Mundo transcendente
‘Sutra de Lótus’ segue em exposição até 2 de março, com telas em tons vibrantes inspiradas no Budismo
Elysia Cardoso
Com obras que elucidam a vida e o mundo a exposição
individual intitulada ‘Sutra de Lótus’ do artista Diego El Khouri segue em
cartaz na livraria Palavrear até dia 2 de março. A mostra conta com telas que
ressaltam a vasta criatividade do artista que aborda o universo do Budismo, sob
a curadoria de Rafael Santana. De acordo com o artista, o Budismo desperta sua
atenção desde a infância, mais precisamente aos 8 anos. De inicio, foi cativado
pelo viés estético, tempo depois, com uma visão artística mais madura o artista
plástico e poeta se atentou ao processo de iluminação por meio dos ensinamentos
do Budha Sakyamuni.
“A narrativa que se conta sobre o processo de iluminação do
Budha foi algo que me impactou muito quando tive, pela primeira vez, um contato
mais profundo nessa história. Anos depois, morando no Rio de Janeiro, tive
contato com a filosofia do Budha Nitiren Daishonin, na qual venho desenvolvendo
algumas obras através dessa imersão à essa linha budista, além de pitadas de
psicodelia, ufologia e física quântica”, cita Diego que também explica um pouco
sobre a história de Nitiren. “Nitiren
foi um monge budista do Japão do século XIII. Fundou o budismo Nitiren,
um segmento reformador do budismo. Foi o primeiro monge a dizer que qualquer
pessoa tinha a possibilidade de chegar à iluminação. Foi perseguido, exilado,
[sofreu] tentativas diversas de assassinatos (inclusive há uma questão
ufológica, na qual ele é salvo, em uma dessas tentativas)… Foi realmente um revolucionário”.
De acordo com Diego, a literatura também proporcionou
pitadas de inspiração para a criação das obras. “A literatura ‘Beat’, por meio
de nomes como Allen Ginsberg e Jack Kerouac, e o surrealismo também estão vivos
na hemoglobina dessas obras”, ressalta o artista que ao ser questionado sobre
seu processo criativo é norteado por meditação e energia. “Respiro fundo,
Pratico Daimoku (se refere a um mantra
elaborado pelo monge Nitiren).O som ao fundo do Miles Davis, Grateful Dead, Pink Floyd, John
Coltrane… E mergulho de forma consciente e delirante na criação
artística nesse laboratório de psicodelia, superação e êxtase (esse está sendo
o desafio na execução dessa série)”, revela.
A nomenclatura da Mostra se refere ao Sutra do lótus ou
Sutra do lótus branco, do darma sublime é um dos sutras mais populares e
influentes do budismo Mahayana. É considerado, por algumas religiões Budistas,
como o ápice dos ensinamentos de Sidarta Gautama ou Sakyamuni. Em entrevista
concedida ao Essência o artista revela a simbologia entre o nome e as obras. “O lótus é a flor que
floresce e gera sementes ao mesmo tempo, também simboliza a pureza do estado
búdico, florescendo em meio às vidas comuns do mesmo modo que a flor de lótus
floresce na água lamacenta da lagoa. Em minhas obras dialogo com o budismo
delirante ‘psicodélico’ da literatura Beat americana (com Roberto Piva como
representante brasileiro dessa linhagem), o rock psicodélico, surrealismo,
entre outros, mas o núcleo é o budismo da linha Nitiren”.
Magia das cores
Instigado sobre a escolha de tonalidades quentes e
contrastantes, El Khouri revela que a opção ocorreu devido a teoria das cores de kandinsky, que exerce força
psicológica em seu manuseio. “As cores
não são apenas objeto material, físico. Há magia nisso. O artista é mago, pois
manipula os símbolos. Cada degradê de
cores tem uma melodia própria. As alterações psíquicas da consciência, o êxtase, a ancestralidade invadindo a epiderme, a essência onírica da psicodelia,
são ingredientes desse caldo”, elucida Diego.
As obras da exposição ‘Sutra de Lótus’ surgiram com a
pesquisa do artista sobre o tempo, fator de seu interesse que o fez imergir nas
reflexões de e Bergson sobre o tema e incluir tais fatores nas pinturas. “A
ideia da não linearidade cronológica e esse tempo, criado através de poderes
hierárquicos dominadores, afim de impedir a população de refletir sobre a vida,
a si mesmo, o mundo ao redor, eram algumas das
questões pertinentes. Há arte deve abrir portas para escapar dessas
amarras”, conceitua Diego sobre sua forma de impactar a ponderação em meio as
artes.
Mediação artística
Indagado sobre a mensagem central que gostaria que seu público
captasse ao contemplar suas obras El Khouri cita: “Eu estou com meu amigo
Sartre quando ele diz que o artista produz e o receptor interpreta de acordo
com suas próprias ferramentas. Fico satisfeito pelas sensações diversas que as
obras possam causar. Se alguém sair da exposição e com vontade de se
aprofundar na filosofia budista será também
bem interessante”.
Por mais que o tema possa ter reflexos associados a religião,
o artista se revela estar do lado oposto, a religião budista na sua forma
clássica não é teísta, ou seja, não possui um Deus.“Estou do lado contrário das
religiões. Por isso minha ligação com o Nitiren Daishonin. Pra nós não há Deus
e sim deuses. Somos todos deuses no caminho da evolução. Acho que a função do
artista é produzir arte e sensibilizar olhares. Mas o que é arte?”, se
questiona o criador das obras.
(Elysia Cardoso é
estagiário do jornal O Hoje, sob orientação do editor Lucas de Godoi)