Em vez de atrapalhar, Flávio ajuda a direita sendo candidato
Caiado aconselha desde o início que Lula deve ser enfrentado por diversos adversários que, como aconteceu no Chile, se unirão contra a esquerda
Óbvio, ninguém entrevistou Jair Bolsonaro após iniciar o cumprimento da pena imposto pelo Supremo Tribunal Federal. Mas a mulher, Michelle, confirma o que disse em público dia 5 de dezembro o enteado senador no Rio de Janeiro: o ex-presidente quer Flávio candidato ao Palácio do Planalto. E parece que não é apenas ele: está bem no enfrentamento a Lula, que é candidato a presidente desde outubro de 1988, quando a nova Constituição restituiu a votação direta. São duas semanas contra 27 anos.
No início, quando o filho começou com essa conversa, pensava-se que a desistência viria com rapidez. Nada. Flávio está conseguindo algo ainda inédito para seus concorrentes internos na direita, uma agenda de presidenciável.
O excesso de reportagens e editoriais contra a escolha de Jair pai revela o incômodo com a pré-campanha de Flávio.
Na vinda a Goiânia, o senador do PL se encontrou com o governador Ronaldo Caiado (União Brasil), que também almeja o lugar de Lula. A ideia de Jair combina com a de Ronaldo: saem vários e, no 2° turno, quem for terá o apoio dos demais. O que Caiado apregoa foi justamente o ocorrido no Chile. José Antonio Kast contou com os da direita que caíram no 1° e ganhou da esquerdista Jeannette Jara, apoiada pelo presidente no cargo, Gabriel Boric.
A força de Jair Bolsonaro é tamanha que, mesmo apanhando mais que cavalo de carroceiro sádico nos últimos nove anos, ainda é o único a superar Lula. Michelle também se sobressai diante do inimigo do marido. Seu outro enteado parlamentar federal, o deputado recém-cassado por falta Eduardo, esteve com esse pensamento. Porém, esbarrou no mesmo ministro que levou seu pai à prisão, Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal.
A entrada de Flávio no rol dos presidenciáveis ajudou a captar ajuda. Tem gente que só entra no palanque se o candidato tiver o sobrenome Bolsonaro. Essa senha abre portas e corações dos fãs. Os antis são muitos, mas ninguém precisa de unanimidade, de que nem Jesus dispõe [3 detalhes, não se está comparando esses pecadores ao Cristo, a última eleição presidencial decidida em 1° turno foi a de 1994, toda unanimidade é burra, disse Nelson Rodrigues].
Na estratégia de Caiado, além de Flávio continuar no páreo, igualmente serão candidatos os seis principais governadores da direita: ele mesmo, mais Tarcísio de Freitas (Republicanos de São Paulo), Romeu Zema (Novo de Minas Gerais), Cláudio Castro (PL do Rio de Janeiro), Ratinho Jr. (PSD do Paraná) e outro Eduardo e também do PSD, o Leite, do Rio Grande do Sul.
Nenhum deles tem qualquer aproximação com a esquerda, ao contrário de seus partidos. Fora Novo e PL, as siglas estão enfronhadas no governo federal, com cargos no 1° escalão e milhares nos postos inferiores. Ou seja, os governantes são melhores que suas agremiações, em termos de trato — o próprio Lula vem sofrendo com essa desfaçatez, sendo derrotado no Congresso Nacional com votos de quem indicou ministros.
Provável 2° turno pode acabar com polarização
Desde os anos 1960, o Brasil só foi administrado pela direita em 2019 e 2020, primeira metade do governo de Jair Bolsonaro. Os demais foram do regime militar, os cinco anos de José Sarney e os dois de Michel Temer, ambos dominados pelo Centrão, que absolutamente não tem ideologia — pagou, levou. Nos dois mandatos de Fernando Henrique Cardoso, um e meio de Dilma Rousseff e três de Lula, tudo esquerda. Havia polarização, mas entre esquerda de um lado e esquerda de outro. A quebra de vínculos ocorreu em 2017 e 2018, quando o primeiro pré-candidato a presidente da República teve a coragem de se dizer representante da direita.
O sujeito é Jair Bolsonaro, que em três anos derrotou a esquerda inteira, o Centrão, os isentões, a mídia invencível nos últimos dois séculos e um inimigo literalmente mortal, a Covid-19. Mas não contava com a astúcia do Judiciário, um adversário tenebroso porque não se submete a urnas nem a organismos de controle. Acima de seus 11 ministros, apenas Deus.
Portanto, estava estabelecido o contraditório que permanece, não é entre direita e esquerda, mas entre Bolsonaro e o restante. Quando o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, foi comunicado por Flávio da escolha de Jair, de imediato anunciou que será candidato à reeleição. Está um amor danado entre Tarcísio, que foi ministro da Infraestrutura no Governo Bolsonaro, e Flávio. Porém, o ideal é que também ele se candidate. Assim, fica mais fácil repetir o Chile.
Se o 2° turno for de Lula com qualquer outro que não seja Flávio, espera-se que acabe a parte brutal da polarização, assassinatos inclusos.