Silvio Santos: O fim de uma era na televisão brasileira
Aos 93 anos, o carismático apresentador e empresário deixa um legado incomparável na história do entretenimento e da comunicação no Brasil
No último sábado (17), o Brasil despediu-se de uma de suas figuras mais emblemáticas e carismáticas do entretenimento. Silvio Santos, cujo nome de batismo era Senor Abravanel, faleceu aos 93 anos em São Paulo, após uma batalha contra a broncopneumonia decorrente de uma infecção por influenza A (H1N1). Sua morte, confirmada pelo Hospital Albert Einstein às 4h50, marca o encerramento de uma era que moldou a televisão brasileira e transformou a forma como o público se relaciona com o conteúdo televisivo.
Nascido em 12 de dezembro de 1930, no bairro da Lapa, no Rio de Janeiro, Silvio Santos teve uma infância modesta. Filho de imigrantes judeus, Alberto e Rebeca, ele foi o mais velho de cinco irmãos. Desde cedo, Silvio mostrou habilidade para o comércio e a comunicação. Ainda adolescente, começou a trabalhar como camelô nas ruas do Rio de Janeiro, onde desenvolveu seu talento natural para encantar e convencer as pessoas.
Aos 18 anos, em 1948, serviu no Exército Brasileiro na Escola de Paraquedistas, onde aprendeu disciplina e perseverança, valores que carregaria por toda a vida. Mesmo enquanto servia, ele não abandonou sua paixão pela comunicação, trabalhando aos domingos em uma rádio local. Após deixar o Exército, decidiu seguir a carreira na locução, começando com pequenos trabalhos, como anúncios em uma barca que ligava Rio e Niterói.
Em 1954, mudou-se para São Paulo, onde sua carreira no rádio começou a ganhar tração. Ele assinou seu primeiro contrato fixo como locutor na Rádio Nacional. Foi nessa época que conheceu Manuel de Nóbrega, um importante empresário e radialista, que o convidou para ser animador de seu programa. Esse encontro foi decisivo para sua carreira, que, além de se tornar um dos principais animadores do rádio, também assumiu a direção do Baú da Felicidade, uma empresa que vendia brinquedos a prazo. Com uma visão empresarial aguçada, Silvio transformou o Baú em um sucesso, vendendo carnês que se tornaram parte do imaginário popular brasileiro.
Em 1959, deu seus primeiros passos na televisão com o programa ‘Audições’, exibido pela TV Paulista. Sua capacidade de se conectar com o público, aliada ao seu carisma natural, rapidamente o destacaram entre os apresentadores da época. Comandou programas como ‘Hit Parade’, ‘Quando Maestros Se Encontram’ e ‘O Grande Espetáculo’, mas foi com o ‘Vamos Brincar de Forca’ que começou a moldar o formato que o consagraria nos anos seguintes.
O ‘Programa Silvio Santos’, criado em 1963, foi um divisor de águas na televisão brasileira. Com uma fórmula que combinava entretenimento, jogos e interação com a plateia, o programa rapidamente se tornou o favorito das famílias brasileiras. Em 1965, após a compra da TV Paulista pela Globo, o programa passou a ser transmitido pela emissora para a cidade de São Paulo, e, posteriormente, para todo o Brasil. Mesmo com o sucesso na Globo, Silvio continuou apresentando programas em outras emissoras, como a TV Tupi, onde conduziu atrações como ‘Festa dos Sinos’, ‘Sua Majestade: o Ibope’, ‘Cidade contra Cidade’ e ‘Silvio Santos Diferente’.
A criação do SBT (Sistema Brasileiro de Televisão) em 1981 foi o ponto culminante da carreira do apresentador como empresário. Ele já havia adquirido seu próprio canal de televisão, o Canal 11 do Rio de Janeiro, em 1975, e inaugurado a TVS no ano seguinte, mas foi com o SBT que Silvio consolidou seu império midiático, Tornando-se a principal atração da emissora, e quadros como ‘Domingo no Parque’, ‘Qual é a Música?’, ‘Show de Calouros’ e ‘Porta da Esperança’ marcaram gerações de telespectadores.
Com bordões inesquecíveis como ‘Vem pra cá’ e ‘Quem quer dinheiro?’, Silvio Santos se tornou um ícone cultural. Sua habilidade em comandar um programa de mais de dez horas, mantendo o público engajado, é única na TV moderna. Ele também gravou marchinhas de carnaval como ‘Coração Corintiano’ e ‘A Pipa do Vovô’, que se tornaram populares. Em 2001, sua influência foi celebrada pela escola de samba Tradição, com o enredo ‘O Sorriso do Patrão’.
Silvio Santos entrou na política em 1989, candidatando-se à presidência pelo PMB. Sua entrada tardia, a duas semanas do primeiro turno, gerou grande repercussão. Com forte apelo popular, rapidamente alcançou 30% das intenções de voto, mas sua candidatura foi barrada pelo TSE. Apesar do episódio, ele raramente comentou o assunto e seguiu focado na televisão e nos negócios.
Nos últimos anos, manteve-se relativamente afastado da vida pública, especialmente após o início da pandemia de Covid-19. Em dezembro de 2020, ele celebrou seus 90 anos de forma privada, em isolamento ao lado de suas filhas. No entanto, em agosto de 2021, já vacinado, voltou ao palco que o consagrou, para a alegria de seus fãs. Sua última aparição em seu programa foi um momento de celebração, em que o apresentador, com seu tradicional bom humor, brincou: “Para tudo, já estou aqui. Já cheguei!”. Esta foi a última edição do programa gravada por ele, marcando o encerramento de uma trajetória brilhante.
Silvio Santos deixa sua esposa Íris Abravanel, com quem era casado desde 1978, seis filhas – Daniela, Patrícia, Rebeca e Renata, do casamento com Íris, e Cíntia e Silvia, do primeiro casamento com Cidinha, que faleceu em 1977 – além de 14 netos e 4 bisnetos.
Em respeito ao desejo de Silvio, não houve velório público. Uma cerimônia judaica restrita à família e amigos mais próximos foi realizada em um cemitério israelita, conforme sua vontade expressa em vida. A família Abravanel, em nota oficial, pediu que Silvio seja lembrado com a mesma alegria que ele trouxe a milhões de lares brasileiros ao longo de sua carreira. “Ele gostava de ser celebrado em vida e gostaria de ser lembrado com a alegria com que ele viveu”, afirmou a nota.