Ação contra uso eleitoral de emendas empaca no STF e favorece farra com dinheiro público
Estatal Codevasf, que é financiada por recursos de emendas parlamentares, realizou doações que superaram R$ 500 milhões durante as pré-campanhas de 2022 e 2024
A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 7220), que questiona a distribuição de bens adquiridos com recursos de emendas parlamentares durante o período eleitoral, aguarda há dois anos julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF). Protocolada em agosto de 2022 pelo partido Rede Sustentabilidade, a ação busca barrar essas práticas, vistas como favorecimento político, e assegurar um processo eleitoral mais justo e equilibrado.
Contudo, até o momento, o caso permanece paralisado no gabinete do ministro Kassio Nunes Marques, o que tem gerado sérias preocupações sobre a negligência da Corte em tratar uma questão que impacta diretamente a integridade das eleições no Brasil.
As emendas parlamentares, que têm como origem o orçamento federal, são recursos destinados aos estados e municípios para a execução de projetos e obras de interesse público. Entretanto, nos últimos anos, essa prática foi amplamente utilizada com objetivos eleitorais.
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Políticos de diversos espectros têm recorrido à distribuição de bens, como tratores, caminhões e máquinas agrícolas, para seus redutos eleitorais, com o intuito de angariar apoio político e eleitoral. A estratégia é simples: em ano de eleição, a entrega desses bens é acelerada, beneficiando eleitores e fortalecendo a imagem do político apadrinhado por alguém em Brasília.
Parado desde 2022
O processo judicial em questão começou a tramitar em 2022, após a constatação de que, em ano eleitoral, o uso dessas emendas se intensificou de forma preocupante. Em 2020, no período das eleições municipais, a Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf) , estatal responsável por distribuir grande parte desses recursos, realizou doações que ultrapassaram R$ 500 milhões. Em 2024, esse valor já superava R$ 540 milhões, o que representava um montante significativo de recursos, em grande parte direcionado a projetos de caráter eleitoral.
Essas doações, que se intensificam nas vésperas de eleições,é uma forma clara de abuso da máquina pública, que sem transparência na distribuição, compromete o equilíbrio das eleições. Mas, vale destacar que, no Brasil, há regras eleitorais que proíbem a distribuição gratuita de bens e serviços nos anos eleitorais, salvo em situações excepcionais. No entanto, parlamentares têm burlado a lei por meio de uma manobra jurídica, com a inclusão de um “jabuti” na Lei Orçamentária de 2022.
O “jabuti” foi um dispositivo incluído no projeto de lei original, sem relação com o seu conteúdo, que permitiu que as doações de bens fossem consideradas legais, desde que houvesse a exigência de encargos pagos pelos beneficiários. Na prática, a exigência de encargos foi usada como uma estratégia para contornar as restrições impostas pela legislação eleitoral, permitindo que as doações continuassem a ser realizadas com claros objetivos eleitorais.
Embora o Ministério Público Federal e a Advocacia-Geral da União (AGU) tenham se manifestado sobre o caso, a demora na análise da ação no STF tem repercutido mal. O partido Rede Sustentabilidade criticou abertamente a paralisação do processo, considerando que a morosidade judicial favorece a manutenção dessas práticas, que comprometem a igualdade de condições entre os candidatos.
A postura da Corte, especialmente do ministro Nunes Marques, ao não dar a devida atenção ao caso, levanta questionamentos legítimos sobre seu compromisso com a proteção do processo eleitoral. Afinal, ao manter esse tipo de prática sem fiscalização, o STF acaba permitindo que a máquina pública seja utilizada como um instrumento de manipulação política e eleitoral. Como é possível que uma farra tão escancarada com dinheiro público, em benefício de interesses políticos, continue sem uma definição por tanto tempo? A sociedade espera do tribunal a defesa da Constituição e dos direitos fundamentais.