A “paz” enganosa na disputa em torno da tabela do frete, a questão não resolvida
Lauro Veiga
Os
ânimos haviam esfriado ligeiramente desde que transportadoras, embarcadores,
representantes da indústria e do agronegócio estiveram reunidos no Ministério
da Infraestrutura, no começo da segunda quinzena de janeiro, para debater a
questão do tabelamento do frete,numa avaliação da assessora técnica da Comissão
Nacional de Logística e Infraestrutura da Confederação da Agricultura e
Pecuária do Brasil (CNA), Elisângela Lopes Pereira. “O ministro Tarcísio Gomes
de Freitas pediu a colaboração de todos os setores, inclusive na elaboração da
nova tabela”, relata.
Isso,
no entanto, está muito distante de um apaziguamento de fato. As divergências
continuam expostas e há o temor que nem mesmo uma manifestação formal e
definitiva do Supremo Tribunal Federal (SFT) possa significar uma solução final
para o longo conflito gerado entre os setores de transporte e de produção desde
que o governo decidiu tabelar os preços do frete no país em maio de ano
passado, inicialmente por meio da Medida Provisória 832, transformada na Lei
13.703 pelo Congresso em julho e publicada no início de agosto, fixando a Política
Nacional de Pisos Mínimos do Transporte Rodoviário de Cargas.
A
CNA, uma das autoras das ações diretas de inconstitucionalidade movidas contra
o tabelamento, não está disposta a abrir mão de sua posição. A Confederação
Nacional da Indústria (CNI), que move três ações contra a medida, igualmente em
tramitação no STF, sustenta que a lei é inconstitucional e defende que as ações
deveriam ser apreciadas o mais rápido possível.Conforme o gerente-executivo de
Relacionamento com o Poder Executivo da CNI, Pablo Cesário, “a tabela
estabelecida pela Agência Nacional de Transporte Terrestre (ANTT) é inaplicável
porque não consegue espelhar a complexidade do mercado concorrencial de fretes,
com todas as variáveis que influenciam na formação dos preços”.
Consultada,
a ANTT limitou-se a informar que a política de piso mínimo, que prevê reajustes
semestrais para os preços do frete, com base na variação do Índice Nacional de
Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), será mantida enquanto a Lei 13.703 estiver
em vigor.
Revisão
Em
dezembro passado, a agência e a Fundação de Estudos Agrários Luiz de Queiroz
(Fealq)firmaram contrato para a revisão da metodologia que vai definir,
monitorar e atualizar a tabela. A ANTT espera que a versão aprimorada do
tabelamento seja colocada em audiência pública a partir de abril para coleta de
contribuições e informações dos setores interessados e finalmente concluída
antes do final de julho, quando se prevê a sua publicação oficial. Numa segunda
etapa do contrato, o projeto da tabela revisada sofrerá aprimoramentos até
janeiro de 2020, prevendo-se uma terceira versão para julho daquele mesmo ano.
Balanço
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Em
fevereiro, o Grupo de Pesquisa e Extensão em Logística Agroindustrial (EsalqLog)
reuniu-se com representantes de embarcadores de cargas, empresas e cooperativas
de transportes, num ciclo de reuniões temáticas para coletar contribuições para
aprimorar a tabela, e lançou pesquisa para ouvir caminhoneiros autônomos.
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O
grupo, relata o pesquisador Fernando Rocha, da EsalqLog, tem recebido
contribuições ainda de entidades ligadas às transportadoras e representantes do
agronegócio e identifica divergências ainda não sanadas em torno de diversos
pontos. “Entre esses, o frete de retorno chamou mais a atenção”, comenta Rocha.
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A
ideia, continua ele, é desenhar uma metodologia transparente para os custos
operacionais do transporte de cargas em todo o país, incluindo todos os seus
componentes, e avaliar os impactos da tabela para o setor de transportes e para
as cadeias produtivas. A CNI, pontua Cesário, solicitou à ANTT e à EsalqLog uma
avaliação do impacto regulatório da medida.
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“A
falta de clareza sobre a lei e a falta de uma posição definitiva sobre o tema,
por parte do governo e dos órgãos que estão avaliando a situação, têm gerado
muita incerteza no mercado”, comenta Paulo Sarti, diretor-presidente da Penske
Logistics no Brasil. Para ele, a insegurança afeta embarcadores, obrigados a aceitar
aumentos de custos “ou correr o risco de penalização”, quanto transportadores.
Essa insegurança e até pior do que a tabela si,
reforça Bruno Batista, diretor executivo da Confederação Nacional do Transporte
(CNT). O embate nos tribunais deixa o setor e o próprio governo em dúvida sobre
a continuidade do tabelamento.