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quinta-feira, 4 de dezembro de 2025
Câncer de mama

Projeto goiano reduz pela metade casos graves de câncer de mama no SUS

Iniciativa pioneira em Itaberaí, conduzida pela UFG, antecipa diagnósticos com exames feitos por agentes de saúde e propõe novo modelo de rastreamento no País

Anna Salgadopor Anna Salgado em 29 de julho de 2025
Iniciativa pioneira em Itaberaí, conduzida pela UFG, antecipa diagnósticos com exames feitos por agentes de saúde e propõe novo modelo de rastreamento no País
Foto: Shutterstock

No Brasil, pela primeira vez, um estudo clínico randomizado, ou seja, escolhido aleatoriamente, comprovou que é tangível a redução em pelo menos a metade, os casos de câncer de mama diagnosticados em estágios mais avançados da doença. 

A iniciativa é o Projeto Itaberaí, coordenado pelo professor da Universidade Federal de Goiás (UFG) e mastologista Ruffo de Freitas Júnior. “Tem mulheres que, sem o projeto, levariam quase 400 dias para iniciar o tratamento. Com a intervenção, esse tempo caiu para 120 dias”, afirma.

O projeto está sendo desenvolvido no município do interior de Goiás, Itaberaí, com gestão da Fundação de apoio ao hospital das clínicas e apoio da Prefeitura e do Ministério Público de Goiás. O programa faz parte do Centro Avançado de Diagnóstico do Câncer de Mama (Cora), que é vinculado ao Hospital das Clínicas da UFG. “O nosso foco é o tempo anterior ao diagnóstico, que é ainda mais negligenciado”, afirma Ruffo.

Quando observado sobre o cenário do Sistema Único de Saúde (SUS), o pesquisador destacou que os problemas estão além do prazo legal de  início do tratamento após diagnóstico. “Isso é inaceitável. O Projeto Itaberaí tenta justamente atuar nesse intervalo invisível”, pontua. 

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Para ele, o grande ponto diferencial está na reestruturação do fluxo de assistências e na introdução de ferramentas tecnológicas simples. “Essa reorganização não altera a regulação da rede. Após o diagnóstico, a paciente entra na fila como qualquer outra, ela não fura a fila. O que muda é que chega lá antes”, explica.

O modelo implantado se baseia no exame físico das mamas, realizado de forma contínua por agentes comunitárias de saúde habilitadas por meio de treinamentos. Embora não haja uma substituição para a mamografia,o exame é considerado eficaz, pois é capaz de detectar nódulos já palpáveis, comuns no início da maioria dos casos atendidos pelo SUS. “Estamos falando de tumores que, em geral, a mulher já sente. Sete em cada dez casos no SUS começam assim, com uma queixa palpável”, afirma.

Além de proporcionar a ampliação ao acesso no rastreamento, o projeto investe de forma contínua na qualificação das agentes comunitárias, que passam por treinamentos regulares. “No início, muitas delas não se sentiam habilitadas, tinham medo de errar. Mas, com o tempo, passaram a realizar o exame com confiança e qualidade”, relata Ruffo. O avanço técnico e prático desses profissionais também é reconhecido pelo coordenador do estudo: “Hoje, essas agentes realizam o exame físico com mais competência do que muitos médicos generalistas ou enfermeiros que não lidam com a saúde da mulher diariamente”.

Com um orçamento anual estimado em cerca de R$ 400 mil, o projeto é considerado um modelo economicamente possível para o SUS. “Esse é um modelo replicável e de baixo custo. O custo-benefício é incomparável”, diz Ruffo. Apesar dos resultados positivos, o pesquisador lamenta que a proposta ainda não tenha sido adotada por outros municípios brasileiros. “Nenhuma outra cidade brasileira aceitou, até agora, implementar o projeto”, pontua.

O Projeto Itaberaí é parte de um estado científico que deve ser conduzido a longo prazo, que exige acompanhamento prolongado das pacientes. “Esse é um estudo de 16 anos, e estamos no terceiro ano de projeto. Precisamos de maturidade dos dados”, afirma Ruffo. Ainda assim, apenas com os dados iniciais já apontam impacto relevante. “Temos certeza de que essa é uma estratégia promissora, eficaz, e que pode mudar o paradigma do rastreamento do câncer de mama no Brasil”, declara.

A expectativa dos pesquisadores é de que a experiência goiana sirva como base concreta para políticas públicas de rastreamento precoce em todo o Estado e mais tarde em todo o País, principalmente nas regiões com menos acesso à mamografia. “A pergunta agora não é se o projeto funciona, mas por que ainda não o estamos replicando em todo o Brasil. Quantas vidas mais precisaremos perder para adotar o que já sabemos que dá certo?”, conclui o pesquisador.

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