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domingo, 24 de novembro de 2024
Entrevista Cissa Guimarães

Entre doida e santa, melhor o equilíbrio

Espetáculo ‘Doidas e Santas’ estreia hoje em Goiânia

Postado em 15 de julho de 2016 por Sheyla Sousa
Entre doida e santa
Espetáculo ‘Doidas e Santas’ estreia hoje em Goiânia

Elisama Ximenes

Nem doida, nem santa, assim é Cissa Guimarães. A atriz, com 40 anos de carreira, estreia a peça Doidas e Santas, nesta sexta-feira – com sessões no sábado e no domingo – em Goiânia. Desta vez, ela não só protagoniza como também é a idealizadora do projeto. É a primeira vez em que a atriz trabalha na produção, e não somente na atuação. O espetáculo foi montado com base na obra de Martha Medeiros, sob mesmo nome. O conteúdo trabalha com os conflitos da mulher moderna. Beatriz, a personagem principal, leva uma vida aparentemente comum até perceber que não está feliz no casamento. O enredo é desenvolvido conforme a personagem principal lida e enfrenta o conflito. 

Segundo Cissa, o principal mote da peça é trabalhar com a liberdade da mulher. Nesse sentido, a história consegue levantar a discussão sobre a felicidade da mulher ligada a um relacionamento com um homem. Como se ela não conseguisse ser feliz só. Dessa maneira, o texto consegue abordar as possibilidades de felicidade que ganha a mulher moderna. No enredo isso dá na medida em que Beatriz percebe as posturas machistas e possessivas do marido. Nesse processo de desconstrução, a protagonista começa a experimentar a vida com a liberdade que merece. O texto foi adaptado por Regiana Antonini, e o espetáculo é dirigido por Ernesto Piccolo. Já o elenco é formado por Cissa Guimarães, Giusepe Oristanio e Josie Antello. Em entrevista ao Essência, a idealizadora do projeto (Cissa) fala sobre o processo de construção da peça e discute sobre gênero e política.

SERVIÇO

‘Doidas e Santas’

Quando: 

• Hoje, às 21h

• Sábado, 21h

• Domingo, 20h

Onde: Teatro Goiânia

Horário: 20h

Ingressos: 

R$ 70 (inteira) e R$ 35 (meia)

Primeiro, gostaria que você contasse como surgiu a ideia de fazer uma peça em cima da obra Doidas e Santas. Como você conheceu o trabalho de Martha Medeiros?

Desde a primeira vez em que eu li o livro, me identifiquei, porque era uma situação que eu gostaria de abordar. Eu queria falar, de uma maneira real, sobre as mulheres que chegam aos 50 anos, casadas, com filhos e uma carreira legal, assim como eu. E, aí, me deparei com os textos da Martha. Entrei em contato, e ela passou a acompanhar e estimular todo o processo. Ao final, nos tornamos amigas, e eu a respeito demais, ela sabe tocar as pessoas. Eu tenho muito orgulho desta amizade.

É a sua primeira produção em 40 anos de carreira no teatro. Qual a diferença, para você, entre atuar e ser a idealizadora de um espetáculo? Como você avalia essa experiência?

Não foi fácil. Ainda mais neste País, onde nada é simples de se resolver. São muitos os entraves para a cultura, e isso é uma coisa muito triste. É tudo uma luta injusta, mas, ao mesmo tempo, é uma forma de se tornar independente, de não esperar alguém te chamar para trabalhar. No momento em que você consegue se produzir, faz na hora, no jeito que quer e com quem deseja. Então isso é muito bom. Mas, ao mesmo tempo, é ruim, porque o governo lida mal com as leis de incentivo. O que eu posso dizer é que cada vez fica mais difícil produzirmos alguma coisa. Eu acredito que um país sem cultura e educação é um país burro. Temos de parar e repensar tudo isso.

O conteúdo reflete as dificuldades que as mulheres enfrentam para conciliar a tripla jornada e tudo que se exige de um estereótipo de mulher. Por que você escolheu esse tema?

Não teve a preocupação de se escolher um gênero. Até porque o Doidas é uma comédia romântica, que emociona muito. Eu queria produzir algo que falasse de mulheres nos dias de hoje, até que eu me deparei com o texto de Martha Medeiros. Eu simplesmente adorei, tanto que liguei para ela, e a escritora disse que iria lançar o livro. A partir daí, nos conhecemos, e eu resolvi abraçar com unhas e dentes esse livro, que fala sobre assuntos de relação.

Um dos dramas da personagem principal é ter que lidar com um marido machista e possessivo que não aceita a separação. Como você acha que nós, mulheres, podemos enfrentar esse tipo de posicionamento dos homens?

A minha personagem, Beatriz, demora muito tempo para realizar que está com um casamento infeliz, com uma vida infeliz. Eu, Cissa, não tenho essa questão. Talvez seja uma pessoa mais libertária. Mas, enfim, eu queria focar na liberdade que a mulher está conquistando na própria vida. Então, de vez em quando, nós, mulheres, achamos que, porque temos um marido, porque somos casadas, temos uma casinha e um emprego garantido, estamos felizes. Mas, na verdade, são todos rótulos que a sociedade nos impõe. ‘Ai, eu sou uma mulher casada, eu tenho meu marido!’. E, dentro de casa, você não faz amor há um tempão, é um beijinho no rosto, você mal fala com aquela pessoa. Eu acho que a peça acontece muito nessa discussão: é isso que é a felicidade? Quem sabe a gente não pode ser feliz sozinha também ou ter outro tipo de felicidade? O botão que aciona essa reflexão para a Beatriz é muito interessante, assim como a maneira como ela conduz a quebra de paradigma na vida dela. Mas também uma coisa pela qual eu lutei muito – durante o processo da adaptação do texto que eu fiz junto com a Regiana – era não cair naquele clichê de falar mal dos homens. “Nós somos mulheres incríveis. Os homens são todos uns bobões”. Não, não. E, com o personagem do Orlando, que é interpretado lindamente pelo Giuseppe Oristânio, os homens ficam enlouquecidos. É ele que retoma aquela discussão. É muito bonito, eu não vou contar, porque vocês têm que ir lá ver.

E você? Considera-se mais doida ou mais santa? 

Acho que um pouco dos dois. Meu negócio é a fé, e viver o aqui e agora. Eu me jogo de cabeça, em qualquer coisa que faço, e mantenho o foco. Sou muito sincera e sempre digo que tenho um pacto com a alegria e Deus. Trabalho o tempo todo para minha evolução e tenho o desejo de me tornar uma pessoa cada vez melhor em busca do equilíbrio saudável. Mas também não adianta eu ser melhor sozinha. Procuro sempre estar de bem com tudo e todos de uma maneira natural. Tento fazer as coisas para ser feliz.

Como é chegar aos 40 anos de carreira?

É um momento muito rico. A gente vai conquistando um pouquinho aqui, um pouquinho ali. Eu acho que é o momento da minha colheita, digamos assim. Eu semeei, semeei, semeei, e estou colhendo frutos maravilhosos. Minha palavra de ordem é gratidão. Eu só posso agradecer por esse momento que estou vivendo, em que cheguei por meio de muita luta. Eu acredito que é assim que a gente consegue as coisas. Acho que, quando as coisas caem de graça, não têm esse sabor tão gostoso, sabe? Eu comecei a trabalhar com 17 anos; hoje tenho 58: são 40 anos de trabalho árduo. Só posso agradecer, porque faço aquilo que amo e recebo um calor humano enorme do meu público. Só espero compartilhar todo esse afeto que eu recebo por meio do meu trabalho.

Você está com alguma expectativa específica com relação ao público goiano?

Eu estou muito ansiosa, porque Goiânia é uma cidade que prestigia muito o teatro e gosta de cultura. É uma cidade onde a gente adora se apresentar, porque é uma das praças em que fomos mais bem recebidos. O público de Goiânia acolhe a cultura de uma maneira muito forte. E não é nenhuma novidade o que eu estou dizendo: é uma coisa que todo mundo sabe. É mais uma alegria para a gente, é mais um frio na barriga – no bom sentido, sabe? 

 

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