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segunda-feira, 23 de dezembro de 2024
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Doença genética

Profissionais de saúde temem a aplicação do remédio mais caro do mundo; entenda

Os profissionais de saúde de um hospital de Curitiba, no Paraná, têm receio de aplicar o remédio Zolgensma, que custa R$ 6,5 milhões. A maioria receia desperdiçar o conteúdo da droga. “E se eu deixar cair? E se eu perder uma gota?”, temem.

Postado em 28 de junho de 2022 por Ana Bárbara Quêtto

Os profissionais de saúde de um hospital de Curitiba, no Paraná, temem aplicar o remédio Zolgensma, que custa R$ 6,5 milhões. A maioria tem medo desperdiçar o conteúdo da droga. “E se eu deixar cair? E se eu perder uma gota?”, relatam.

A droga, que chegou a ser transportada em carro forte, é armazenada em local sigiloso até que finalmente possa ser aplicada em crianças com AME (Atrofia Muscular Espinhal). Uma doença genética rara que paralisa os músculos de recém-nascidos, levando a maioria à morte.

O remédio é tão caro que pode inviabilizar o orçamento de grandes cidades. Ele chega ao hospital com um esquema avançado de segurança. Esse esquema é um ritual no Hospital Pequeno Príncipe, em Curitiba, referência nacional em atendimento pediátrico e o segundo do país a administrar o Zolgensma em um paciente, em setembro de 2020.

A responsável pela aplicação foi a neuropediatra Adriana Banzato, que já vinha acompanhando o tratamento com Zolgensma em outras 30 crianças, na capital do Paraná. Em entrevista ao UOL, a médica fala sobre o custo de uma vida.

“Pensando só no dinheiro, quanto esse paciente vai custar à sociedade? Uma criança [com AME] deverá ter tratamento em tempo integral por toda vida. O custo disso para sociedade e para família é muito maior que o do remédio”, relata.

Para Benzato, o poder público deve custear o tratamento com Zolgensma por operadoras de planos de saúde, a quem necessitar. Segundo a pediatra, o remédio traz melhorias à qualidade de vida de crianças com AME. Ainda garante que todos os pacientes tratados melhoraram após a medicação.

Inclusive, Novartis, laboratório que desenvolveu a droga, convidou a doutora a expor sua experiência com o manuseio do remédio, no evento de lançamento no mercado brasileiro. A conferencia ocorreu em Brasília, no final de maio.

O preço

A novidade do remédio é que ele é um tratamento genético. O Zolgensma insere um pedaço de um gene em células do paciente com AME para que produzam uma proteína essencial para a sobrevivência de neurônios. Um dos motivos pelo preço do líquido.

Crianças com AME não têm o gene produtor dessa proteína, os neurônios começam a morrer. Logo, o paciente perde os movimentos motores e, em seguida, vem a atrofia.

Para inserir o gene produtor da proteína no organismo das crianças doentes, o Zolgensma utiliza um vírus, chamado AAV9, presente no ar e inofensivo a humanos. Em laboratório, o “conteúdo” do vírus é modificado. Entao, o gene produtor da proteína que falta no organismo de quem tem AME é inserido nesse invólucro.

Dessa forma, ao entrar no organismo humano, ele procura células para “infectar”. Ao encontrá-las, ele se fixa a elas, bem perto dos genes originais do paciente doente. Assim, o organismo produz anticorpos para combater o vírus, liberando o conteúdo.

Por fim, o gene se posiciona ao lado do DNA que passa a funcionar como se fosse do próprio organismo para sempre, e a proteína começa a ser produzida. Em alguns casos, essa abordagem não funciona. Por isso é importante fazer o teste da existência de anticorpos contra o AVV9.

Sobre o transporte do remédio

Banzato explica que o Zolgensma é um líquido que vem em pequenos frascos, de 5,5 ml ou 8,3 ml cada, enviados diretamente do laboratório para o hospital no qual o paciente receberá o tratamento. Cada paciente recebe uma dose de 40 ml a 80 ml, dependendo de tamanho e peso.

Com os dados do paciente, o laboratório calcula quantos frascos são necessários para compor essa quantidade de remédio e os envia acondicionados numa caixa. De acordo com a médica, carros fortes já foram utilizados para transportar o Zolgensma, mas acabaram sendo abandonados por chamar muita atenção.

Por segurança, o Hospital Pequeno Príncipe não informa o local onde o medicamento é armazenado até que ele seja aplicado no paciente. Ele chega ao hospital congelado a 60º C negativos. Leva 24 horas para o conteúdo se transformar em líquido.

Depois de um dia, os frascos podem ser abertos e aplicados nos pacientes. Benzato conta ao UOL que os farmacêuticos relataram apreensão durante o transporte. “Mas eles estão acostumados com esse trabalho. Passam por um treinamento e têm certificação para lidar com isso”, disse.

Aplicação do Zolgensma

O líquido é inserido no corpo das crianças através de um cateter na veia, similar ao usado na aplicação de soros. Para receber o Zolgensma, é preciso estar internado em um leito hospitalar.

Alguns hospitais só aplicam o Zolgensma em pacientes que foram internados um dia antes, e a alta só ocorre um dia depois do procedimento. Outros centros hospitalares exigem apenas uma hora de internação prévia e a liberação acontece no mesmo dia.

Segundo Benzato, o tempo de internação varia conforme o protocolo de cada hospital e a evolução de cada paciente. O custo para a aplicação do remédio, que não está incluso no valor do medicamento – muda de acordo com esses indicadores.

No entanto, o gasto extra dificilmente supera 1% do custo do remédio —o que pode chegar a mais de R$ 100 mil. Ainda assim, isso dificilmente sai do bolso dos pacientes, já que decisões judiciais obrigando o Estado a fornecer o Zolgensma para quem tem AME determinam que o internamento e a aplicação também sejam custeados.

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