Especialistas avaliam impacto de atentado em Brasília no projeto de anistia
Analistas veem de “pá de cal” a enfraquecimento no texto que pretende perdoar golpistas do 8 de janeiro
Por Francisco Costa
O atentado na Praça dos Três Poderes, em Brasília, com a explosão de bombas, na noite de quarta-feira (13), impacta o País de diversas formas. Um desses impactos, na parte política, diz respeito ao projeto de lei que dá anistia aos condenados pelos ataques golpistas de 8 de janeiro na Câmara dos Deputados.
Luiz Signates é doutor em Ciências da Comunicação e especialista em Políticas Públicas. Para ele, o atentado em Brasília coloca a “pá de cal que faltava no projeto da anistia dentro do Congresso”.
Mesmo isolado e individual, o ato possui um valor simbólico que não tem como ser ignorado, avalia o também professor. “O contexto do ódio bolsonarista ao Supremo Tribunal Federal (STF) é um sintoma de algo muito mais grave, que é a sanha fascista que a extrema-direita tem assumido no mundo e, no Brasil, a partir do bolsonarismo. Ficou mais do que evidente que se trata de uma vertente a ser combatida com rigor, sob pena de perdermos o tecido político, já frágil, que sustenta a democracia brasileira.”
Segundo ele, o próprio ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), com base em suas últimas declarações – pacifistas e apaziguadoras -, já percebeu que a postura que passou a vida alimentando, sem peias, não o levará a lugar nenhum, senão ao cárcere. “Essa mudança dele também é sintoma de que talvez o Brasil esteja enfim virando a página do golpismo. Resta agora apenas o Judiciário funcionar, de forma exemplar, para que essa questão se consolide”, diz.
Signates, contudo, não descarta que ocorra uma nova onda de violência, a partir do trumpismo norte-americano. “Mas, aí, será outra história. Por enquanto, considerando o contexto brasileiro, o atentado de Brasília foi uma péssima notícia para os golpistas e seus defensores”, resume.
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Ainda sobre as explosões, o professor e cientista Guilherme Carvalho crê que o ato enfraquece o argumento da anistia, mas não acaba com ele. “Enfraquece aquele esforço de tentar fazer esse pessoal parecer coitado, mas não me parece que modifica muito o ímpeto daqueles que são mais fiéis ao discurso.”
Para ele, apesar de impactante [o atentado], esse elemento não deve desmobilizar essa causa. “Até porque, essa pessoa vai parecer para muitos um herói, alguém que foi lá para combater o sistema. Então, eu acho que, em termos de comunicação política, afeta pouco para o ímpeto do pedido de anistia.”
Conversa entre bolsonaristas
De acordo com a Folha de S.Paulo, contudo, as explosões devem causar impactos que já são calculados, sobretudo, por bolsonaristas. Entre eles, justamente no projeto de anistia aos envolvidos nos atos golpistas de 8 de janeiro.
Em um grupo, o deputado federal Gustavo Gayer (PL) teria enviado a imagem do suspeito da explosão, que seria um ex-candidato a vereador pelo PL. “Parece que foi esse cara mesmo. Agora vão enterrar a anistia. Pqp [sic]”, teria escrito o goiano.
O deputado Capitão Alden (PL-BA), então, respondeu, conforme a reportagem: “Lá se foi qualquer possibilidade de aprovar a anistia”. “Adeus, redes sociais e esperem os próximos 2 anos de perseguição ferrenha! Com certeza o inquérito das fake news será prorrogado ad eternum”, emendou.
STF dá recado após explosão de bombas em Brasília
Ministros do STF, inclusive, mandaram um recado contra o projeto de anistia após o atentado. “O que ocorreu ontem (quarta, 13) não é um fato isolado do contexto. Queira Deus que seja um ato isolado, este ato. Mas o contexto é um contexto que se iniciou lá atrás, quando o famoso gabinete do ódio começou a destilar discurso de ódio contra as instituições, contra o Supremo Tribunal Federal, principalmente. Contra a autonomia do Judiciário, contra os ministros do Supremo e as famílias de cada ministro”, afirmou o ministro Alexandre de Moraes.
O magistrado completou: “É demonstração que só é possível pacificar o País com responsabilização dos criminosos. Não existe possibilidade de pacificação com anistia a criminosos. Nós sabemos que o criminoso anistiado é um criminoso impune. A impunidade vai gerar mais agressividade, como gerou ontem [quarta]”.
O presidente do STF, Luís Roberto Barroso, também se manifestou. Ele afirmou que, se proposta passar no Congresso, ela tende a incentivar novos atos violentos. “Algumas pessoas foram da indignação à pena, procurando naturalizar o absurdo. Não veem que dão um incentivo para que o mesmo tipo de comportamento ocorra outras vezes. Querem perdoar sem antes sequer condenar”, criticou.
Atentado
Na noite desta quarta-feira, um carro explodiu em frente aos prédios governamentais do Brasil. Outra explosão ocorreu nas proximidades do Supremo Tribunal Federal (STF), na Praça dos Três Poderes, em Brasília. O incidente resultou na morte de uma pessoa. A vítima foi encontrada em frente ao prédio do STF.
Trata-se de Francisco Wanderley Luiz, de 59 anos, conhecido como Tiü França. Ele foi o responsável pela explosão. Ex-candidato a vereador em Rio do Sul (SC) pelo Partido Liberal (PL) em 2020, ele anunciou previamente o ato em suas redes sociais e explicou a escolha da data: “Eu não gosto do número 13”.
Tiü França compartilhou prints de mensagens enviadas a si próprio no WhatsApp, onde detalhava seu plano de explosão e criticava políticos de esquerda, chamando-os de “comunistas”. Em uma das mensagens, ele afirmou que a data, além de representar uma aversão pessoal, tinha, para ele, um significado sombrio: “Tem cheiro de carniça igual cachorro quando morre”.
Além disso, o homem, que era conhecido por suas críticas ferozes a figuras políticas, atacou, entre outros, o vice-governador Geraldo Alckmin (PSB), os ex-presidentes José Sarney e Fernando Henrique Cardoso, e o jornalista William Bonner, apresentador do Jornal Nacional em publicações.