Doação de órgãos cresce no Brasil, mas fila por transplantes ainda mata
Segundo dados do Ministério da Saúde mais 42 mil pessoas estão na fila de espera para ser transplantados

Duas jovens goianas que perderam a vida em acidentes transformaram o luto de suas famílias em esperança para outras pessoas. Com a autorização dos parentes, os órgãos de ambas foram doados e ajudaram a salvar a vida de pacientes em Goiás, Distrito Federal e São Paulo.
Os casos reforçam a importância da doação de órgãos no Brasil, que atualmente possui mais de 42 mil pessoas na fila por um transplante, segundo o Ministério da Saúde.
Uma das histórias que mais sensibilizou o estado foi a de uma jovem de 22 anos, vítima de um acidente de carro. A doadora teve morte cerebral diagnosticada no Hospital de Urgências de Goiás (HUGO). Com a autorização da família, coração, fígado e rins foram captados e enviados para diferentes estados.
O coração foi destinado a duas pacientes em Brasília e transplantado no Hospital da Força Aérea Brasileira (HFAB), enquanto o fígado e um dos rins foram levados a São Paulo em uma operação que envolveu helicóptero e equipes especializadas. A doação só foi possível graças à decisão dos pais da jovem. A operação foi coordenada pela Central Estadual de Transplantes de Goiás.
Outro caso semelhante ocorreu no final de janeiro deste ano. Camila Camargo Evangelista, de 28 anos, morreu após um acidente de moto em Goiânia. Internada no Hospital Estadual de Urgências Governador Otávio Lage de Siqueira (Hugol), ela teve morte encefálica confirmada. Seus rins, pâncreas e fígado foram transplantados para três pessoas, um paciente do Distrito Federal e dois do estado goiano.
No momento da captação dos órgãos, Camila recebeu uma homenagem da equipe médica e de familiares: foi aplaudida no corredor do hospital. “Ela sempre foi generosa. Doar seus órgãos foi um gesto que reflete quem ela era em vida”, disse a irmã da jovem, emocionada.
Doação digital avança no Brasil
Iniciativas para facilitar o registro da vontade de doar também têm avançado. Em 2024, foi lançada a Autorização Eletrônica de Doação de Órgãos (AEDO), uma plataforma digital em parceria com o Poder Judiciário e os Cartórios de Notas do Brasil. Isso significa que em 1 ano que o sistema está ativo mais de 20 mil pessoas já formalizaram sua intenção de doar por meio da ferramenta.
Essa adesão não é difícil a AEDO pode ser feita gratuitamente no site. O procedimento inclui a emissão de um certificado digital e assinatura eletrônica por videoconferência com um tabelião. Após a confirmação, o documento passa a integrar a base de dados nacional e pode ser consultado pelas centrais de transplantes no momento do óbito.
“A AEDO soluciona uma importante demanda social, registrando de forma segura e jurídica a vontade de ser doador. Isso evita dúvidas e facilita a conversa com as famílias em momentos críticos”, explicou Giselle de Oliveira Barros, presidente do Colégio Notarial do Brasil – Conselho Federal.
O documento pode ser revogado a qualquer momento doador e permite que o cidadão escolha quais órgãos deseja doar: medula, intestino, rim, pulmão, fígado, córnea, coração ou todos.
Números de doações de órgãos no Brasil
De janeiro a setembro de 2024, o número de doações de órgãos no Brasil cresceu 17% em comparação com 2022. Em 2023, o país realizou 29 mil transplantes, o maior número da história, segundo o Ministério da Saúde.
Apesar do avanço, o país ainda enfrenta um alto índice de recusa por parte das famílias. De acordo com o presidente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ministro Luís Roberto Barroso, algumas campanhas buscam sensibilizar a população: “Em 2023, a cada mil mortes, apenas 2,6 resultaram em doações, mesmo havendo 14,5 potenciais doadores. Queremos transformar o luto em esperança.”
Hoje, o Brasil é o terceiro país com maior número absoluto de doações de órgãos no mundo, atrás apenas dos Estados Unidos e da China. A maioria dos doadores brasileiros são homens, vítimas de Acidente Vascular Cerebral (AVC), com idades entre 50 e 64 anos. Crianças também integram a fila de espera: mais de 500 aguardam por um novo órgão.
O médico Daniel Rocha, que atua em transplantes renais no estado de Goiás, destaca a importância da sensibilização: “Quando a família entende que pode mudar o destino de outras pessoas, a dor ganha um novo significado. A AEDO está nos ajudando muito nesse diálogo com os parentes.”
Apesar desse lugar expressivo no ranking mundial, muitos ainda têm preconceito com a doação de órgãos talvez por religião ou até mesmo falta de informação. Segundo especialistas um doador pode salvar até 8 pessoas, e com essa informação chegamos aos números tristes, de que mais 3 mil pessoas morrem por ano no Brasil a espera de um transplante, essa estimativa também prevê que os órgãos mais esperados pelos paciente são rins, fígado, coração, pulmões e pâncreas.
As doações não precisam ser feita somente quando se perde um ente querido, doações em vida também são aceitas desde que possa ser cumprido algumas regras, como por exemplo, para doações em vida, são aceitos um rim, parte do fígado ou da medula, desde que o doador seja maior de idade e tenha compatibilidade sanguínea.
Essas doações em vida ajudam a diminuir a fila de transplante no Brasil, na maioria das vezes a doação de pessoas vivas, são sempre direcionadas para familiares, mas também podem ser feitas para não parentes, o que requer uma autorização judicial, sendo assim mais burocrático mas não impossível.
No cenário regional, o Estado de Goiás tem apresentado resultados expressivos no campo da doação e transplante de órgãos, registrando, em 2024, o maior número de doadores desde o ano de 2020. Foram 114 doações efetivadas, com 657 notificações de morte encefálica ao longo do ano. Os transplantes de órgãos e tecidos cresceram 65% nos últimos cinco anos, saltando de 540 procedimentos em 2020 para 891 em 2024. Ao todo, foram 3.414 procedimentos realizados no período.
A gerente da Central Estadual de Transplantes da Secretaria de Estado da Saúde de Goiás, Katiuscia Freitas, explica que a ampliação dos resultados está diretamente ligada ao trabalho de conscientização nas unidades hospitalares e à comunicação com os familiares dos pacientes.
“Trabalhamos com o incentivo à manifestação expressa do doador aos familiares e ao diálogo consciente. Levamos informações e esclarecimentos sobre todo o processo e fazemos campanhas sistemáticas de orientação”, afirma Katiuscia. Segundo ela, o aumento de 18% nas notificações de morte encefálica é reflexo direto de treinamentos com equipes médicas para a identificação correta e tempestiva desses casos.
Apesar dos avanços, a recusa familiar ainda é um dos maiores entraves para a doação. Mesmo com a possibilidade de salvar vidas, muitas famílias optam por não autorizar a retirada dos órgãos. “É um momento delicado. Por isso, é tão importante que as pessoas deixem clara sua vontade em vida”, reforça Katiuscia.
Esses avanços expressivos do estado captam e transportam órgãos, também passa pela rápida ação de colher os órgãos e já os levarem para serem transplantados em um paciente. Isso porque a integração entre hospitais, a Central de Transplantes, forças de segurança e serviço aeromédico permite que órgãos cheguem a tempo para os procedimentos. Em operações delicadas, como as que envolvem corações, a rapidez no transporte pode definir o sucesso do transplante.
“O transporte aéreo tem sido fundamental. Um coração, por exemplo, só pode ser transplantado em até quatro horas após a retirada”, explicou o coordenador da Central Estadual de Transplantes, Dr. Eduardo Silva.