Mama África: dia da libertação
Amanhã é comemorado o Dia da Libertação da África em reconhecimento à luta pela descolonização dos países do continente
Elisama Ximenes
Dia da Libertação da África ou Dia Internacional da África. 25 de maio (amanhã) é a data oficial para que todo o mundo lembre e milite pela libertação da África do colonialismo. No Brasil, em específico, a história dos povos africanos foi negada e rejeitada pelas cartilhas escolares e projetos pedagógicos do Ministério da Educação. Somente em 2003 essa história mudou, com a sanção da lei No 10.639. A lei inclui, no currículo oficial da Rede de Ensino, a obrigatoriedade da temática História e Cultura Afro-Brasileira. Na terra da diversidade étnico-racial, seria contraditório ignorar toda a história de nossos ancestrais, roubados de seu local de origem e escravizados no Brasil.
O Dia Internacional da África foi instituído em 1972, pela Organização das Nações Unidas (ONU). A data foi estabelecida em reconhecimento ao dia 25 de maio de 1963, quando chefes de Estados africanos reuniram-se em Adis Abeba, capital da Etiópia. A reunião visava a erradicar a subordinação do continente africano aos demais continentes imperialistas. O estabelecimento, portanto, agiu como um afirmação da luta contracolonizadora dos povos africanos. Também neste dia, fundou-se a Organização da Unidade Africana (OUA), que tem como objetivo manter a unidade e a solidariedade africana, eliminar o colonialismo, garantir a soberania dos Estados Africanos e a sua integração econômica, além de fomentar a cooperação política e cultural no continente.
A migração histórica dos povos da África para o Brasil tem ganhado uma nova abordagem com o Programa Estudante-Convênio de Graduação (PEC-G). Quer dizer, a migração passa a ser pelo intercâmbio de estudantes Brasil – África. Segundo o decreto nº 7.948, que regulamenta o programa, o “PEC-G destina-se à formação e qualificação de estudantes estrangeiros por meio de oferta de vagas gratuitas em cursos de graduação em Instituições de Ensino Superior – IES brasileiras”. Eufrásia Songa, ou Nahako Songa, é uma das estudantes contempladas pelo projeto. A angolana veio para o Brasil em 2011.
Nahako cursou jornalismo na Universidade Federal de Goiás (UFG) até o ano de 2014. Hoje, cursa mestrado em Antropologia da mesma universidade. “O PEC-G serviu de divisor de águas na minha vida. É um pedaço de vida que venho passando no Brasil e que vem influenciando na definição daquilo que penso em ser/ter num futuro profissional próximo”, contou Eufrásia. Ela considera, ainda, que a sua vinda serviu de oportunidade para contribuir para a elucidação para aspectos do continente africano desconhecidos pelos brasileiros.
A angolana reforça, ainda, que a migração primária de povos africanos para o Brasil deve-se ao fato de “várias pessoas africanas terem sido levadas, forçadamente, ao Brasil como escravas”, fato que marca a diáspora africana no Brasil. “Portanto celebrar o dia 25 de maio é, também, uma forma de relembrar as lutas e consequentes conquistas do povo africano dentro e fora do continente”, declara. A formação, em que investe a mestranda, serve ainda como forma de se afirmar no país sul-americano e, segundo ela, como maneira de ajudar na emancipação de seu país de origem.
De turbante amarelo na cabeça, a geógrafa, Ana Lúcia Lourenço, lembra “que a formação do povo brasileiro está completamente ligada historicamente à diaspora de povos africanos”. Todavia não seria para menos a comemoração do Dia da Libertação da África neste país. Militante, Ana Lúcia também reitera que “a valorização da população negra e da história da África e da população negra no Brasil é luta histórica do movimento negro”. Dessa maneira, Ana reforça que o protagonismo da conquista deste dia é de gente negra, que luta diariamente pela afirmação da cultura de nossos ancestrais.
“Embora a data tenha sido instituída alguns anos depois de vários países terem se tornado já independentes, esse dia será sempre de grande importância, pois lembra a luta pelo fim das colonização e neocolonização”, declara Eufrásia. Gana, que significa Rei Guerreiro, foi o primeiro país a se tornar independente, em 6 de março de 1957. A autonomia total deste país, no entanto, só foi conquistada em 1960.
Cultura
A data, ainda, reconhece a importância da cultura africana para a construção histórica dos outros povos que escravizaram e forçaram a migração africana para seus respectivos países. No Brasil, por exemplo, essa influência vai das roupas, comidas, canções às religiões. No caso da última, os cultos de matriz africana têm forte origem nos Bantos, etnia predominante dos povos escravizados no Brasil. Como se sabe, para continuarem cultuando seus ancestrais, os negros acabaram por se apropriar da religião cristã e, daí, surgem religiões como o Candomblé e a Ubanda.
Patrick de Oliveira é babalaô do culto de Ifá, que é uma religião tradicional Yorubá, africana. “Ifá quer dizer ‘voz’ e é o código pelo qual Deus e os orixás se comunicam, se revelam aos homens”, explica. Patrick também explica que, para os povos africanos, a palavra ‘religião’ não é muito apropriada. “‘Religião’ vem de ‘religar’, e para os povos africanos isso não faz sentido, porque entende-se que já estamos ligados com as divindades e os ancestrais; não há a necessidade ocidental de se religar”. O babalaô ainda menciona a religião de matriz africana, mas fortemente indígena, o Terecô, predominante na cidade de Codó, do Maranhão.
Cabelo
Ainda no processo de afirmação negra no ocidente, o cabelo aparece como forte instrumento de empoderamento. Sophia Costa é estudante de Publicidade, negra, e sabe muito bem disso. Durante a graduação, ela entendeu que não precisava mais alisar seus cabelos e, desde então, segue em um processo constante de luta. Para seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), Sophia realiza um projeto-manifesto, em forma de exposição fotográfica de mulheres negras. Segundo ela, o projeto “visa a levantar uma reflexão sobre o papel do cabelo na construção da identidade da mulher negra”.
Dessa forma, 12 mulheres foram fotografadas utilizando acessórios e pinturas características da cultura africana. Raízes é um manifesto que age na construção e afirmação da identidade da mulher negra. Em seu trabalho, Sophia retrata as mulheres como Deusas, Rainhas e Guerreiras, como uma forma de resgate da cultura ancestral e empoderamento. Sophia desabafa: “É incrível como, quando essas mulheres fazem o caminho inverso e tentam resgatar suas raízes por meio de seus cabelos, elas passam a não só se aceitar como a se empoderar”.