Gambiarras revelam perigo que usuários são obrigados a se submeter no transporte coletivo
Falta de segurança, lotação, calor excessivo, falta de acondicionamento, atrasos e uma frota de ônibus que estraga constantemente são outros problemas apontados por usuários|Foto: Wesey Costa
Igor Caldas
Fios expostos e gambiarras ao longo das grades do Eixo Anhanguera revelam mais um perigo a qual os usuários são obrigados a se submeter para enfrentar o transporte coletivo, na Região Metropolitana de Goiânia. O risco de choque elétrico se soma a falta de segurança, lotação, calor excessivo, falta de acondicionamento, atrasos e uma frota de ônibus que tem que ser paralisada constantemente por não rodarem com funcionamento adequado. Esses problemas reunidos revelam que o serviço não tem condições mínimas para continuar circulando.
A equipe de reportagem se deslocou ao longo da via do Eixo Anhanguera, na Região Central da Capital, e não tardou para encontrar um dos veículos da frota da Metrobus danificado, parado em uma das pistas da via próximo ao Terminal Praça A. A poucos metros do veículo estacionado havia fios elétricos expostos, sendo desgastados pelo calor e chuvas do tempo. O mesmo problema foi encontrado próximo a Rua 8, no Centro. Ao longo do trajeto também foi constatado que as grades já passaram da hora de serem trocadas, muito danificadas, amassadas e enferrujadas em diversos pontos.
A Metrobus afirmou que o termo “sucateamento”, que se trata de veículos sem nenhuma condição de operar, está equivocado. “Todos os veículos da frota da Metrobus, seja em condições operantes ou em manutenção, podem rodar após as devidas correções”, diz a empresa. Hoje, a Metrobus afirma cumprir com à solicitação de 99 veículos por dia, estabelecida na planilha de horários definida pela Companhia Metropolitana de Transportes Coletivos (CMTC).
A reportagem pediu os números de veículos parados por manutenção na garagem da empresa, mas a companhia não respondeu aos questionamentos. A Secretaria de Infraestrutura e Obras Públicas (Seinfra), responsável pela manutenção das grades da via do Eixo Anhanguera afirmou que uma equipe já foi direcionada aos locais para resolver o problema.
A vendedora Elisângela Barbosa discorda da Metrobus. Ela é obrigada a pegar o transporte coletivo diariamente, pois mora em Goianira e trabalha no Centro de Goiânia. “Deveriam mudar o nome dele de Eixão para Sucatão”. Elisângela tem relatos de um cotidiano duro para cada uma dos problemas enumerados pela reportagem. “Eu passo é longe dessas grades. Morro de medo de ser eletrocutada”, afirma. Ela cita o caso de um usuário que foi atingido por um choque elétrico na Estação Vila Moraes, ano passado.
Fios expostos podem entrar em contato com as estruturas metálicas e energizá-las. Uma adolescente morreu em 2016 ao atravessar a Avenida Anhanguera. Os fios de energia que passavam na parte interna de um poste metálico na via causou a morte da jovem. Segundo a Secretaria de Infraestrutura e Serviços Públicos (Seinfra), foi constatado que uma falha nos cabos energizou a estrutura, provocando o acidente.
Os danos das grades da via abrem brechas que os pedestres usam para atravessar fora da faixa. “Eu não me arrisco. Tenho medo de levar choque e ser atropelada”, afirma Elisângela. A vendedora ainda conta sobre outros problemas enfrentados diariamente por ela. “A insegurança é um dos piores problemas. Toda semana tenho amigos que trocam de número porque relatam que foram assaltados dentro do ônibus. Um deles morreu no ano passado, depois de levar uma facada”.
Elisângela ainda afirma que os ônibus estão sempre lotados e o problema de atrasos constantes fez com que ela perdesse a confiança que o transporte deveria fornecer para chegar a seu trabalho no horário. “Hoje eu cheguei no trabalho atrasada porque o ônibus estava lotado demais e não parou na estação para eu embarcar”.
A vendedora diz que se mudou para a casa dos pais para não ter despesas com aluguel e comprar uma motocicleta para se locomover. “Prefiro arriscar minha vida em duas rodas que ser roubada e andar igual animal de carga, no eixão”. Outro problema que ela relata são as condições internas do veículo. “Quando está na época da estiagem, o calor é demais e quando está chovendo, entra água tudo dentro do ônibus.
Privatização da Metrobus deve ser feita pela CMTC
Tramita no governo de Goiás, desde setembro do ano passado, um projeto de decreto que autoriza a Companhia Metropolitana de Transportes Coletivos (CMTC) a fazer os estudos para uma nova concessão do Eixo Anhanguera e suas extensões ao mesmo tempo em que promove a desestatização da Metrobus, sendo o primeiro passo para a privatização da estatal.
O projeto, que foi feito pela CMTC e modificado pela Secretaria de Economia, está em aberto na Casa Civil, aguardando a manifestação de outras pastas, entre elas a Secretaria de Administração.
O projeto de decreto corre no governo paralelamente à tramitação do projeto de lei ordinária enviado pelo Executivo à Assembleia Legislativa e que prevê autorização para que o governo desestatize a Metrobus e outras quatro estatais: Celg Geração e Transmissão (Celg GT), Indústrias Químicas do Estado de Goiás (Iquego), Agência Goiana de Gás Canalizado (GoiasGás) e Goiás Telecomunicações (GoiasTelecom).
O projeto de decreto autoriza a CMTC, que é uma estatal da Prefeitura de Goiânia, a “promover os trâmites necessários à elaboração de estudos e projetos, de caráter jurídicos, econômicos e financeiros a fim de instaurar procedimentos que contemplem metodologias sustentáveis e eficientes da concessão do Eixo Anhanguera e suas extensões, inclusive que contemplem a promoção da desestatização da atual concessionária, Metrobus Transporte Coletivo S/A, associada a uma nova concessão do Eixo Anhanguera”.
A justificativa para que uma estatal municipal conduza o processo de privatização de uma empresa do Estado passa pela concessão do Eixo Anhanguera, cedida pelo Paço à Metrobus. Há o risco de que caso seja vendida sem que o processo passe pelo município, quem comprar a estatal não deterá o Eixo Anhanguera, o que acaba por inviabilizar a própria privatização da companhia.
A alegação é de que a linha do Eixo Anhanguera é uma concessão precária. O contrato foi feito sem processo licitatório. Por isso, se privatizada, apenas a Metrobus passa à iniciativa privada, a linha não. Ou seja, a nova empresa não teria o serviço. Então, a proposta foi que o governo estadual fizesse um decreto autorizando a CMTC a fazer o novo processo licitatório do Eixo Anhanguera e, junto com esse processo, a CMTC faria a venda das ações da Metrobus.
Vontade
O avanço da privatização da Metrobus em relação às outras estatais se dá, em grande parte, por vontade política tanto do governador Ronaldo Caiado (DEM) quanto do prefeito de Goiânia, Iris Rezende (MDB). Em outubro de 2018, ainda antes da eleição de Caiado, Iris já havia sinalizado para a desestatização da estatal, ao reclamar do serviço prestado. (Especial para O Hoje)