Ator Diego Martins critica onda conservadora nas novelas da Globo
Ator celebrou o espaço conquistado com a união de Kelvin e Ramiro no último capítulo da novela “Terra e Paixão”, mas apontou estagnação e conservadorismo após o encerramento da trama
O último capítulo de uma novela costuma reunir momentos marcantes, e o encerramento de Terra e Paixão em 2024, exibida pela TV Globo no horário nobre, seguiu essa tradição. Mas, desta vez, o casamento que emocionou o público não envolveu o típico casal heterossexual: Kelvin (Diego Martins) e Ramiro (Amaury Lorenzo) trocaram alianças no altar, protagonizando a primeira união entre dois homens no final de uma novela no horário nobre da emissora.
Em entrevista ao portal Terra, Diego Martins relembrou o impacto da cena e comentou os desdobramentos após o término da novela. O ator apontou que, apesar do feito histórico, as tramas seguintes não seguiram o mesmo caminho.
Representação LGBTQIAPN+ e conservadorismo nos roteiros
Durante a conversa, Diego mencionou a demora para a exibição do primeiro beijo entre os personagens. “Demorou para ter o beijo, mas depois que teve a gente conseguiu colocar beijo em tudo quanto é lugar. A gente fazia questão que fosse beijo de língua, queríamos que o Brasil inteiro visse a língua desses dois homens que se amam”, relatou.
Apesar da celebração, o artista observou que nenhuma novela exibida após Terra e Paixão apresentou cenas semelhantes. “A gente teve esse espaço, teve esse casamento e, após essa novela, não vi acontecer de novo”, afirmou. Para Diego, a redução de espaço para casais LGBTQIAPN+ nas tramas seguintes indica uma tendência de recuo. “Parece que a gente tem uma coisa de dar dois passos e voltar dez”, completou.
O ator citou ainda a diferença no tratamento dado aos casais heterossexuais. “A novela teve 221 ou 222 capítulos, a gente foi beijar no cento e alguma coisa. Ao mesmo tempo que isso estava acontecendo, os personagens principais, Cauã e a Bárbara, que eram um casal, já tinham transado mil vezes.”
Diego também resgatou sua memória de infância ao falar da novela América (2005), na qual o público esperava por uma cena de beijo entre os personagens de Bruno Gagliasso e Erom Cordeiro. A cena não foi ao ar, o que gerou grande repercussão na época.
Desafios enfrentados por atores LGBTs como Diego Martins
Durante a entrevista, Diego destacou outro ponto importante: a dificuldade enfrentada por artistas abertamente LGBTQIAPN+ para conseguir papéis de destaque. “Principalmente nos anos 2000, a gente não via homens assumidamente LGBTs fazendo o papel do cara que vai casar com a mocinha, justamente porque é gay”, afirmou.
O ator também questionou a recorrência de atores heterossexuais interpretando personagens gays, enquanto o contrário não acontece com a mesma frequência. “Um homem gay não pode representar um homem hétero, mas um homem hétero pode representar um homem gay? Isso foi feito por muito tempo, e essas representações foram muito superficiais.”
Mesmo com essas limitações, Diego disse ter prazer em interpretar personagens gays. “Sou um homem gay que ama representar homens gays, inclusive para poder continuar falando sobre a pauta e continuar mostrando nuances de homens gays diferentes, mas não estudei só para fazer homens gays, quero fazer personagens no geral.”
O receio de perder oportunidades profissionais, segundo ele, ainda faz com que muitos artistas optem por manter a sexualidade em sigilo. “As pessoas evitam falar, às vezes são muito reservadas. E elas não são reservadas porque querem, são reservadas porque sabem que vão perder trabalho”, observou.
Atualmente, Diego não está escalado para nenhuma nova novela. “Desde o Kelvin, fiquei esperando que pudesse ter alguma novela para um papel diferente e não veio. Vieram outros trabalhos muito legais que gosto de fazer, mas o meu trabalho em si, que é ser ator para fazer uma próxima novela, não veio”, concluiu.
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