Aluguel cresce e casa própria perde espaço no Brasil
Dados do IBGE revelam queda no número de imóveis quitados e aumento no percentual de domicílios alugados; especialistas apontam concentração de riqueza e impacto da inflação
O sonho da casa própria, por décadas associado à estabilidade financeira e ao pertencimento social, está cada vez mais distante de parte dos brasileiros. De acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua), divulgada em agosto de 2025 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), cerca de 25% da população residia em imóveis alugados em 2024. A proporção representa um avanço de quase cinco pontos percentuais em relação a 2016, quando 18,4% dos lares estavam nessa condição.
Os números confirmam uma mudança estrutural no mercado habitacional. Em 2024, 23% das moradias eram alugadas, um acréscimo de 4,66 pontos percentuais em uma década. No mesmo período, a parcela de imóveis quitados caiu de 66,8% para 61,6%, enquanto os financiados tiveram leve retração, de 6,2% para 6%. A transição acompanha a expansão do crédito imobiliário, mas também reflete o descompasso entre renda e preço dos imóveis.
A PNAD aponta ainda que o país contava com 77,3 milhões de domicílios em 2024, número 1,7% superior ao de 2023 e 15,6% acima do registrado em 2016. A distribuição regional reforça desigualdades: o Sudeste concentra 43,1% das habitações (33,3 milhões), seguido pelo Nordeste, com 26,3% (20,3 milhões). O Sul responde por 15,1% (11,7 milhões), o Centro-Oeste por 8% (6,2 milhões) e o Norte por 7,6% (5,9 milhões).
Para William Kratochwill, analista da PNAD Contínua, a elevação no aluguel revela mais que uma questão de preferência. “É um indício de alta concentração de riqueza. Quando há também um processo muito longo de inflação, e salários reduzidos, vai se criando dificuldades de alavancar patrimônio de maneira a conseguir a casa própria”, afirma.
Outro dado relevante é a mudança no perfil das moradias. Entre 2016 e 2024, as casas perderam espaço relativo, enquanto os apartamentos avançaram 1,6%. O movimento indica uma tendência de adensamento urbano, estimulada pelo crescimento vertical das cidades.
O estudo também avaliou o acesso à rede de abastecimento de água: 86,3% dos domicílios estavam ligados à rede geral em 2024, sendo que 88,4% recebiam água diariamente. Outros 5% tinham fornecimento entre quatro e seis dias por semana, enquanto 4,6% dispunham de acesso apenas de um a três dias.
O retrato traçado pelo IBGE mostra um país em que o aluguel deixa de ser alternativa transitória e passa a ocupar papel central na moradia urbana. A redução da casa própria como horizonte majoritário tensiona políticas habitacionais e evidencia a necessidade de novos instrumentos para garantir o direito constitucional à moradia.