Combate a mel adulterado é um dos desafios da apicultura
A produção ainda enfrenta alguns desafios que exigem a atenção dos apicultores e das autoridades para garantir a qualidade do produto produzido pelas abelhas
O Brasil consolidou sua posição como o décimo maior produtor de mel do mundo, com um crescimento de 2,7% na produção em 2023. O país conta com mais de 100 mil apicultores, sendo 82% deles dedicados à apicultura familiar. O Rio Grande do Sul lidera a produção nacional, seguido por Piauí e Paraná, enquanto a Região Nordeste se destaca, representando 39,9% do total. Além do mel, a apicultura brasileira diversifica sua oferta com produtos como favo, cera, própolis e geleia real, fortalecendo a economia e os mercados locais.
A apicultura é uma atividade em expansão, envolvendo cerca de 350 mil apicultores e abrangendo 3.991 municípios com registro de produção de mel em 2021. Para muitos, especialmente na agricultura familiar, essa prática representa uma importante fonte de renda. Além disso, o Brasil é lar de aproximadamente 250 espécies de abelhas sem ferrão, da tribo Meliponini, o que reforça a biodiversidade e a importância ambiental dessa atividade no país.
Com um mercado em contínuo crescimento, a apicultura brasileira mostra um alto potencial de desenvolvimento, impulsionando a economia e contribuindo para a preservação ambiental.
Goiás é um dos Estados mais produtivos de mel no Brasil, graças a um clima favorável e a uma apicultura adaptada às condições locais. Entretanto, a produção ainda enfrenta desafios que exigem a atenção dos apicultores e das autoridades. De acordo com Alcione Aparecida Carlos de Oliveira, administradora de uma loja de apicultores, o clima goiano tem um papel fundamental no sucesso da apicultura no estado.
“Aqui em Goiás, já conhecemos bem o clima e sabemos como as abelhas se adaptam a ele. O período de seca, que é predominantemente no estado, favorece a produção de mel. Esse ano, por exemplo, tivemos uma superprodução de mel, algo que é comum devido ao clima seco”, afirmou Alcione.
No entanto, a produção de mel não é contínua ao longo do ano. “Nos apiários fixos de Goiás, a produção de mel não é constante. No período de chuva, as floradas diminuem, o que reduz as fontes de alimento para as abelhas”, explicou Alcione. Durante a estação chuvosa, as abelhas enfrentam dificuldades devido à escassez de néctar e pólen, o que leva os apicultores a fornecerem alimentação artificial para garantir que os enxames não morram de fome. “No período da entressafra, a alimentação suplementar se torna essencial”, complementou
A falta de formalização no setor
Apesar do progresso da apicultura em Goiás, José Elton de Melo Nascimento, supervisor da cadeia de apicultura, alerta para desafios estruturais importantes. Ele observa que muitos produtores ainda trabalham em condições informais, como apiários e casas de mel sem registro, o que limita a comercialização legal do mel e impede que os apicultores acessem mercados importantes, como grandes redes de supermercados e farmácias. Além disso, essa informalidade abre espaço para a concorrência desleal com produtos falsificados.
“Infelizmente, ainda vemos consumidores optando pelo mel mais barato, que muitas vezes é apenas xarope à base de açúcar. O mel verdadeiro é mais caro por conta da qualidade e do processo de produção adequado, mas vale o investimento”, alertou José Elton. Essa falta de regulamentação também dificulta a garantia de que o mel consumido seja realmente puro e de boa qualidade.
Em Goiás, mais de 90% dos apiários são fixos, ou seja, as colmeias permanecem no mesmo local durante todo o ano. Essa característica tem tantas vantagens quanto econômicas. “Embora o apiário fixo proporcione uma maior adaptação das abelhas ao clima e ao ambiente, a produção de mel não é constante. O ápice da produção ocorre após o período de seca, quando as floradas se tornam mais abundantes”, explicou Alcione.
José Elton, por sua vez, ressaltou a importância da genética local no processo de produção. “Embora rainhas de outros estados podem ter boa genética, elas frequentemente enfrentam dificuldades para se adaptar ao clima quente e seco de Goiás. Isso pode levar à morte das rainhas durante o transporte e adaptação. Por isso, é preferível que os apicultores criem suas rainhas, adaptadas ao clima da região”, destaca.
Cuidados no processamento e o selo de excelência do mel
Outro aspecto singular da apicultura goiana é a preferência por rainhas criadas no próprio estado. Alcione explicou que as rainhas oriundas de regiões mais frias enfrentam dificuldades para se adaptarem ao calor intenso de Goiás, muitas vezes não sobrevivendo ao transporte ou às condições climáticas locais. “A criação de rainhas locais é uma solução eficiente, garantindo abelhas mais resistentes e produtivas”, afirmou.
José Elton acrescentou que o fortalecimento genético local é uma prioridade para garantir a longevidade da produção no estado. “Trabalhar com rainhas adaptadas ao clima de Goiás é essencial. Estamos desenvolvendo parcerias para fomentar programas de melhoramento genético e distribuição de colmeias que sejam resilientes às condições do Cerrado”, destacou.
O cuidado no processamento do mel é outro diferencial da apicultura em Goiás. Alcione detalhou o protocolo rigoroso adotado pelos apicultores locais: “A colheita é feita no final da tarde para evitar o estresse das abelhas. Em seguida, o mel passa por centrifugação e decantação, garantindo um produto puro e de alta qualidade.”
Para José Elton, esses padrões são fundamentais para a valorização do mel goiano no mercado. “Nossa meta é consolidar o mel de Goiás como referência nacional de qualidade. Investir na capacitação dos apicultores e na infraestrutura de processamento é o caminho para fortalecer essa marca”, comentou.
Goiás tem marcado que é possível combinar tradição, inovação e adaptação para superar desafios e consolidar-se como um dos estados mais produtivos na apicultura. “Apesar das dificuldades impostas pelas mudanças climáticas e pela sazonalidade, o potencial do estado é enorme. Com o manejo correto e o apoio técnico, a apicultura goiana pode alcançar patamares ainda maiores”, concluiu Alcione.
José Elton enfatizou que o fortalecimento da cadeia produtiva depende de parcerias estratégicas. “Precisamos continuar investindo em tecnologia, pesquisa e políticas públicas que incentivem o setor. Goiás tem tudo para ser referência não apenas na quantidade, mas também na qualidade do mel que produz”, finalizou o supervisor.
O reconhecimento da apicultura de Goiás como referência nacional é reflexo não apenas das condições naturais privilegiadas, mas também da resiliência e profissionalismo dos apicultores locais, que transformam desafios em oportunidades