Imposto seletivo para bebidas alcoólicas pode reduzir óbitos e adoecimentos
“Imposto do Pecado”, será aplicado sobre itens considerados prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente, com o objetivo de desestimular o consumo
O Imposto Seletivo (IS), também conhecido como “Imposto do Pecado”, será aplicado sobre itens considerados prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente, com o objetivo de desestimular o consumo. Por exemplo, uma pessoa que consome produtos enquadrados nessa categoria, ao comprar uma cerveja que atualmente custa R$35,00, poderá pagar R$40,00 devido à incidência da nova taxação.
A sobretaxa incidirá sobre itens como cigarros, bebidas alcoólicas e apostas, conforme aprovado pelo plenário da Câmara dos Deputados nesta terça-feira (17/12), no projeto que regulamenta a reforma tributária. O texto segue agora para a sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
O economista Luiz Carlos Ongaratto destacou que a implementação do imposto seletivo sobre produtos como cigarros e bebidas alcoólicas é uma medida interessante tanto do ponto de vista econômico quanto social. “Esse tipo de imposto incide sobre produtos ligados a hábitos nada saudáveis, como vícios. Ainda que o aumento de preço não leve a uma redução significativa no consumo, ele pode gerar benefícios importantes”, afirmou.
Segundo Ongaratto, a arrecadação gerada por esse tipo de tributação pode ser direcionada para financiar o Sistema Único de Saúde (SUS), ajudando no tratamento de doenças relacionadas ao uso excessivo de álcool e tabaco, além de lidar com problemas decorrentes, como acidentes causados pelo consumo de bebidas alcoólicas.
“Esse imposto não apenas aumenta a arrecadação, mas também faz com que os consumidores desses produtos contribuam de forma mais significativa para os cofres públicos, ajudando a custear os impactos que causam à sociedade”, explicou.
Ele ressaltou ainda que a Reforma Tributária e suas leis complementares devem ampliar esse tipo de tributação sobre produtos considerados nocivos, enquanto buscam reduzir ou até zerar os impostos sobre itens básicos, como alimentos essenciais. “É uma abordagem que combina justiça tributária com incentivos a hábitos mais saudáveis e um impacto positivo para a sociedade como um todo”, concluiu.
O Ministério da Saúde manifestou apoio à implementação do imposto seletivo para bebidas alcoólicas no Brasil, destacando a medida como essencial para reduzir os óbitos e adoecimentos. A proposta de taxar produtos nocivos à saúde e ao meio ambiente foi incluída no projeto de regulamentação da Reforma Tributária, aprovado recentemente pelo Congresso Nacional, e agora aguarda sanção presidencial.
De acordo com a pasta, o consumo de bebidas alcoólicas é um dos principais fatores de risco para diversas doenças e agravos à saúde. O Ministério da Saúde, alinhado à Organização Mundial da Saúde (OMS), reforça que não existe um nível seguro de consumo de álcool. “O uso de álcool em qualquer quantidade pode provocar danos à saúde, como câncer, acidentes de trânsito, violências interpessoais, transtornos mentais, doenças infecciosas, crônicas não transmissíveis, do fígado e do pâncreas, além de impactar negativamente o desenvolvimento da gestação”, afirmou o órgão.
No Brasil, dados de 2021 apontam que o consumo de bebidas alcoólicas foi responsável por cerca de 53 mil mortes, representando 3% do total de óbitos registrados no país. No cenário global, a OMS estimou 2,6 milhões de fatalidades em 2019, último ano com dados consolidados.
Além disso, o Ministério destacou informações do Instituto Nacional de Câncer (INCA), que apontam que o Sistema Único de Saúde (SUS) gastou R$1,7 bilhão, em 2018, no tratamento de cânceres associados ao consumo de álcool. Essa despesa pode ultrapassar R$4,1 bilhões anuais a partir de 2040, representando um aumento de 139%.
O uso, mesmo moderado, é responsável por expressivas parcelas de mortes por cirrose hepática (48,5%), doenças cardiovasculares (20,13%), cânceres de esôfago (14,89%), fígado (30,81%), cavidade bucal (24,47%), faringe (26,71%) e pancreatite (15,6%)”, ressaltou o Ministério.
Em relação aos impactos sociais, o Ministério citou um estudo de 2015 que revelou um aumento de 86% no risco de ideação suicida entre indivíduos com transtornos relacionados ao uso de álcool. Também destacou a relação entre consumo de álcool e acidentes de trânsito, afirmando que a direção alcoolizada contribuiu para 27% dos acidentes rodoviários. Em casos de violência interpessoal notificados em 2022, 29,2% envolveram consumo prévio de álcool pelo agressor.
A pesquisa Vigitel, de 2023, revelou que 44,6% da população adulta brasileira consome bebidas alcoólicas habitualmente. Entre adolescentes, a Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE) de 2019 indicou um aumento no consumo de álcool entre alunos do 9º ano, passando de 52,7% em 2012 para 63,2%.
Redução do consumo de álcool pode impactar a saúde pública
Para enfrentar esse problema, o Ministério da Saúde estabeleceu a meta de reduzir em 10% o consumo episódico pesado de bebidas alcoólicas até 2030, como parte do Plano de Enfrentamento às Doenças Crônicas não Transmissíveis e Agravos.
Esse tipo de consumo, definido pela OMS, refere-se à ingestão de 60 g ou mais de álcool puro em uma única ocasião, o equivalente a cerca de quatro ou mais doses para mulheres e cinco ou mais para homens. Uma dose corresponde a aproximadamente uma lata de cerveja, uma taça de vinho ou um shot de destilado.
De acordo com a Dra. Heloise Medeiros, gerente médica das UTIs do Hugol, o álcool tem um efeito direto sobre o sistema nervoso central, promovendo desinibição e favorecendo comportamentos impulsivos, muitas vezes com pouca percepção das consequências reais. “A diminuição do consumo de álcool pode minimizar a ocorrência de atos de violência doméstica, reduzindo situações conflituosas e facilitando uma convivência social mais harmônica”, destacou a médica.
A especialista alertou que o uso excessivo de álcool está associado a uma série de doenças graves, como as hepáticas, cardiológicas, digestivas, neurológicas e psiquiátricas. “Entre elas, destacam-se a cirrose hepática, a miocardiopatia, a pancreatite, o câncer de esôfago e a depressão”, explicou. Segundo a médica, a redução no consumo pode ser uma medida preventiva eficaz contra esses problemas de saúde.
Uma queda significativa no consumo de álcool também teria reflexos diretos na lotação das UTIs e enfermarias. A Dra. Heloise ressaltou que a diminuição nos casos de traumas por violência doméstica e acidentes de trânsito, além de uma melhor gestão de doenças crônicas, poderia reduzir internações por eventos agudos graves, como infarto e acidente vascular cerebral. “Isso contribuiria para uma menor ocupação hospitalar, possibilitando um acesso mais ágil aos leitos, internações menos prolongadas e desfechos mais favoráveis para os pacientes”, concluiu.