TJ-GO suspende lei que prorrogava prazo para fechamento dos lixões em Goiás
Medida cautelar atendeu pedido do MP-GO e apontou vícios formais no processo legislativo, além de conflito com a legislação federal sobre resíduos sólidos
Por meio de uma medida cautelar deferida pelo Tribunal de Justiça de Goiás (TJ-GO), foi suspensa a eficácia da Lei Estadual nº 23.407/2025, que havia sido emitida com o objetivo de prorrogar, pelo período de 360 dias, o prazo para o encerramento dos lixões no Estado.
A partir da decisão, foi atendido o pedido em ação direta de inconstitucionalidade (ADI) proposta pelo Ministério Público de Goiás (MP-GO), que questionou a legalidade da norma e apontou trâmites viciosos formais no processo legislativo, além de afrontas ao pacto federativo e à legislação ambiental vigente.
Em resposta exclusiva ao O HOJE, a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) informou que o Decreto nº 10.367/2023 instituiu o Programa Lixão Zero, dividido em duas fases. Na fase de transição, até agosto de 2024, os municípios devem solicitar licença de encerramento dos lixões, destinar corretamente os resíduos, implantar coleta seletiva e reabilitar áreas antigas, com 124 municípios já cumprindo as normas.
A fase definitiva envolve a gestão regionalizada de resíduos sólidos, estruturada pelo BNDES, com apresentação de modelos em março de 2026, seguida de avaliação de prefeitos, definição de contratos e leilões. A Semad e o MP-GO mantêm força-tarefa para auxiliar municípios que ainda não encerraram seus lixões.
Conforme detalhado pelo MP-GO, representado pelo procurador-geral de Justiça Cyro Terra Peres, a lei teria sido aprovada de maneira irregular. O veto do governador Ronaldo Caiado (UB) foi derrubado pela Assembleia Legislativa de Goiás (Alego) por meio de uma votação secreta, quando a Constituição Federal exige votação aberta após a promulgação da Emenda Constitucional nº 76/2013.
O relator da matéria, o desembargador Jeová Sardinha de Moraes, reforçou em seu voto que “a adoção do escrutínio secreto viola o princípio republicano, da publicidade e da transparência, imprescindíveis no processo legislativo”, conforme solicitado pelo MP-GO.
Ele também indicou que havia indícios de inconstitucionalidade material, pois a lei estadual estabeleceu um prazo uniforme de 360 dias para o fechamento de todos os lixões, contrariando diretamente a Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei Federal nº 12.305/2010, alterada pela Lei nº 14.026/2020), que prevê prazos escalonados e diferenciados conforme a realidade de cada município, com término previsto para agosto de 2024.
O magistrado ressaltou que “o Estado de Goiás, ao estabelecer um prazo próprio de 360 dias, cria regulamentação diversa da norma geral federal, extrapolando os limites da competência legislativa concorrente”, demonstrando que a medida estadual poderia gerar conflitos jurídicos, insegurança normativa e comprometer a execução da política nacional de resíduos sólidos. Ele também ressaltou que normas estaduais não podem contrariar diretrizes estabelecidas por legislação federal de caráter nacional e abrangência técnica.
Em seu voto, o desembargador também enfatizou que a proteção do meio ambiente constitui valor jurídico de dimensão fundamental, citando a doutrina de Paulo Affonso Leme Machado: “O princípio da prevenção ambiental impõe a adoção de medidas protetivas antes da ocorrência de dano, mesmo que este seja apenas potencial”.
O relator destacou ainda que estavam presentes os requisitos para concessão da tutela de urgência (medida cautelar), considerando a iminência de grave lesão à segurança jurídica, ao meio ambiente e ao ordenamento constitucional.
Ele alertou que “a norma impugnada já se encontra em vigor, produzindo efeitos imediatos, e criando obrigação normativa em potencial conflito com a política nacional de resíduos sólidos”, justificando assim a suspensão imediata da lei até o julgamento definitivo da ADI, de modo a evitar a consolidação de efeitos jurídicos e administrativos que possam ser irreversíveis.
Com a decisão, a eficácia da Lei Estadual nº 23.407/2025 fica suspensa, mantendo-se o prazo definido pela legislação federal, que se encerrou em agosto de 2024. O relator determinou a citação da Assembleia Legislativa de Goiás, na pessoa do presidente, para prestar informações no prazo de 30 dias, enquanto o MP-GO terá 15 dias para se manifestar, garantindo amplo contraditório, observância dos princípios legais e o respeito ao devido processo legal no âmbito do controle de constitucionalidade.