Silvio Tendler morre aos 75 anos
Diretor de Jango e Utopia e Barbárie marcou o cinema brasileiro com obras que uniram rigor histórico e sucesso de público
O cinema brasileiro perdeu nesta sexta-feira (5) um de seus nomes mais produtivos e populares. Silvio Tendler morreu aos 75 anos, no Rio de Janeiro, em decorrência de uma infecção generalizada. Há dez anos, enfrentava complicações de uma neuropatia diabética. A filha, Ana Rosa Tendler, confirmou a morte.
Poucos cineastas conseguiram aproximar o documentário de plateias numerosas como Tendler. Nos anos 1980, seus filmes sobre a política nacional romperam a barreira do nicho acadêmico e alcançaram cifras raras para o gênero. Jango levou 1 milhão de espectadores às salas e se tornou um marco na história do documentário. Os Anos JK atingiu 800 mil ingressos e, mais tarde, Tancredo, a Travessia completaria a chamada trilogia sobre presidentes brasileiros.
Ele também assinou o documentário de maior bilheteria do cinema nacional: O Mundo Mágico dos Trapalhões, visto por 1,3 milhão de pessoas em 1981. Seu projeto mais ambicioso, no entanto, foi Utopia e Barbárie, resultado de duas décadas de pesquisa, que recompôs a segunda metade do século 20 por meio de imagens de arquivo e depoimentos de pensadores como Augusto Boal, Eduardo Galeano e Susan Sontag.
Nascido no Rio em 1950, Tendler começou a filmar ainda sob a ditadura. Perseguido, exilou-se no Chile e depois na França, onde estudou história e cinema. De volta ao Brasil, fundou em 1976 a produtora Caliban, responsável por mais de 80 títulos que ajudaram a consolidar o documentário como ferramenta de interpretação histórica. Também lecionou na PUC-Rio e participou da criação da Fundação do Novo Cinema Latino-Americano em 1985.
Fora das telas, atuou em cargos públicos e organismos internacionais. Foi secretário de Cultura e Esporte do Distrito Federal e colaborou com a Unesco na articulação do audiovisual no Mercosul. Recebeu mais de 60 prêmios, além da Ordem Rio Branco (2006) e da Ordem do Mérito Cultural, concedida em maio deste ano.
Ao transformar acontecimentos políticos em narrativas de forte apelo popular, Silvio Tendler criou um cinema que não se limitava a registrar o passado, mas disputava a memória e o imaginário coletivo. Sua morte encerra a trajetória de um autor que fez do documentário um gênero central na cultura brasileira.