Inflação esvazia feiras e hortifruti some da mesa do goiano
Nos últimos meses, a inflação é o principal assunto de donas de casas, produtores e feirantes
O cenário das feiras livres em Goiânia está diferente. Ao contrário do alarido sobre produtos e o tumulto dos anos antes da pandemia, poucas barracas e apenas alguns clientes estão presentes nos locais. O principal fator para a baixa procura, segundo os feirantes, é o aumento do preço dos hortifrutis. E não é para menos. Nos últimos meses, a inflação é o principal assunto de donas de casas, produtores e vendedores. A variação dos preços na Capital, no comparativo entre março e abril foi de 0,81%. Já a variação acumulada, medida nos últimos 12 meses, ficou em 12,87%.
O índice que mede o preço dos produtos aos consumidores mensalmente, o IPCA, sinalizou um crescimento 1,06%, a maior variação para o mês desde 1996 (1,26%). A batata-inglesa foi o maior vilão do aumento com um acréscimo de 18,28%, seguido do tomate (10,18%), o óleo de soja (8,24%), o pão francês (4,52%) e as carnes (1,02%). O índice mostrou, mais uma vez, que o aumento dos combustíveis puxou a inflação dos alimentos.
Outro levantamento aponta ainda que as hortaliças apresentaram em março aumento no volume de vendas de 9,9% em relação a fevereiro é de 7,7% em comparação com o mesmo período do ano passado, segundo o Boletim Prohort da Conab divulgado em abril de 2022
O feirante Wenikley Batista Lemes trabalha com a venda de hortifrutis há 19 anos e além do Cepal faz feira em outros lugares da Capital de terça a domingo. Segundo ele, o problema é que os alimentos que ele compra na Central Estadual de Abastecimento (Ceasa) estão caros e com qualidade inferior. “O pepino está muito caro e de qualidade ruim, jiló no atacado e o tomate que não abaixa de jeito nenhum”, reclama o feirante que antes pagava R$90 reais no saco de tomate e agora paga R$150.
Ele faz compras todos os dias para repor as mercadorias. Wenikley conta que é comum os clientes reclamarem dos preços. “Está mais caro e o fluxo diminuiu por causa dos aumentos. Depois da pandemia a situação não voltou ao normal e ainda com o aumento a feira está vazia”.
Simone Pereira é feirante há 39 anos vende folhagens em várias feiras e também no Ceasa e lá o movimento não está muito bom. “A venda no Ceasa está fraca por conta do aumento. O alface antes era R$8 o palito e agora está R$10.
Paola Alves é feirante há 15 anos no ramo de frutas. Ela também reclama que houve aumento em algumas frutas como o morango agora está R$15 a caixinha. Ela também reclama da diminuição dos fregueses. “O movimento diminuiu demais. Eu faço seis feiras por semana e a renda diminuiu demais. A gente faz promoção , dá desconto, brinde para não perder os clientes”.
Feirante há 24 anos, Carlos Augusto de Souza aponta que os itens mais caros são: cebola, cenoura, tomate, quiabo e vagem. “A cenoura estava R$8 o quilo e agora já está R$15 o quilo”, conta. Segundo ele, o fluxo caiu quatro vezes. Ele fala o que usa para economizar. “Tem que saber pechinchar na Cesa para conseguir um preço mais em conta”.
Geová Lourenço trabalha vendendo apenas bananas há 2 anos. Ele conta que os valores não tiveram muita alteração nos últimos dias, mas às vezes quando tem aumentos eles tentam driblar o valor. “A gente diminui o preço e cobre a oferta. Mesmo que aperte um pouco, o importante é não perder cliente”, conta confiante.
O vilão como sempre é o tomate, os preços do fruto tiveram movimentos de subida desde o final de 2021.Só no mês de março o tomate teve aumento de 27,19%. O motivo apontado é a redução de oferta acumulada em quase 10% em 2022 e a falta sazonal da fase de transição de safras. No caso da batata houve estabilidade de preços na Ceagesp-São Paulo com variação positiva de 0,32% e na Ceasa GO de Goiânia com queda de 0,29%.
Consumidores gastam mais com feiras
A cuidadora de idosos, Adriana Aquino vai à feira toda semana para comprar verduras, legumes e frutas. Ela gasta em média por mês R$300 com compras todo mês. “Antes com R$ 100 eu voltava com o carrinho cheio”, conta apontando para o carrinho de compras quase cheio. “Esse carrinho ainda não está cheio e já deu R$200”, conta Aquino que ainda não havia comprado as frutas. “Eu não parei de comprar os alimentos por causa dos preços, mas eu diminuí a quantidade”.
A funcionária pública, Solange Leão antes mesmo da reportagem se aproximar já esbravejou “está tudo um absurdo de caro”. Ela faz parte das pessoas que diminuíram a quantidade de vezes que vão à feira para fazer compras. “Antes eu ia toda semana, agora só de 15 em 15 dias”. Mas, mesmo assim ela tem preferência pela feira do que mercado. “A durabilidade dos produtos da feira são melhores”, explica.
Já Glória Espírito Santo é professora e gasta em média R$1.200 só com feira. “Eu moro no Setor Pedro Ludovico, então tem muitas feiras próximas. Vou em todas, e em todos os horários para pesquisar e escolher o que tem de bom em cada uma”, conta empolgada. Mas, mesmo assim ela não fica satisfeita com as aquisições. “Não tem como ir a uma feira atualmente e dizer que fez uma boa compra. Eu paguei R$13 em um abacaxi que antes era R$5”, conta chateada.
Aumento dos custos com insumos e falta de chuva impactaram
O Engenheiro Agrônomo e Coordenador Técnico do Instituto para o Fortalecimento da Agropecuária de Goiás, da Federação da Agricultura e Pecuária de Goiás (FAEG), Alexandro Alves dos Santos, explica que os insumos básicos da agricultura, como fertilizantes e defensivos agrícolas, subiram de preço e impactaram diretamente no custo para o consumidor. “Tivemos também a questão da intensidade de chuvas né especialmente no mês de fevereiro, março e uma pequena parte de abril onde essas chuvas prejudicaram muito algumas culturas já que são cultivadas basicamente a céu aberto então como se tratam de culturas muito sensíveis, acaba que interfere muito na questão do desenvolvimento dessas plantas e consequentemente na oferta de produtos”.
Os aumentos presenciados pelo goianos podem até mesmo interferir na geração de empregos. “Quando os custos começam a ficar muito altos para o produtor, ele vai ter que enxugar custos, baixa o máximo possível os gastos que ele tem. com isso ele diminui o tamanho da área, diminui o volume de produção. Então, se um determinado volume você demanda uma quantidade X de trabalhadores em um volume talvez X menos dois, você vai ter uma quantidade menor necessária de trabalhadores para tocar aquele mesmo negócio”, detalha o engenheiro.
Maçã, melão e o mamão tiveram aumento de até 350%
O aumento expressivo nos hortifrútis têm causado alarde e insatisfação na população brasileira. O diretor de política agrícola da Federação dos Trabalhadores Rurais na Agricultura Familiar do Estado de Goiás (Fetaeg), Orlando Luiz da Silva, explica que os aumentos dos hortifrútis têm influenciado o cotidiano das pessoas.
“Não só nos hortifrúti mas também no feijão, óleo de soja, gás de cozinha e carne estão caros. Levando em consideração que temos um dos menores salários mínimos e mais defasados do mundo, se torna um verdadeiro dilema a vida das famílias, quase um milagre sobreviver com a renda mínima”, conta.
Silva explica os prováveis motivos para o aumento. “O aumento desses produtos se deve a duas situações: primeiro são as possíveis intempéries, às vezes a falta de chuva e às vezes se chove além do que a planta necessita. Segundo é a falta de políticas de incentivo e de crédito para produção, sobretudo para agricultores familiares que são responsáveis por produzir 70% daquilo que o brasileiro consome todos os dias”.
Segundo ele, o preço dos insumos e defensivos agrícolas também tiveram um aumento de 200% e isso diminui a oferta e aumenta o preço uma vez que o custo da produção também vai aumentar.
“Atualmente está difícil eleger apenas um produto como o mais caro, embora alguns itens sejam indispensáveis na mesa do brasileiro como a cenoura, tomate, jiló, batata e a vagem e no caso das frutas a maçã o melão e o mamão que tiveram aumento de até 350%”, explica.
Os aumentos impactam diretamente nas feiras de rua. “Existem dois tipos de feirantes: aqueles do interior que geralmente fazem uma feira por semana e que produzem para poder vender. E os feirantes urbanos que em sua maioria compram sua mercadoria no Ceasa e fazem até três feiras por semana. O que se vê é uma variação constante de preços devido aumento, a cada dia as famílias estão comprando e consumindo menos”, faz o alerta.
Luiz chama a atenção também para programas que apoiem a agricultura familiar. “Mercados institucionais como o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) e o Programa de Aquisição Alimentar (PAAsão fundamentais para quem produz, uma vez que são portas que se abrem para a agricultura familiar. Por outro lado, abastecer as escolas garante o repasse por intermédio das instituições, para famílias que perderam totalmente o poder de compra”, declara