Coronavírus: o desgaste de quem se arrisca nas filas da Caixa em busca do auxílio emergencial
Problemas no aplicativo da Caixa que deveria gerar senha são apontados como motivo de aglomerações| Foto: Wesley Costa
Igor Caldas
As portas das agências da Caixa Econômica Federal têm sido sinônimo de aglomeração de pessoas há dias. Trabalhadores informais, microempreendedores individuais (MEI), autônomos e desempregados que buscam o tão prometido auxílio emergencial de R$ 600 do Governo Federal não conseguem receber o dinheiro sem sair de casa e formam filas quilométricas em frente aos bancos. Beneficiários relatam problemas no aplicativo da Caixa que deveria gerar uma senha necessária para receber o benefício.
Já é o terceiro dia que André Francisco da Silva, 26 anos, tenta resgatar o valor do seu auxílioemergencial na agência da Caixa Econômica Federal, localizada na Avenida Mangalô, Setor Morada do Sol, em Goiânia. “Todos os dias que eu vim, o banco fechou antes de chegar o meu lugar na fila”, conta. Ele diz que a culpa da aglomeração é pelo mau funcionamento do aplicativo criado pela Caixa que não gera a senha necessária para o resgate do benefício.
“O aplicativo dá um rolo muito grande. Quando você faz o procedimento para que o código seja gerado, ele não aparece. Se não vir pessoalmente, nunca vai receber o dinheiro”. Quem já tinha conta poupança da Caixa ou é correntista em outros bancos e informou os dados bancários ao se inscrever para receber o benefício não precisa do código que o aplicativo deveria gerar. Dezenas de pessoas aguardavam na porta da agência que teve que estender seu horário de funcionamento para atender um número limitado de pessoas.
Desde o último mês, as instituições bancárias anunciaram que iriam atender os clientes de suas agências em horário reduzido. De acordo com a Febraban (Federação Brasileira de Bancos) a medida busca evitar a propagação do coronavírus devido à proximidade das pessoas que frequentam os locais. Ironicamente, nem a distância mínima foi respeitada pelas dezenas de pessoas que aguardavam na fila para receber o benefício dentro da unidade. Os bancos seguem funcionando com limite de pessoas no interior das agências, das 10h às 14h.
Segundo a Federação, os bancos funcionarão com limite de pessoas no interior das agências, das 10h às 14h a partir desta terça (24), de acordo com orientações estabelecidas pelo Banco Central. No entanto, diante da enorme fila que se formava em frente à agência da Avenida Mangalô próximo ao horário de fechamento, a unidade estendeu seu horário de funcionamento. Quem aguardava na fila recebeu uma senha para ser atendido.
“Eu me pergunto o porquê deles não entregarem essa senha antes? Estamos aqui desde as seis da manhã”, relata Guilherme Braga, o último da fila a receber a senha pelos funcionários do banco. “Eles limitaram a quantidade de senhas. Todas as pessoas que estiveram depois de mim foram embora para casa e devem voltar depois”. Guilherme conta que vai diariamente à agência da Caixa da Avenida Mangalô desde que seu benefício foi liberado, no último dia 19.
Alisson Talles finalmente conseguiu receber o dinheiro do benefício. Aliviado, ele saiu da agência com o saque garantido na tarde da última quarta-feira após passar três dias seguidos recebendo a porta fechada do banco. “A gente chega aqui de manhã e já tem uma fila enorme. Ficamos na esperança de sermos atendidos, mas o banco fecha antes de chegar a nossa vez. Graças a Deus hoje foi diferente”, comemora. O jovem confirma que a aglomeração é causada pelos defeitos no aplicativo. “Eu nunca vi um aplicativo desse banco que presta”, culpa.
Alívio com a senha
Depois de cinco dias esperando diariamente nas aglomerações causadas pelas filas, Edmilson Teodoro da Silva se surpreendeu quando conseguiu uma senha da funcionária do banco. “Se eu não conseguisse hoje, ia desistir. A gente precisa do dinheiro, mas ficar uma semana na fila para conseguir um benefício é muita humilhação. Ele culpa o presidente. “Eu nunca mais voto em Bolsonaro, nunca vi o Brasil tão bagunçado”, afirma.
Edmilson diz que presenciou aglomerações em frente à agência da Caixa Econômica Federal da Avenida Mangalô nos cinco dias em que ficou aguardando nas filas. “Até briga com polícia deu aqui. Quando vai chegando a hora do banco fechar o povo começa a desesperar e brigar com os funcionários, mas eles também não têm culpa”.
O trabalhador relata preocupação de contágio da doença nas aglomerações formadas pelas filas. “Se fosse apenas um dia que a gente viesse aqui, era menos risco. Agora ficar vindo todos os dias no meio desse mundo de gente para receber um não e ainda pegar coronavírus é preocupante. A pandemia não está nos hospitais não. Está aqui mesmo”, avalia Edmilson.
Por meio de nota, a Caixa alega queem conjunto com o Ministério da Cidadania e a Dataprev, em apenas duas semanas foi criada toda estrutura para cadastro e pagamento do auxílio emergencial do governo federal, que já contabiliza 44,3 milhões de pessoas beneficiadas. O banco alega que teve início nesta semana o calendário escalonado de saque em espécie do auxílio emergencial nas agências, casas lotéricas e correspondentes Caixa Aqui para os beneficiários da Poupança Social Digital. O escalonamento foi pensado justamente para evitar a busca massiva às agências, no momento em que se recomenda evitar aglomerações.
Entretanto, o banco garante que as agências que registram grandes filas e aglomerações são pessoas que não fazem parte do público alvo do atendimento presencial, ou seja, clientes em busca de serviços essenciais (como saque do seguro desemprego e Bolsa Família sem cartão, desbloqueio de senhas, etc) e o público beneficiário do saque em espécie escalonado por data de nascimento.
Aplicativos geram aglomerações desde o início do mês
As aglomerações causadas por filas de pessoas em busca do auxílio emergencial em frente às agências da Caixa estão sendo noticiadas desde o início do mês. Mais uma vez, defeitos no aplicativo de cadastro para receber o benefício foram apontados como causador do tumulto na porta dos bancos. Pessoas que não conseguiram se cadastrar para receber o benefício por causa das falhas no software, começaram a buscar as agências para realizar o cadastro pessoalmente.
Milhares de trabalhadores não conseguiram se cadastrar para receber o benefício porque o aplicativo da Caixa desenvolvido para inscrição de quem deveria receber o auxílio indicava problemas com o CPF. A Receita Federal informou que o aplicativo apresentou um volume excessivo de acessos, que pode ter provocado o impedimento ao cadastramento.
Amenizar os impactos
O auxílio criado pelo governo federal foi pensado como uma forma de amenizar os impactos econômicos para as famílias brasileiras durante o período de pandemia causado pelo Coronavírus. O benefício deve ser pago pelo período de três meses no valor de R$ 600 por mês, e cada família pode acumular, no máximo, dois pagamentos do auxílio.
Pessoas já tem conta poupança da Caixa ou são correntistas em outros bancos com os dados bancários informados na inscrição do programa não precisam do aplicativo. Os demais, no entanto, que receberam o benefício pela nova conta poupança digital da instituição, criada para este programa, dependem dele para movimentar o dinheiro.
Os saques que dependem de um código gerado pelo aplicativo começaram a ser liberados na tarde da última segunda-feira (27). O app teve atualização disponível para ser baixada em celulares também a partir do dia 27. A disponibilidade dos saques deve seguir um cronograma de acordo com a data de aniversário do trabalhador. (Especial para O Hoje)