FDA restringe suplementos de flúor para crianças
Agência norte-americana alerta que ingestão desnecessária pode alterar microbioma intestinal
A Food and Drug Administration (FDA), agência reguladora de alimentos e medicamentos dos Estados Unidos, anunciou novas restrições para o uso de medicamentos e suplementos ingeríveis com flúor em crianças. A decisão marca uma mudança importante nas diretrizes sobre o consumo do flúor, tradicionalmente associado à prevenção de cáries, mas que, segundo novas evidências, pode causar efeitos adversos quando ingerido em excesso.
A revisão científica que motivou as medidas apontou benefícios limitados da suplementação oral de flúor na prevenção de cáries, especialmente em populações que já têm acesso à água fluoretada e cuidados odontológicos regulares. Em contrapartida, foram observados riscos potenciais à saúde, incluindo alterações no microbioma intestinal — o conjunto de micro-organismos que habita o trato digestivo — e a ocorrência de fluorose dentária, condição caracterizada por manchas e fragilidade nos dentes em formação.
Medidas e orientações

crianças e adolescentes com maior risco de cáries devido à baixa
concentração de flúor na água potável local. (Imagem: Getty Images/iStockphoto)
Com base nas novas evidências, a FDA enviou notificações a quatro empresas que comercializam suplementos do mineral sem aprovação, especialmente aqueles rotulados para uso em crianças menores de três anos ou em crianças com baixo risco de cárie. A agência destacou que esses produtos não passaram pelo processo formal de avaliação de segurança e eficácia, e, portanto, não devem ser indicados de forma rotineira.
Além disso, o órgão emitiu comunicados direcionados a profissionais de saúde, como pediatras e dentistas, com orientações atualizadas sobre o uso responsável do flúor em pacientes infantis. Segundo a nota oficial, o foco deve ser o uso tópico do flúor — por meio de cremes dentais e vernizes — em vez da ingestão oral, que apresenta um risco desnecessário de acúmulo da substância no organismo.“Existem maneiras melhores de proteger os dentes das crianças do que ingerir flúor não aprovado, que agora se sabe que altera o microbioma intestinal”, afirmou o comissário da FDA, Marty Makary, em comunicado.
O flúor é um elemento essencial na formação e na manutenção do esmalte dentário. Em doses adequadas, ele ajuda a fortalecer os dentes e prevenir a cárie, interferindo na capacidade das bactérias de produzir ácidos que corroem a superfície dental. No entanto, o consumo acima do necessário pode ter o efeito contrário.
A fluorose dentária, condição mais comum associada ao excesso de flúor, ocorre durante a formação dos dentes — geralmente até os oito anos de idade. Os sinais variam de pequenas manchas brancas no esmalte a alterações mais severas, com escurecimento e fragilidade estrutural. Embora a maioria dos casos seja apenas estética, as formas mais graves podem comprometer a resistência dos dentes e exigir tratamento odontológico corretivo.
Estudos recentes também vêm associando o excesso de flúor à alteração do microbioma intestinal, um tema ainda em investigação científica, mas que levanta preocupações pela importância desse ecossistema na imunidade, na digestão e até na regulação de processos neurológicos.
Contexto internacional e situação no Brasil

Nos Estados Unidos, o debate sobre a fluoretação da água e o uso de suplementos é antigo. A política de fluoretação, iniciada nos anos 1940, é considerada uma das medidas de saúde pública mais eficazes na prevenção de cáries. No entanto, com o avanço do acesso à água tratada e à higiene bucal, a suplementação oral perdeu relevância.
No Brasil, a adição de flúor na água é obrigatória em municípios com sistema de abastecimento público, de acordo com a Lei Federal nº 6.050/1974. A concentração ideal de flúor na água, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), deve variar entre 0,6 e 0,8 miligramas por litro (mg/L) — faixa considerada segura e eficaz na prevenção da cárie.
A recomendação é que seja usado com acompanhamento profissional, sobretudo em crianças. Os suplementos em gotas, pastilhas ou comprimidos, comuns em décadas passadas, eram indicados apenas para crianças que viviam em regiões sem água fluoretada — algo cada vez mais raro nas áreas urbanas brasileiras.
Repercussão e novos caminhos
A decisão da FDA repercutiu entre entidades odontológicas e pediátricas nos EUA e no exterior. Para especialistas, a medida reforça a necessidade de revisar antigas práticas preventivas, alinhando-as às novas evidências científicas. O consenso atual é que a proteção contra cáries deve se basear em higiene bucal adequada, alimentação equilibrada e uso tópico, evitando a exposição desnecessária por via oral.
Embora ele continue sendo um aliado importante da odontologia moderna, a nova diretriz da FDA serve como um alerta global: até mesmo substâncias benéficas exigem dosagem e contexto corretos para que o benefício não se transforme em risco.
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