Jota.pê vive auge da carreira com prêmios, turnês e novos projetos
Aos 33 anos, cantor comemora conquistas no Grammy Latino, indicações ao Prêmio da Música Brasileira e reflete sobre sua trajetória marcada por deslocamentos e experimentações
Aos 33 anos, Jota.pê comemora um dos momentos mais importantes de sua trajetória artística. Vencedor de três categorias no Grammy Latino 2024 e com duas indicações ao Prêmio da Música Brasileira 2025, o cantor e compositor vive uma fase intensa de shows esgotados na Europa, novos projetos e parcerias criativas. Em entrevista à Forbes, ele revisita a trajetória construída entre deslocamentos, experimentações e reinvenções.
“Gosto muito de tocar fora do Brasil. O público é diferente, mas essa troca é muito rica”, diz sobre apresentações recentes em países como Itália, Portugal, Suíça e Cuba. Apesar do alcance internacional, reforça a presença das referências locais em sua música: “Sempre ouvi de tudo. No meu primeiro disco, a influência do rock era mais evidente”, cita, mencionando bandas como System of a Down e Incubus. “Gosto desses saltos de dinâmica, que acabam se misturando de forma consciente ou inconsciente no que crio”.
Os deslocamentos da infância, entre cidades como Osasco, Fortaleza, Salvador e Rio de Janeiro, moldaram sua visão de mundo. “Foi muito doido perceber que São Paulo não é o mundo. O Brasil é um continente, com estados muito diferentes entre si”, reflete. Jota.pê também recorda episódios de preconceito que enfrentou ainda criança: “Eu morei em alguns lugares em que o único negro era eu. Esse contato foi muito louco e, às vezes, doloroso”. Hoje, vê essas experiências como fundamentais para sua formação pessoal.
A música sempre esteve presente, mas foi em 2015 que lançou seu primeiro álbum, “Crônicas de um Sonhador”. Dois anos depois, sua participação no The Voice Brasil marcou uma virada: “Foi muito importante, especialmente porque fazia dois anos que eu tinha largado tudo para viver de música. Subir no palco do The Voice foi o ápice do nervosismo que já vivi”.
As raízes aparecem não apenas no repertório, mas na sonoridade e nas escolhas estéticas: “Me sinto muito livre para explorar minhas referências, colocar tudo que carrego de música africana, da minha época de ogan de terreiro, de colocar percussão pra caramba”. Jota.pê defende uma produção aberta: “Se eu quiser falar sobre amor, eu falo; se quiser falar sobre fé ou orixá, também”.
A canção “Ouro Marrom”, premiada no Grammy, surgiu de um episódio de racismo presenciado por ele. “Inicialmente, a música era carregada de raiva, mas depois, com uma mensagem da Bruna Black, percebi que ser negro é sobre muitas coisas maravilhosas”. O arranjo foi simplificado para destacar o texto: “O piano tava tão bacana que a gente parou de prestar atenção na letra. E eu achei melhor não”. Além de Melhor Canção em Língua Portuguesa, Jota.pê venceu nas categorias de Melhor Engenharia de Som e Melhor Álbum de MPB/Música Afro-Portuguesa Brasileira, com “Se o Meu Peito Fosse o Mundo”.
O álbum, inclusive, foi gravado em imersão na Gargolândia, estúdio no interior de São Paulo. “Ficamos uma semana e meia todos juntos, que acho ser o melhor jeito de fazer discos.”
Na rotina, busca preservar o “ócio produtivo”, importante para manter a relação saudável com a música: “No começo, eu fazia música para fugir do trabalho. Agora, preciso de tempo jogando videogame, saindo com minha namorada, passeando com o cachorro.” O processo criativo inclui ouvir discos de outros artistas, anotar inspirações e, depois, voltar ao violão.
Além da carreira solo, mantém o duo ÀVUÀ com Bruna Black: “É um respiro. Estar com a Bruna no palco é muito bonito”. Recentemente, também participou do projeto “Dominguinhos”, com João Gomes e Mestrinho, gravado em Recife: “Era para ser cinco músicas, virou 12 na hora. Foi muito natural”.
Sobre colaborações futuras, cita artistas como Mayra Andrade, Dino D’Santiago, Emicida, Djavan, Gilberto Gil, Rincon Sapiência e Chico César. O artista também expressa vontade de atuar em outras áreas: produção musical, eventos, moda e educação. “Penso em criar um instituto para facilitar o acesso ao conhecimento musical, porque sou um cara que não estudou teoria, fui autodidata”.
Ao olhar para a música brasileira, reforça a potência do presente: “O futuro da MPB é o presente. Tem um monte de gente incrível já fazendo música. Quando olho ao redor e vejo Liniker, Luedji Luna, Os Garotin, Yago Oproprio, Bruna Black, Theodoro Nagô… sei que tá tudo bem”.