2ª parte: visita inédita a um hospital que trata Covid em Goiânia
Na primeira parte da visita ao hospital Gastro Salustiano, que trata Covid-19 na Capital, conhecemos os procedimentos para internação e as maneiras de comunicação da unidade com o responsável pelo paciente. Vale relembrar, que foram denúncias de leitores, nesse sentido, que resultaram na visita presencial. O que é necessário destacar ainda é que estou imunizado […]
Na primeira parte da visita ao hospital Gastro Salustiano, que trata Covid-19 na Capital, conhecemos os procedimentos para internação e as maneiras de comunicação da unidade com o responsável pelo paciente. Vale relembrar, que foram denúncias de leitores, nesse sentido, que resultaram na visita presencial. O que é necessário destacar ainda é que estou imunizado contra a doença e fui paramentado para conhecer todas as instalações do hospital. Nesta segunda parte, vamos conhecer como é o passo a passo da chegada, tratamento e saída dos pacientes, sejam curados ou sejam mortos.
Após os esclarecimentos de como é informado o boletim diário para o responsável pelo paciente, o diretor do hospital, o médico Salustiano Gabriel Neto, a coordenadora geral de enfermagem, Ana Paula Araújo, e a coordenadora de Unidades de Terapia Intensivas (UTIs), Lilian Siqueira, guiaram-me ao local onde os pacientes chegam de ambulâncias, um acesso direto da rua para o hospital. “Daqui precisamos fazer a triagem, pois tratamos pacientes com Covid-19 e com suspeita de Covid-19”, esclareceu o diretor. De lá, fomos para a ala de UTIs, seguindo o caminho dos doentes em estado mais grave, que são levados para leitos em isolamento. “100% dos doentes que nós recebemos aqui, mesmo que venha com Covid-19 positivo, ele vai para um leito de isolamento”, informou o médico.
“Hoje nós não temos enfermaria de negativos juntos, o máximo que a gente tem na enfermaria juntas, são dois leitos. Raramente, precisamos colocar dois pacientes juntos, devido a quantidade de leitos que nós temos. Por que? Você imagina o seguinte: eu faço uma enfermaria de 10 leitos, não Covid, e aí o doente chega, com três dias o exame dá positivo, e aí o que faço com outros nove?”, analisa o médico, sobre os riscos em se confiar nos exames que chegam negativos e não ter o cuidado de separar a pessoa mesmo daqueles que são casos suspeitos, que pode contaminar os demais.
Em relação à chegada de doentes, caso apresentem sintomas e tenham tido contato com pessoas contaminadas, eles já são considerados com Covid-19, e mesmo com a confirmação, são feitos os exames. “Primeiro, se eu tenho um paciente com sintoma respiratório, que está confirmado uma pessoa da convivência familiar dele ou de trabalho positivo. Eu não preciso fazer exame, esse doente, do ponto de vista técnico, ele é positivo. Mesmo que o RT-PCR venha negativo, mesmo que a tomografia dê negativo, do ponto de vista epidemiológico, eu tenho que considerar esse doente positivo”, pontuou Salustiano.
Ele destaca que a unidade recebe pacientes com todos os quadros de saúde, dentre os quais em estado gravíssimo. “A gente recebe, praticamente, todos os doentes, intubados, graves vem pra cá. Porque nós estamos com os leitos prontos, e é o único lugar que tem a quantidade de isolamento”. Nesse sentido, quando um paciente chega, por exemplo, intubado de um pronto socorro, e que não teve tempo de realizar os exames, e morre, casos que chegam aos 50%, ficam fora das estatísticas de Covid-19.
“Ele chegou aqui, não deu tempo de fazer os exames, ele morreu, como eu não posso mandar para o Serviço de Verificação de Óbito (SVO), esse doente não entra na estatística de Covid, e a chance de ele ser Covid é de 80%”, frisa. “Os doentes que são intubados, dentro da unidade, de 70 a 80% vão a óbito. Os doentes que vêem intubados, que são Covid, que chegam aqui pra gente intubados, de cada 10, a gente consegue salvar um. Desses, 20% morrem com menos de 24 horas, e eu não tenho o resultado dele”, acrescenta, explicando que no atestado de óbito são classificadas outras causas, como insuficiência cardíaca, por exemplo.
Contaminação
Mas quais são os riscos em se contaminar por Covid-10 no hospital? “Vamos imaginar que venha um doente pra cá suspeito de Covid, e eu falo que ele não é, faço todos os exames, ele não tem nada que caracterize a doença pra mim. E ele tem uma doença que continuará tratando aqui. Não tem como transferir. Ele pode adquirir (a Covid) aqui! Porém, esse risco hoje está variando de zero a 0,45% (índice de contaminação), nós estamos com zero. Não podemos passar de 0,45%”, mostra o diretor, em uma planilha interna do hospital, indicando que de cada 200 pacientes, são “aceitáveis” que dois deles sejam infectados com o vírus na unidade. “Aqui não houve casos nem de funcionários contaminados”, assegura.
Esses esclarecimentos foram repassados pelo diretor, quando já estávamos dentro da área das UTIs. Ao todo, o hospital conta com 91 leitos, sendo 75 específicos para Covid-19, conforme dados da Prefeitura de Goiânia. Nesse local, onde há um corredor, ficam os leitos, com portas que possuem vidro na parte superior, por onde é possível ver os pacientes. No lado esquerdo, pude ver algumas pessoas intubadas, na maioria idosos, já do lado direito, dentro dos quartos, vi pacientes fazendo hemodiálises. Dessa ala, poucos leitos estavam vazios.
Outra informação importante foi acerca da reinternação, que, de acordo com o hospital, cerca de 1% retorna para continuação do tratamento. “Lá atrás, nós chegamos a ter 10% de retornos. A gente não tinha o ‘time’. Você olha o doente e acha que está bom, é dá alta, e o doente volta com três, quatro dias depois. Hoje a gente já sabe como o doente vai evoluir”, relembra.
Estrutura
Saímos da ala de UTIs e retornamos para o corredor principal, por onde adentrei às demais instalações do hospital. Fui guiado para outro corredor, que dá acesso a um ambiente externo e aberto da unidade. Onde há uma parte em obras de expansão do prédio. “Construídos essa parte toda em cinco meses”, relembra Salustiano, em relação à estrutura física para atender a demanda de Covid-19. Nesse local, anexado ao prédio principal, notei muitas salas, usadas para a alimentação dos funcionários. “A alimentação nossa vem toda de fora”, explicou o diretor.
Já sem conexão com o edifício, outras salas, estilo contêineres, que são utilizadas para os pacientes que morrem na unidade. À frente delas, um portão grande, que também serve de acesso dos carros funerários, citou o diretor. “O cadáver é preparado lá, vem aqui para o morbe, chega aqui, a gente tem que colocar em um saco próprio. O corpo é identificado lá. A gente comunica a família, pede para a família vir com os documentos. A hora que a funerária chega, aí a gente traz um familiar para vir reconhecer o corpo e liberar”, descreve o médico, a rotina da equipe e aponta para cada sala, instalada sequencialmente no terreno da unidade.
Ainda neste local, Salustiano mostrou-me dois enormes cilindros de oxigênio. Segundo ele, o hospital contava com apenas um deles, mas devido ao que ocorreu com Manaus (AM), decidiram adquirir outro. Na outra extremidade da aérea, ele chamou minha atenção para uma enorme caixa d’água. “Tivemos que ampliar”. Para várias outras salas, recém-construídas: “são todas farmácias”. E logo adiante, indicou dois geradores de eletricidade. “Nunca precisou ser usado. Mas apenas um deles já toca o hospital inteiro. Não dá para brincar!”, afirma.
Acompanhe a última parte dessa visita, quando irei narrar as instalações do piso 2, onde ficam localizadas as enfermarias e mais leitos de UTIs. Lá fiquei mais próximo dos pacientes, alguns estavam recebendo alta médica. Abordarei sobre as denúncias contra o hospital no Ministério Público de Goiás (MP-GO) e o episódio da troca de corpos. A matéria será publicada no próximo domingo (21/08), aqui no ohoje.com.