Em queda recorde, economia perde 11,6 milhões de empregos
Taxa de desemprego é a maior desde 2012 – Foto:Reprodução
Lauro Veiga Filho
Os
dados sobre o desemprego no trimestre finalizado em julho deste ano, capturados
pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADC), continuam
sendo de certa forma “camuflados” pelo crescimento histórico do número de
trabalhadores que desistiram de procurar emprego, seja por força da pandemia,
seja pela total ausência de oportunidades. A pesquisa, na verdade, traz uma
coleção de recordes negativos, a começar pela taxa de desemprego – a mais
elevada desde que esta versão da PNAD foi iniciada, em 2012. Enquanto o número
total de pessoas ocupadas desabou para o nível mais baixo da série, assim como
a massa total de rendimentos reais recebidos efetivamente pelas famílias que
tinham alguém empregado.
Como
a coluna tem destacado há semanas, o desempenho muito ruim do mercado de
trabalho será um obstáculo às pretensões de crescimento em “V” (quer dizer,
queda rápida da atividade econômica, seguida por forte recuperação e retomada
dos níveis anteriores à crise sanitária). Ainda que a economia volte a esses
níveis, no decorrer dos próximos meses, será preciso ainda “qualificar”esse retorno.
Para isso, deve-se recordar que a economia já caminhava para uma retração no
segundo trimestre, mesmo antes da pandemia, como recorda o economista chefe do
Banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves. Mais claramente, essa “volta” ao
passado significaria retomar uma trajetória de debilidade e incertezas – uma
projeção que, nitidamente, não considera o risco de uma “segunda onda” de
contaminações e mortes.
Para
a coordenadora do Boletim Macro do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação
Getúlio Vargas (Ibre/FGV), Sílvia Matos, “a variável mais importante para olhar
a consistência e a solidez da recuperação econômica é o mercado de trabalho”.
Colocado de outra forma, uma retomada sustentada e de maior fôlego somente
ocorrerá quando o emprego voltar a crescer de forma sistemática e por prazo
mais longo. Até aqui, não é o cenário desenhado pela PNADC.
Encolhimento
No
trimestre maio a julho deste ano, a pesquisa registrou 82,087 milhões de
pessoas ocupadas, numa queda de 8,1% em relação ao trimestre imediatamente
anterior (7,214 milhões de ocupações perdidas) e de 12,3% em relação aos mesmos
três meses de 2019 (com perda de 11,557 milhões de vagas). A ocupação vem
recuando desde fevereiro, quando a pandemia não havia se instalado por aqui
ainda. No trimestre encerrado naquele mês, o mercado havia gerado 93,710
milhões de vagas, o que significa dizer que, deste então, foram encerradas
11,623 milhões de ocupações em todos os setores – ou quase todos, pois houve
alguma estabilidade apenas na administração pública e nas áreas de defesa,
seguridade, educação, saúde humana e serviços sociais (até porque a pandemia
exigiu a contratação de médicos, enfermeiros, fisioterapeutas e outros
profissionais dedicados a enfrentar o Sars-CoV-2 na linha de frente). O nível
de ocupação, ou seja, a relação entre o número de ocupados e a população em
idade ativa (14 anos ou mais), bateu um recorde negativo, caindo de 54,7% no
trimestre maio-julho de 2019 para apenas 47,1% em igual intervalo deste ano.
Portanto, 52,9% daqueles em idade para trabalhar estavam desocupados ou fora do
mercado.
Balanço
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Paradoxalmente,
o total de desempregados avançou até “modestamente”, quando comparado ao que
ocorreu com o emprego. O número de desocupados saiu de 12,569 milhões entre
maio e julho de 2019 para 12,811 milhões no trimestre fevereiro a abril deste
ano, subindo para 13,130 milhões entre maio e julho passados. Em um ano, foram
561,0 mil desempregados a mais (alta de 4,5%).
·
A
despeito dessa variação aparentemente “tímida”, a taxa de desocupação foi
recorde, atingindo 13,8% no trimestre maio-julho deste ano, frente a 11,8% em
igual período de 2019, saindo de 12,6% no intervalo entre fevereiro e abril
últimos.
·
Na
verdade, o desemprego apenas não registrou números muito mais elevados porque o
total de trabalhadores fora da força de trabalho, ou seja, que deixaram de
procurar emprego, chegou ao seu ponto mais elevado desde o começo da pesquisa.
Pelo menos até aqui. Esse número saiu de 64,822 milhões em 2019 para 70,926
milhões entre fevereiro e abril deste ano, subindo para 78,956 milhões no
trimestre seguinte.
·
Como
se pode perceber, em 12 meses, em torno de 14,134 milhões de trabalhadores
deixaram o mercado, o que corresponde a 8,1% de toda a população com 14 ou mais
anos de idade.
·
O
desalento avançou para níveis igualmente históricos, batendo em 5,797 milhões
de pessoas, que também não entram na estatística do desemprego porque, como os
demais, desistiram de buscar emprego. Esse número cresceu 20,0% em um ano,
saindo de 4,831 milhões em igual trimestre de 2019.
·
A
taxa de subutilização dos trabalhadores, que inclui os desalentados, aqueles
empregados que trabalham número insuficiente de horas para assegurar uma
ocupação digna e aqueles que deixaram de buscar uma ocupação, mas gostariam de
trabalhar, avançou de 24,6% em 2019 (maio a julho), representando 28,106
milhões de pessoas, para 30,1% neste ano (igual trimestre), correspondendo a
32,892 milhões, ou seja, 4,786 milhões a mais (alta de 17,0%).
·
Não
sem surpresa, perto de 88% daquele aumento ocorreu na passagem entre os
trimestres fevereiro a abril para maio a julho deste ano, quando a massa de
subutilizados aumentou 14,7%. O dado apenas reforça que a crise continuava a
causar estragos mesmo com a reabertura gradual da economia a partir de
justamente de maio em algumas regiões do País.
·
Da
mesma forma, dois terços da redução no total de ocupação registra nos últimos
12 meses até julho deste ano ocorreram entre os períodos fevereiro-abril e
maio-julho.
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A
perda de empregos foi devastadora nos segmentos informais. Considerando o total
de ocupados sem carteira assinada, sem registro no Cadastro Nacional de Pessoa
Jurídica (CNPJ) e que trabalhavam para a família, sem remuneração, o contingente
desabou de 41,191 milhões em 2019 para 33,067 milhões neste ano (sempre entre
maio e julho). Foram encerradas 8,124 milhões de vagas informais (queda de
19,7%), o que correspondeu a 70,3% da redução sofrida pelo total de ocupações
na economia.