Ele escreveu parte do DNA brasileiro
Parte importante da história nacional, com seus textos teatrais e suas novelas que marcaram gerações, Dias Gomes é homenageado em uma sequência de fotos, vídeos e objetos a partir desta quarta
Hoje, 19 de outubro, ele completaria 100 anos e seus romances e seus enredos novelísticos merecem todas as homenagens. O dramaturgo Dias Gomes conquistou, com as obras realizadas ao longo de sua vida, o tapete vermelho estendido no segundo piso do Itaú Cultural. A 57ª mostra da série Ocupação da instituição apresenta o seu percurso artístico iniciado no teatro aos 15 anos, passando pelo rádio, cinema e televisão. A exposição revela, ainda, o seu processo criativo, solitário e metódico, dedicando espaço não somente ao criador como também a suas criaturas, que se tornaram parte da memória cultural dos brasileiros.
A viagem pelo universo criativo de Dias Gomes, interrompido por um acidente de carro aos 77 anos, começa por sua peça teatral ‘O Pagador de Promessas’. Esta é disponibilizada dentro da prateleira ‘Histórias do cinema brasileiro’ no itauculturalplay.com.br. Escrita em 1959, estreou no teatro em 1960 sob direção de Flávio Rangel. Em 1962, foi adaptada para o cinema por Anselmo Duarte, tornando-se o único filme brasileiro a conquistar a Palma de Ouro, principal prêmio do Festival de Cannes, na França. Também se tornou o primeiro longa-metragem da América do Sul a ser indicado ao Oscar.
Considerado um dos maiores filmes brasileiros de todos os tempos, a tragédia ‘O Pagador de Promessas’ embute uma combinação perfeita entre a dramaturgia política de Dias Gomes, o estilo clássico adotado pelo diretor Anselmo Duarte e a performance de seus atores, em especial, de Leonardo Villar. Atuam junto dele, Glória Menezes, Dionísio Azevedo, Geraldo Del Rey e Norma Bengell. No filme, o enredo de Zé do Burro (Villar) e sua mulher Rosa (Glória) se desenrola quando ele decide começar uma caminhada rumo a Salvador, carregando nas costas uma imensa cruz de madeira para pagar uma promessa.
Por aí você já consegue perceber a grandiosidade do que Dias Gomes construiu. Entre cerca de 170 itens e dividida em oito núcleos, a exposição revela o dramaturgo por inteiro. A mostra, que permanece em cartaz até 15 de janeiro, percorre de suas origens, quando nasceu em Salvador, aos caminhos trilhados para se tornar um dos principais romancistas e autores de telenovelas do País. A história é apresentada com base nos registros que a plataforma, em parceria com a Rede Globo e familiares concederam. São mostradas cerca de 50 fotos e 10 vídeos com depoimentos, entrevistas dele próprio, trechos das novelas, textos e muito mais.
Sua chegada à Academia Brasileira de Letras (ABL), uma série de leituras dramáticas sobre seus textos teatrais, jogos interativos, programação educativa presencial e on-line e acessibilidade são alguns recursos que ampliam o conhecimento sobre a exposição e seu homenageado. Ainda ocorre a apresentação do coletivo paulistano Teatro do Osso que interpreta ‘Meu reino por um cavalo’. No sábado, a leitura de ‘A comédia dos moralistas’ é realizada pelo Núcleo Experimental. Por fim, no domingo, a leitura dramática é de ‘O Pagador de Promessas’, feita pelo grupo Os Inventivos.
Mesmo aqueles que sequer haviam nascido na época de novelas da TV como ‘O bem-amado’, ‘Roque Santeiro’ e ‘Saramandaia’, trazem em seu DNA a memória de Odorico Paraguaçu (Paulo Gracindo, o pai) e seu palavreado absurdamente rebuscado; do barulhinho inconfundível, parecido ao de uma cascavel, que faziam as pulseiras e o relógio de Sinhozinho Malta (Lima Duarte); ou das asas de João Gibão (Juca de Oliveira), entre outros. Dias Gomes faz parte da essência brasileira e suas obras ainda ecoam no imaginário nacional.
Ainda na plataforma é possível conhecer a história de Alfredo de Freitas Dias Gomes. Ele perdeu o pai aos 3 anos, e durante sua infância e juventude teve grande influência da mãe, Alice Ribeiro de Freitas Gomes, amante das óperas, e do único irmão Guilherme, escritor. Tinha 12 anos quando a família se mudou para o Rio de Janeiro, dando início ao seu percurso na dramaturgia crítica, contestadora e fiel ao retrato da realidade brasileira que sempre o acompanhou. Tamanha fidelidade e teor dos textos, que confrontavam e ridicularizavam o autoritarismo e os costumes sociais da época, muitas vezes lhe valeu a censura de peças e novelas pela ditadura.
A sua primeira peça, ‘A comédia dos moralistas’, foi escrita quando tinha 15 anos e venceu o Concurso do Serviço Nacional de Teatro, em 1939. O seu ingresso profissional nos palcos, no entanto, foi somente em 1942, com ‘Pé de cabra’. Ambos os textos podem ser vistos no espaço expositivo. Em seguida, o visitante encontra o mundo fantástico de Dias Gomes nas telenovelas ele ingressou na TV Globo em 1969. A partir desse ponto da mostra se sucedem os núcleos referentes à novela ‘O bem-amado’, de 1973, – a primeira exibida em cores no Brasil e a primeira a ser exportada –, ‘Saramandaia’, de 1976 com remake em 2013, e Roque Santeiro, 1985.