Com cacau mais caro, Páscoa de 2024 deve ser a mais ‘salgada’ das últimas décadas
Principal matéria prima para a produção dos chocolates, a amêndoa de cacau tem atingido preços recordes no mercado internacional
A Páscoa de 2024 já se aproxima e pelos mercados de Goiânia os lojistas preparam os enfeites e estoques de ovos de chocolate para a época mais doce do ano. O período de quaresma é o mais importante para o setor de produção de chocolates, mas neste ano de 2024, se depender dos preços do cacau, a Páscoa deve ser uma das mais ‘salgadas’ das últimas décadas.
Isso porque a principal matéria prima para a produção dos chocolates, a amêndoa de cacau, tem atingido preços recordes no mercado internacional. Até a última quinta-feira (15), a tonelada do produto era cotada em torno de 5,6 mil dólares (US$) na bolsa de valores de Nova York, o que representa aproximadamente R$ 27,9 mil por tonelada de cacau, ou R$ 1.671 pela saca de 60 kg.
A análise das cotações mostra que os preços começaram a apresentar crescimento acentuado a partir de setembro de 2022. À época, a tonelada da commodity estava em US$ 2.343. Passados seis meses os preços já chegavam a US$ 2.937, e em setembro de 2023 a tonelada era negociada em US$ 3.817. O auge do valor do cacau negociado foi no último dia 12 de fevereiro, quando rompeu o patamar de 6 mil dólares, com mercado fechado no dia a US$ 6.001.
A variação positiva representa inflação de 156,1% em 17 meses. O valor negociado atualmente é o mais alto da história dos registros da bolsa de Nova York, iniciada em 1920, superando o recorde anterior de 1977, quando a tonelada chegou a US$ 4.663. Tudo isso impacta diretamente a indústria nacional de chocolates, uma vez que o Brasil depende da importação para fomentar o setor.
Com mais dificuldades de adquirir o insumo, grandes indústrias já apresentam resultados negativos e planejam estratégias para cobrir os rombos, o que inclui o aumento de preços e redução de embalagens. Um estudo feito entre agosto de 2022 a agosto de 2023 pela Horus, empresa de inteligência de mercado, mostrou que os produtos ligados ao chocolate tiveram diminuição de 18,5% no volume por embalagem, enquanto o preço médio por quilo subiu 9,9%, estratégia chamada de “reduflação”. Na prática, os consumidores pagam mais caro por uma quantidade menor de produto.
E os impactos devem ser ainda maiores para os próximos meses. Segundo a Associação das Indústrias Processadoras de Cacau do Brasil (AIPC), as fábricas moem agora o produto que foi comprado há três meses, quando os preços, mesmo altos, eram menores. O maior impacto nos preços ao consumidor deve vir após a Páscoa, por volta de maio, quando o mercado começa a ser abastecido com o cacau comprado no auge dos preços.
Motivos dos aumentos
De acordo com a AIPC, as variações exorbitantes nos preços podem ser explicadas pelos efeitos climáticos que atingiram a África Ociental, onde ficam os dois maiores produtores de cacau do mundo, Gana e Costa do Marfim. Juntos os dois países abastecem cerca de 60% do mercado mundial. Outros grandes produtores são Indonésia, Nigéria, Equador, Colômbia, além do Brasil.
O excesso de chuvas na região africana no início de 2023 prejudicou as plantações e facilitou a disseminação de doenças que comprometem a produção e atrasam as colheitas. Os produtores locais também relataram, no último ano, inundações nas lavouras, além da ocorrência de El Niño a partir do segundo semestre, fenômeno climático que tende a deixar o clima mais quente e seco. Soma-se a isso o fato de os cacaueiros na região passarem por um processo de envelhecimento, o que contribui para limitar a produtividade em algumas áreas.
“Desde o início da temporada, em outubro/23, até a primeira semana de 2024, na Costa do Marfim, maior país produtor do mundo, foram registradas 873 mil toneladas de amêndoas de cacau entregues, 35% abaixo em relação ao mesmo período do ano passado, quando o país havia entregado 1,3 milhões”, avalia Alan Lima e Leonardo Rossetti, analistas do departamento de Mercado da StoneX.
No Brasil, os maiores produtores são os estados da Bahia e do Pará. A Bahia foi responsável por 61,9% do volume total de amêndoas nacionais recebidas pela indústria processadora em 2023, totalizando 136 mil toneladas. Em comparação com o ano anterior, quando o volume fornecido pelo estado foi de 139 mil toneladas, houve um recuo de aproximadamente 2,4%. O Pará, por sua vez, foi responsável por 33,7% do volume recebido, totalizando 74 mil toneladas, crescimento de 31,3% na comparação com o ano anterior, quando o recebimento foi de 56 mil toneladas.