Planos de saúde poderão recusar tratamentos fora da lista da ANS
Com isso, alguns tratamentos para esquizofrenia e síndrome de down podem ser recusados pelos planos
O Superior Tribunal de Justiça (STF) decidiu, na tarde desta quarta-feira (8), que os planos de saúde não são obrigados a oferecer tratamentos que estão fora da lista da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Com isso, alguns tratamentos para esquizofrenia e síndrome de down podem ser recusados pelos planos e dificulta a cobrança das terapias por meio da Justiça. Entidades e famílias que acompanharam a votação devem recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF).
O julgamento foi retomado ontem após pedido de vista coletivo em fevereiro, quando apenas dois ministros haviam votado, o relator Luis Felipe Salomão, que votou a favor do rol taxativo, e a ministra Nancy Andrighi, que votou em prol do rol exemplificativo.
Segundo Luciana Prudente, funcionária da Associação de Paralisia Cerebral de Goiás, a decisão implica na vida de todas as pessoas com deficiência que possuem plano de saúde. Diante da preocupação, os representantes das Associações de Paralisia Cerebral e Autismo do Estado acamparam na frente do Tribunal para pressionar a decisão. Mesmo com a manifestação, os votos foram contra.
A presidente do Instituto Lagarta Vira Pupa, Andrea Warner, diz que o rol taxativo não se sustenta no ordenamento jurídico brasileiro. “Ele distorce o modelo de sistema de saúde constitucionalmente posto, no qual a prestação de serviços de saúde por privados de forma suplementar ao Sistema Único, impõem a assunção dos riscos decorrentes do negócio. Não há, como querem as operadoras de saúde, espaço para um negócio livre de riscos e ônus, na incompreensível tentativa de converter um contrato essencialmente aleatório em uma obrigação comutativa (como se tal fosse possível) – isto é”.
Votos
Durante as justificativas, o relator utilizou do argumento que o Poder Judiciário possui papel fundamental de promover uma interpretação justa e equilibrada da legislação. Além de afirmar que as decisões administrativas ou judiciais à margem da lei podem agravar a situação financeira das operadoras de planos de saúde e afetar a confiança e expectativa dos consumidores, gerando problemas tanto para a empresa quanto para o usuário do serviço.
Já Andrighi, afirmou que o rol exemplificativo reforça preceitos da saúde como direito básico para toda a sociedade, direito garantido pela Constituição Federal de 1988, devendo seguir a Lei 9.656/98, dos planos de saúde, e o Código de Defesa do Consumidor (CDC).
Rol taxativo prejudica os mais pobres
O advogado Wanderson Ferreira afirma que o rol exemplificativo seria mais benéfico para a “população mais carente”, enquanto o taxativo prejudica os direitos garantidos por lei referentes à Saúde. “Hoje temos muitos processos contra as empresas de saúde, principalmente hospitais. Por exemplo, a Unimed tem vários processos por desacordo nos contratos de saúde referentes a cirurgias. Nesse sentido, é preciso conseguir um mandado de segurança ou um processo de obrigação de fazer”, afirma.
Já em relação à decisão exemplificativa, é defendida pela maioria doutrinária e jurídica. “Sendo assim, as grandes empresas vão ter grandes prejuízos por serem supostamente obrigadas a cumprir obrigações impostas pelo judiciário. Vivemos em um país capitalista, em que o lucro vem primeiro. Todavia, a população mais carente será beneficiada com o rol exemplificativo. As pessoas com deficiência terão mais benefícios”, explica.
Vale ressaltar que o caráter taxativo poderia afetar negativamente os consumidores, uma vez que é o exemplificativo que definem que as empresas de planos de saúde devem cobrir procedimentos indicados pelo médico que acompanha o usuário, mesmo que não estejam previstos na lista, desde que haja fundamentação técnica e em casos de procedimentos oferecidos pelo Sistema único de Saúde (SUS).
Ao Conselho Nacional de Saúde (CNS), a conselheira e coordenadora-adjunta da Comissão Intersetorial de Saúde Suplementar (Ciss) do CNS, Shirley Morales, explicou que a mudança para o rol taxativa limitaria os benefícios e inviabilizaria atendimentos, significando que, em casos de surgimento de doenças novas ou em casos de doenças raras, vários procedimentos seriam negados por não estarem na lista de obrigatórios. “Os beneficiários têm direito à integralidade de benefícios, tendo em vista a questão da defesa da vida e da saúde de uma forma integral”, afirma.
Além disso, a conselheira ressalta que os beneficiários que não fossem atendidos pelos planos de saúde teriam que migrar para o SUS, que está sobrecarregado, podendo indicar várias mortes de usuários desses planos e um colapso no sistema. No Brasil, existem cerca de 49 milhões de beneficiários de planos de saúde.