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quinta-feira, 26 de dezembro de 2024
1950

Família desenterra cápsula do tempo

Acervo histórico de cartas, bilhetes, documentos e moedas da década de 1950 estava enterrado em cápsula do tempo

Postado em 26 de janeiro de 2019 por Sheyla Sousa
Obra do Terminal Isidória só será concluída em 2021
Com pouco menos de dois meses para o fim do ano

Higor Santana*

Uma família de Goiânia guarda em casa objetos históricos e únicos da Capital que revelam detalhes da vida na cidade nos anos de 1950. São fragmentos de uma cápsula do tempo encontrada por uma incorporadora no Setor Coimbra, um dos bairros mais antigos da cidade. Além de cartas e bilhetes, há exemplares da moeda da época, o Cruzeiro, e fotografias da então primeira diretoria do Goiânia Tênis Clube, já extinto.

A cápsula foi encontrada em 2016, quando uma retroescavadeira retirava terra durante as obras em um prédio no setor Coimbra, região central da Capital. Com 98 metros de altura, o prédio se destaca em meio a paisagem com linhas no estilo Art Déco, remetendo aos tempos áureos em que a cápsula foi enterrada.

Todo esse material é preservado pelos irmãos Perseu e Dirceu Matias. Os objetos ficam guardados no arquivo da família, em uma chácara no Parque Anhanguera. Perseu, com 84 anos, e Dirceu, com 81, têm um bom motivo para guardar os fragmentos da cápsula: eles estavam lá quando o artefato, um garrafão de vidro, foi enterrado, há cerca de 60 anos. “Decidimos enterrar a cápsula para marcar o ato de instalação da pedra fundamental da construção do Goiânia Tênis Clube”, lembra Dirceu. Na época, seu irmão Perseu presidia a entidade.

Dirceu conta que a cerimônia de instalação da pedra fundamental reuniu políticos, intelectuais e autoridades, como o então arcebispo metropolitano de Goiânia, dom Antônio Ribeiro de Oliveira, falecido em 2017. As impressões dos fundadores do Goiânia Tênis Clube e de populares sobre a sociedade da época, e as perspectivas que tinham para o futuro ficaram eternizadas nos bilhetes que foram enterrados. O que Dirceu não imaginava é que estaria vivo para reencontrar, seis décadas depois, as cartas que ele, Perseu e os amigos escreveram. “Foi um reencontro com o passado, uma surpresa que a vida me reservou”, diz.

Dirceu ressalta que o salão de eventos era o principal atrativo do clube, que tinha ainda secretaria, bar, cozinha e salão de jogos. Segundo ele, o Goiânia Tênis Clube era frequentado por pessoas influentes da Capital, já que seu irmão tinha relação próxima com governantes da época. Perseu chegou a atuar na Prefeitura de Goiânia como secretário de Governo e secretário de Educação.

“Tudo isso me traz um pouco de nostalgia. Principalmente levando em conta que o Goiânia Tênis Clube foi demolido, mas nos toca o coração. Nada é eterno, nós vamos estar sempre preparados para as surpresas que o destino nos reserva”, disse Dirceu.

O reencontro

Uma casualidade levou Dirceu ao reencontro com a cápsula do tempo. “Eu estava passando na Rua 220 [no Coimbra], quando pedi à minha esposa para esperar. Foi então que eu bati na porta da obra e perguntei se não haviam encontrado a cápsula”, detalha o aposentado. Coube ao engenheiro civil Washington de Oliveira, da GPL Incorporadora, uma das empresas responsáveis pelo empreendimento, dar a resposta positiva a Dirceu. O garrafão de vidro havia sido desenterrado. Apesar da coincidência da ida de Perseu ao canteiro de obras, a construtora já estava se mobilizando para encontrar os responsáveis pela cápsula do tempo.

A peça não resistiu ao impacto com a retroescavadeira, mas os profissionais da construtora, ao avistarem os papéis antigos que saíram dela, pararam o equipamento e cuidadosamente recolheram os materiais. Foi quando identificaram que era uma cápsula do tempo, relata Washington sobre a descoberta. “No momento, a gente não sabia exatamente do que se tratava o objeto. Mas pelos papéis e fotos que saíram dele, dava para perceber que o garrafão havia sido colocado naquele local há muitos anos. Foi aí que paramos na hora a escavação e recolhemos esses fragmentos com cuidado para analisá-los”, conta o engenheiro.

Um dos achados é justamente o bilhete que Perseu Matias, irmão de Dirceu, escreveu registrando o sonho de ver o projeto do Goiânia Tênis Clube sair do papel. Diz a carta: Goiânia Tênis Clube, o mais ousado de meus sonhos. Sonho de gente poderosa e que passou pela cabeça de uma pessoa frágil como eu. O motivo só pode ser bênção de Deus; então, continuando a gozar dessa graça, tentarei virar em realidade mais este sonho, esperando, assim, estar contribuindo com a civilização nesta minha passagem pela Terra. Goiânia, 20-9-1959. Perseu Matias.”

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Dirceu lamenta o fim das atividades do Goiânia Tênis Clube. Motivado pelo episódio da cápsula do tempo, ele lembra que a instituição inaugurou a sede na Rua 220 um ano depois de enterrada o garrafão com as mensagens simbólicas. Com nostalgia, Dirceu recorda também de uma praça de esportes pública que, segundo ele, o Goiânia Tênis Clube equipou para a população da Capital. O espaço de lazer funcionava na região da Rua 239, também no Setor Coimbra. Para Dirceu, a cápsula do tempo tem valor inestimável. Quando compara suas expectativas na década de 1950 com a trajetória que percorreu na vida, o aposentado deixa claro que esperava ver o Goiânia Tênis Clube ainda na ativa: “Aquele lugar era motivo de orgulho para nós”, conclui Dirceu. 

Depois do clube, agremiação que foi um dos principais pontos de eventos sociais da Capital nas décadas de 1960 e 1970, o local abrigou o clube de dança Sanfona de Ouro. Na sequência, o Pátio Coimbra foi construído neste espaço. Diante de toda importância histórica do lugar, as empresas de construção e urbanismo desenvolveram um projeto com uma linguagem arquitetônica que valorizasse o passado. “Mesmo com as transformações urbanas que estão acontecendo na cidade e no bairro, de alguma forma buscamos preservar essa história”, disse o incorporador Guilherme Pinheiro de Lima. O estilo Art Déco da torre, uma releitura do antigo imóvel, foi a concretização desta intenção. Em seus 98 metros de altura, a torre exibe linhas circulares, retas estilizadas e usa formas geométricas compondo designs abstratos, que são características típicas dessa escola artística que predominou nas construções dos primeiros anos de Goiânia. (Higor Santana é estagiária do Jornal O Hoje sob orientação do editor de Cidades Rhudy Crysthian) (Colaborou Allan David) 

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