Adoção cresce, abandono persiste
Mesmo com alta na adoção de cães e gatos sem raça definida, país convive com 30 milhões de animais em situação de abandono e punições pouco aplicadas
O Brasil confirma sua afeição pelos animais sem pedigree. Segundo o PetCenso 2025, levantamento da plataforma Petlove com base em 1,8 milhão de registros, os vira-latas seguem como os preferidos nos lares. Entre os cães, 26% não têm raça definida, superando Shih Tzu (17%) e Yorkshire (6%). No caso dos gatos, o predomínio é ainda mais expressivo: 86% são sem raça, distantes do Siamês (5%) e do Persa (2%).
Os dados, coletados desde 2016, não revelam apenas uma preferência, mas um comportamento: a adoção consciente vem se consolidando, principalmente em áreas urbanas. A escolha dos nomes também aponta esse vínculo afetivo. Entre as fêmeas, prevalecem Mel, Luna e Amora. Nos machos, Thor e Luke lideram — influência direta da cultura pop, hoje amplificada por redes sociais e plataformas de streaming.
Mas há uma contradição incontornável. Estima-se que 30 milhões de cães e gatos vivem abandonados nas ruas ou em abrigos. O dado, da Organização Mundial da Saúde, revela o outro lado do afeto: o descaso. Desses animais, cerca de 20 milhões são cães, a maioria de pequeno porte e sem raça definida. Não se trata de exceção. É rotina.
A legislação existe. O artigo 32 da Lei de Crimes Ambientais (Lei nº 9.605/1998) define como crime o abandono e os maus-tratos contra animais, com pena de dois a cinco anos de prisão. A Lei nº 14.064, sancionada em 2020, ampliou as sanções para crimes cometidos especificamente contra cães e gatos. Ainda assim, o abandono raramente é punido.
O país que dá nome de herói ao cão e trata a gata como filha é o mesmo que, sem pudor, os larga em calçadas, rodovias e matagais. A disparidade entre o carinho individual e a omissão coletiva exige mais do que campanhas: demanda ação coordenada entre políticas públicas, educação e fiscalização. Enquanto isso não acontece, o latido atrás do portão divide espaço com os que são esquecidos.