Educação a distância no ensino superior ultrapassa presencial em Goiás
No Estado, foram 15.647 matrículas na modalidade EaD no último ano, fazendo parte dos 50,7% dos estudantes em cursos a distâncias
Pela primeira vez na história, o Brasil registrou mais alunos em cursos de graduação a distância do que presenciais. Segundo o Censo da Educação Superior 2024, divulgado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), 50,7% dos estudantes de graduação estavam matriculados na modalidade de Educação a Distância (EaD).
Ao todo, são mais de 10,2 milhões de alunos no ensino superior, sendo 5,18 milhões na educação a distância. Em Goiás, os dados também refletem esse avanço: foram 15.647 matrículas em cursos EaD no ano passado, colocando o Estado na 16ª posição no ranking nacional.
Para o presidente do Inep, Manuel Palacios, essa expansão é resultado da combinação entre políticas públicas, novas tecnologias e maior interesse dos estudantes. “Estamos com 10 milhões de estudantes, e essa é uma marca a comemorar. Uma parcela importante dessa população teve acesso à educação superior por meio de novas tecnologias. A educação a distância proporcionou a ampliação da oferta e atendeu estudantes que, de outra forma, não teriam acesso à educação superior”, afirmou.
Em Goiás não é diferente, segundo a professora Fernanda Gomes, a pandemia teve parte neste aumento. “A pandemia foi um período conturbado, em que a educação teve que se reinventar em uma velocidade absurda, e com isso o EaD se instalou como uma solução momentânea, mas acabou ficando”, explicou.
Para entender por que o número de matrículas cresceu, é preciso olhar para o perfil do estudante goiano e brasileiro. Gomes, que leciona para o ensino médio e atualmente cursa uma graduação em EaD, explica que a modalidade atende a uma demanda reprimida.
“Os cursos a distância oferecem maior flexibilidade de horários, permitindo que o estudante consiga conciliar trabalho, família e estudo. Isso atrai especialmente adultos e pessoas de cidades menores que não teriam acesso fácil ao ensino presencial.”
Ela acrescenta que o EaD também é mais barato. “O ensino a distância geralmente têm custos menores para o aluno e para a instituição. Há economia com transporte, alimentação, aluguel de imóveis e manutenção de estruturas físicas. Isso facilita a vida de quem não pode arcar com os custos de estudar em uma Capital ou se deslocar diariamente.”
A experiência pessoal de Fernanda ilustra essa mudança. “Eu trabalho o dia inteiro e quero estar com meus filhos à noite. Não é possível estudar no turno presencial, mas também não quero deixar de estudar. Nem sempre a escolha pelo EaD é por falta de condições financeiras, mas por querer priorizar o tempo. Essa modalidade me permite continuar aprendendo sem abrir mão da minha família.”
Especialistas apontam que o avanço da educação a distância traz impactos positivos e desafios para o futuro da educação superior em Goiás e no Brasil. Entre os benefícios está a democratização do acesso. Esse crescimento, no entanto, ocorre em meio a um movimento do Ministério da Educação para endurecer as regras do ensino remoto.
O Decreto 12.456, publicado em 2025, proíbe cursos de graduação 100% a distância e obriga as instituições a incorporarem atividades presenciais e/ou síncronas (aulas ao vivo) em todos os programas, independentemente da modalidade.
A medida também veta que áreas sensíveis, como Medicina, Direito, Enfermagem, Odontologia, Psicologia e todas as licenciaturas, sejam ofertadas exclusivamente online. Em contrapartida, cria a modalidade semipresencial, que exige um percentual mínimo de atividades presenciais para garantir maior contato entre alunos e professores.
Segundo o MEC, a nova política busca elevar a qualidade e a credibilidade do EaD no País. A pasta argumenta que a necessidade de práticas em laboratórios, estágios e contato direto com professores torna algumas formações incompatíveis com o formato exclusivamente remoto.
O governo afirma querer estabelecer um “pacto pela credibilidade” do ensino a distância, reconhecendo o modelo como uma tendência mundial, mas exigindo melhorias. As instituições têm prazo para se adaptar às novas regras e adequar seus cursos às exigências do decreto. Apesar das restrições, especialistas avaliam que o EaD veio para ficar.
Em Goiás, o governo estadual e instituições privadas já começam a adaptar suas políticas para fortalecer essa modalidade. Programas de bolsas para estudantes do interior, polos de apoio presencial em cidades médias e iniciativas para idosos são exemplos de estratégias em curso.
EaD atrai idosos e transforma universidades em espaços para terceira idade
Os números mostram que o EaD não está atraindo apenas jovens, mas também adultos e idosos. Nos últimos dez anos, a participação de pessoas com 60 anos ou mais nas universidades brasileiras cresceu significativamente. Segundo estudo do Sindicato das Entidades Mantenedoras de Ensino Superior de São Paulo (Semesp), enquanto outras faixas etárias registraram queda nas matrículas presenciais, o público sênior apresentou aumento de 22% nas instituições privadas. Na modalidade a distância, o salto foi ainda maior: 672%.
Esse fenômeno também se reflete em Goiás. Muitos idosos do interior do Estado têm encontrado no EaD uma forma de voltar a estudar, atualizar conhecimentos e até se recolocar no mercado de trabalho.
“A longevidade é um fator central dessa transformação. Com o aumento da expectativa de vida, mais pessoas buscam meios de se manterem ativas física, intelectual e socialmente. E o ambiente universitário, mesmo virtual, tem se mostrado ideal para isso”, analisa Fernanda.
Segundo a professora, a educação para a terceira idade tem benefícios que vão além do aprendizado formal. “O estímulo intelectual ajuda na prevenção de doenças neurodegenerativas, melhora a saúde mental e promove a inclusão social. Participar da vida acadêmica proporciona novas amizades, conexões intergeracionais e uma sensação de pertencimento”, afirma.
Medicina, direito, odontologia, enfermagem e psicologia não podem mais ser ofertados exclusivamente online. Outras graduações nessas áreas devem ser presenciais ou semipresenciais.
Para Gomes, essas restrições são importantes para preservar a qualidade. “O aumento rápido pode pressionar as instituições a manterem padrões de qualidade. É preciso fiscalização, currículos bem elaborados e apoio pedagógico para que o diploma tenha o mesmo peso do presencial”, afirma.
Por outro lado, os dados reforçam que a educação a distância veio para ficar. “O EaD não substitui o presencial, mas amplia as possibilidades. Aos meus alunos do ensino médio, eu sempre digo: deem prioridade para o presencial, mas se não for possível, não abandonem os estudos. O EaD veio para agregar e incluir a todos”, aconselha.
Com o envelhecimento da população, o avanço da tecnologia e políticas públicas mais eficazes, a expectativa é que o EaD continue crescendo, mas de forma mais qualificada.