A cada cinco mulheres, uma desenvolve depressão pós-parto
Até 70% das brasileiras relatam sintomas de ansiedade e/ou depressão durante a gravidez
O período de gestão potencializa o risco de adoecimento psíquico e pode provocar doenças como ansiedade, depressão e estresse. No Brasil, 7 a cada 10 mulheres relatam sintomas semelhantes durante a gravidez, segundo dados levantados pela campanha Maio Fruta-cor. Em sua primeira gestação, aos 28 anos, Maysa Maneira Bittar Bessa teve depressão pós-parto e a experiência levou ela a se especializar na psicologia perinatal e parental com o objetivo de ajudar mulheres com situação parecida com a dela.
“Até ser mãe só tinha ouvido falar que a maternidade era cor de rosa, mas quando me tornei mãe percebi que ela tem todas as cores. Que tem momentos que predomina o rosa, em outro cinza, em outros o amarelo. E quanto mais nos conhecemos e conhecemos nossos filhos, mais conseguimos vivenciar a maternidade de uma forma leve e saudável”, conta ela 10 anos após o primeiro filho.
Com o alto risco do adoecimento psicológico, é importante que as gestantes façam um acompanhamento pré-natal psicológico ao longo da gestão, além do cuidado físico para ela e o bebê, explica a psicóloga.
Além do acompanhamento profissional, o apoio e acolhimento familiar são etapas fundamentais para os cuidados com a saúde física e mental. “Eu tive depressão pós-parto no nascimento da minha primeira filha, não conheci o Pré-natal Psicológico , então não fiz nenhum trabalho preventivo. Tinha muitas idealizações da gestação, da amamentação, da maternidade e muitas eram irreais. Quem me auxiliou bastante foi meu marido, pais, irmãos, cunhadas, sogros e amigos. Aceitar o que estava vivendo e sentindo não foi nada fácil, mas crucial para aceitar o tratamento”, relembra.
Preparação e expectativa maternidade
Mesmo com a preparação e uma rede de apoio para os nove meses, muitos desafios e contratempos podem ser enfrentados pelas gestantes. Karina Fernanda da Silva, 35, é reflexoterapeuta e tinha a expectativa que tudo saísse conforme o planejado. “Eu tinha me preparado tanto e tinha feito tudo para evitar possíveis problemas como por exemplo a depressão pós-parto”, relata.
A amamentação foi o primeiro grande desafio de Karina após o nascimento de Valentina. “Eu não tinha muito bico no seio então me machucou muito. Tiveram dias que sangravam e todos os dias eu chorava muito porque a dor era muito grande. Só que eu tinha me preparado para amamentar então eu não desisti”.
No período de pós-parto ela teve hemorragia, que desencadeou uma anemia e a impediu de cuidar sozinha da filha. “Novamente precisei de apoio. Como o parto foi natural eu tive hemorróidas, então eu amamentava em pé nos primeiros dias. Depois de umas semanas eu tive mastite. E essas coisinhas começaram a me perturbar. Me deixando triste porque eu idealizei e planejei tudo e ver as coisas saindo do meu controle me deixava muito ansiosa”, relembra.
Karina conta que essas situações ajudaram ela a ter uma visão melhor sobre a maternidade. “Tudo isso me mostrou como a depressão é algo de dentro. Porque por vezes eu via o externo indo muito bem, mas por dentro eu estava destruída e ver que eu não encontrava no externo a razão daquela sensação interna isso me deixava pior porque pensava que não estava sendo grata e aproveitando aquele momento”. As pessoas que ajudaram Karina nesses momentos difíceis a fizeram ver que ela precisava de ajuda.
Atualmente a filha dela, a Valentina, está com 6 anos, ela ainda se cuida, faz terapia e ainda toma uma medicação. Mas, Karina deixa claro que a maternidade foi algo maravilhoso na vida dela mesmo com os imprevistos. “A minha gestação foi super tranquila e perfeita com alimentação saudável, engordei dentro do esperado médico, tudo estava perfeito para a chegada tão esperada da minha Valentina”.
Impactos que a falta de cuidado com a saúde mental materna pode causar
O Maio Furta-Cor é uma campanha que visa sensibilizar a população para a causa da saúde mental materna.O objetivo é realizar ações de conscientização ao longo de todo o mês de maio, época em que celebramos nacionalmente o mês das mães. O projeto está sendo realizado pelo segundo ano consecutivo. As idealizadoras do projeto afirmam que “o Furta-cor é a cor da maternidade, cuja tonalidade se altera conforme a luz que recebe. A maternidade tem cores: preta, branca, amarela, indígena. As cores da maternidade não se anulam, não são iguais nem formam uma cor só. Suas cores são suas diferenças na igualdade do direito de ser mãe”.
A representante do projeto em Goiás e médica psiquiatra, Dra. Lisa Pena Bueno de Moura atua na área de perinatalidade. Ela conta que a campanha surgiu em 2021 com a meta de mostrar o cenário das mães durante a pandemia “famílias desintegradas por perdas, um ano com escolas e creches fechadas, mães vivendo jornadas triplas em suas casas, expostas ao crescente número de violência doméstica e feminicídios. Consequentemente e infelizmente favoreceu o aumento significativo do adoecimento materno, com casos de ansiedade, depressão e comportamento suicida”, explica a especialista.
A dra. Lisa Pena acredita que é essencial trazer a discussão de saúde mental das mães para a sociedade atual, já que a realidade mostrada é bem diferente. “Estudos mais recentes apontam que o período perinatal (ciclo que vai da concepção ao pós-parto) é a fase da vida da mulher de maior prevalência de transtornos mentais. Veja que ainda hoje a visão romantizada da maternidade é propagada, com os rótulos de “super mãe” e “mulher maravilha”, além de falas como “ser mãe é padecer no paraíso”. Na verdade, esse estereótipo esconde uma mulher sobrecarregada, frustrada e cansada. Não lhe é dado o direito social de compartilhar “em voz alta” sobre as dificuldades e sofrimentos da maternidade, pois “que tipo de mãe você seria?” questiona. No dia 15 deste mês, espalhadas pelo Brasil, às 9 h, acontecerá uma marcha pela saúde mental materna.
Os impactos da saúde mental no geral são carregados por uma vida toda se não tiverem o devido cuidado. A Terapeuta Sistêmica, Dayane Melo atende muitas mães que passam por dificuldades de aceitação na maternidade.“As principais queixas são: tristeza, depressão, não conseguir amar verdadeiramente o filho, se sentir incapaz, sem paciência”.
Ela também explica que se não tratar a saúde mental materna o filho pode também sentir os impactos a longo prazo.“Uma saúde mental materna que não for bem cuidada pode gerar na criança rejeição na vida adulta, sentimento de abandono, agressividade, falta de socialização , dificuldade em relacionamento e vários outros problemas”. A terapeuta explica que isso acontece pelo fato da mãe ser o primeiro amor na vida de uma criança e se ela não estiver bem gera na crianças também a primeira decepção.
Dayane Melo fala que o ideal é trabalhar a mente antes de engravidar. “Tem que pensar: O problema não é o filho, o problema sou eu. Eu trago algo relacionado a minha infância que eu preciso trabalhar para que eu consiga ser mãe. Então, o meu alerta é: se trabalhe antes de ser mãe. Se não conseguiu antes, faça isso agora”, orienta a profissional.