Crise deve aumentar pressão no governo federal
A falta de recursos, combinada às exigências cada vez maiores da população, será um conflito de grandes proporções
Dois meses após o impeachment que afastou definitivamente a presidente Dilma Rousseff (PT) da Presidência da República, o resultado das eleições municipais vai evidenciar a hegemonia de uma nova articulação político-partidária no País. No entanto, calculadamente escondida durante as campanhas eleitorais, a crise financeira que atinge o caixa da ampla maioria das prefeituras poderá resultar numa imensa rede de pressão sobre o Congresso Nacional e o governo Michel Temer, avaliam representantes de entidades municipalistas.
"Politicamente, os novos prefeitos vão chegar cheios de sonhos, promessas e boas intenções. Houve mais de 70% de renovação. Terão um choque. Essa falta de recursos, combinada às exigências cada vez maiores da população, será um conflito de grandes proporções", prevê o prefeito de Belo Horizonte, Marcio Lacerda (PSB), que também é presidente da Frente Nacional dos Municípios.
Paulo Ziulkoski, presidente da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), também descreve um quadro nada atrativo para os novos administradores. Recente levantamento da entidade revelou que 77,4% dos municípios (um total de 3.155 cidades) informaram ao Tesouro Municipal que suas finanças estão no vermelho.
Cenário este agravado, segundo relatos, pela queda real nos repasses do Fundo de Participação dos Municípios –a principal fonte de recursos das prefeituras– e pela redução das transferências voluntárias, repasses por meio de convênios assinados com o governo federal.
"No período que o Brasil estava vivendo o apogeu do crescimento, na época das commodities, da alta arrecadação e dos programas de transferência, havia uma influência positiva dessa base. Já no governo Temer, será o contrário", diz Ziulkoski. "Temer será infinitamente mais cobrado. Ele não tem um centavo novo para nada."
O prefeito eleito de São Paulo, João Doria (PSDB), já fez na semana passada uma peregrinação a Brasília para cobrar a liberação do governo federal de R$ 400 milhões em recursos do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento). A disposição do futuro administrador da maior cidade do País indica como se dará a relação política entre os municípios e a União.
'Via-crúcis'
"O fato de a base aliada ganhar prefeituras não significa nada além de que os prefeitos vão fazer via-crúcis na porta do Palácio do Planalto. O Brasil está na penúria, todos os prefeitos vão fazer o mesmo caminho que Doria fez", avalia o cientista político Jairo Nicolau.
A capacidade de pressionar o governo federal por mais recursos foi usada como trunfo eleitoral durante a campanha no segundo turno. Alguns candidatos apostam até em relações familiares.
É o caso de Silvio Barros, que concorre pelo PP em Maringá, no Paraná, e é irmão do ministro da Saúde, Ricardo Barros, também do PP. "Nós estamos alinhados com o governo e meu irmão é ministro da Saúde. Essa ligação é um diferencial positivo, porque, assim, as coisas tendem a ser menos difíceis para a cidade", afirmou Silvio.