensar mais de duas vezes antes de cometerem fraude e se inscreverem no sistema de cotas”, declarou. “Casos de estudantes brancos usando vagas de cotistas negros, por exemplo, são casos comuns na universidade”.

Mesmo com pouco tempo entre a publicação da Resolução que determina a criação da comissão e o início das matrículas, o trabalho deverá assegurar a representatividade de diversos grupos de pessoas que estão engajadas com a questão étnico-racial. A ideia da Comissão de Verificação é travar um diálogo entre os movimentos sociais que levantaram a bandeira do reconhecimento da população negra no espaço em que é conhecido de propagação do conhecimento. 

“Para se ter uma ideia, vi comentários na internet afirmando que a comissão antifraude criada pela UFG seria um ‘tribunal de melanina’”, relatou o estudante de Direção de Arte da UFG, Bruno Borges, 21. De acordo com dados divulgados em 2014 pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), 1,7 milhão estudantes se autodeclararam negros no ensino superior. Em 2010, esse número era de apenas 684 mil, revelando que a quantidade de afrodescedentes na educação superior chegou a 153%.

Mestra em história e integrante do movimento que implantou o sistema de Cotas na UFG, Marcia Danielle disse que o trabalho desenvolvido pelas comissões e a adoção do critério fenótipo são uma das prerrogativas do Movimento Negro no espaço de ensino superior. “As comissões são fundamentais para barrar fraudadores e garantir a presença de estudantes negros e negras nos cursos para a universidade, assim como outros espaços de poder da sociedade, para ser engrandecida com pessoas, de fato, negras”, afirmou.  

Universidades federais investigam alunos por suspeita de fraude 

Uma em cada três universidades federais do País já chegou a investigar a matrícula de seus estudantes por suspeitas de terem fraudado o sistema de Cotas Raciais. Em levantamento realizado pelo jornal O Hoje, integrantes do movimento negro em Goiânia e atuantes na implantação da Comissão de Verificação da Universidade Federal de Goiás (UFG) disseram que há casos em que, numa unidade da UFG, de 100 cotistas alunos pelo menos 40 são fraudulentos. 

O governo federal, pensando em reduzir os casos de fraude, afirmou em janeiro que pretendia formatar uma comissão para que houvesse orientação visual em alunos de universidades públicas. O jornal O Estado de São Paulo informou, em levantamento, que das 63 federais do Brasil, 53 responderam aos questionamentos do jornal acerca dos casos de alunos brancos ocupando vaga destinada à cotista negro. 

De acordo com o jornal, há 595 estudantes investigados em 21 instituições de ensino. A maioria dos acadêmicos teve matrícula indeferida, porém uma parte deles conseguir voltar aos estudos por liminares obtidas na Justiça. É comum de se encontrar também documentos analisados em que foram encontrados estudantes que se autodeclararam quilombolas sem nunca ter vivido em uma comunidade. Também é comum casos de alunos que são acusados pelo movimento negro de serem brancos. 

Desta forma, o governo do presidente Michael Temer (MDB) declarou que iria reativar um grupo de trabalho, que seria encabeçado pelo Ministério de Direitos Humanos e incluiria secretarias do Ministério da Educação da Fundação Nacional do Índio (Funai). A intenção era que a Funai deveria terminar um documento para dar base a comissões de aferição de autodeclaração da etnia dos estudantes em todas as universidades federais do País. 

Matrículas

As matrículas por curso e turno em universidades federais e institutos federais de educação, ciência e tecnologia devem ser 50% destinadas a alunos que estudaram em tempo integral no ensino médio público. A outra metade das vagas é destinada para candidatos oriundos de colégios particulares. As reservas de vagas são subdivididas. Metade é para alunos de escolas públicas com renda familiar bruta igual ou superior a 1,5 salário mínimo per capita. Já a outra metade para alunos de escola pública com renda familiar superior a 1 salário mínimo. 

Marcus Vinícius Beck é estagiário do jornal O Hoje, sob orientação do editor de Cidades Rhudy Crysthian. (Foto: Divulgação)

 

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