Óculos de sol de brinquedos podem prejudicar a visão da criança
Em países ensolarados, exposição intensa sem proteção pode intensificar danos oculares
Crianças, especialmente as meninas, adoram incluir os óculos de sol no visual. É o caso de pequena Bárbara, de 3 anos. A menina já teve dois óculos de brinquedos lindos e coloridos. Toda vez que entra no carro e vê os pais com o acessório, pede um insistentemente. Encontrados com facilidade em camelódromos ou bancas de ruas, os óculos infantis parecem inofensivos, mas, sendo um produto sem qualidade, eles podem representar perigo para a saúde dos olhos.
O problema é que os óculos de brinquedos, se usados sob intensa exposição solar, comprometem o sistema ocular justamente porque as lentes não possuem o fator de proteção adequado de 400 nanômetros, unidade de medida padrão que define a qualidade de proteção das lentes. A luz passa sem filtro nenhum. Conforme o Sistema Internacional de Pesos e Medidas, 1 nanômetro equivale a 1mm (a menor parte de uma régua, por exemplo) dividido 1 milhão de vezes. Essa unidade é usada para medir o comprimento de onda de luz visível.
Além disso, como os efeitos da radiação são cumulativos, em médio ou longo prazo podem provocar doenças nos olhos desde a infância ou adolescência. O oftalmologista Leonardo Mariano Reis, presidente do Conselho Regional de Medicina de Goiás (Cremego), explica que a radiação solar cumulativa pode originar desde pterígio,uma formação carnosa que avança sobre a córnea, geralmente do lado nasal, a tumores conjuntivais e palpebrais. “Pode ainda acelerar o desenvolvimento de catarata e danos na retina, como a retinopatia solar, e a degeneração macular, que pode causar danos irreversíveis à visão”, acrescenta.
A alta incidência dos raios solares em países localizados próximo às zonas tropicais, caso do Brasil, aceleram os prejuízos à saúde da visão. Na Austrália, um país de clima tropical como o nosso, os óculos de sol são parte do uniforme escolar das crianças. Lá, os pequenos são habituados a usar o acessório mais por questão de saúde do que de estética. Não por acaso, Brasil e Austrália são os dois únicos países no mundo onde o fator de proteção solar nas lentes é de 400 nanômetros, e não de 380 como na maioria dos outros.
O ideal é que a prevenção comece na infância. O oftalmologista reforça a importância do uso de óculos de sol, principalmente em ambientes externos, mesmo em países de clima temperado, durante o verão. “Vi crianças com idade entre 3 a 5 anos usando óculos regularmente na França”, conta. O médico chama a atenção para a importância do exame com oftalmologistas para verificar se a criança não apresenta problema refrativo ou doença ocular antes de comprar óculos de sol.
A empresária Geyse Rodrigues, mãe de Bárbara, deixou que a filha usasse por pouco tempo os óculos de brinquedo. “Sempre desconfiei que esses produtos pudessem comprometer a saúde”, afirma. Para agradar a filha, Geyse pretende comprar um acessório específico para a idade da menina numa ótica especializada e deixar a criança usar sempre sob a supervisão dos pais.
Óculo infantis também devem seguir padrão ABNT
Da mesma forma que deve ocorrer com os adultos, os óculos infantis precisam seguir padrões de qualidade, em conformidade às normas da ABNT. “Uma proteção adequada deixa de sobrecarregar o sistema visual, evitando o aparecimento de doenças lá na frente. Situações que, infelizmente, o Brasil já vem enfrentando de forma negativa, em que cada vez mais o índice de catarata é precoce, dentre outros problemas de saúde visual”, alerta Leandro Luiz Fleury Rosa, presidente do Sindicato do Comércio Varejista de Material Óptico, Joias, Relógio, Cine-Foto e Bijuteria de Goiás (Sindióptica-GO).
O Sindióptica-GO está envolvido em um trabalho intenso de conscientização do consumidor para evitar a compra de óculos piratas, sem procedência e fora das especificações vendidos no comércio informal. “Geralmente, são óculos que só escurecem e não filtram a ação dos raios, o que o torna ainda mais perigoso para a saúde. No escuro, as pupilas dilatam, e isso facilita a entrada de radiação, provocando danos ainda maiores”, afirma o presidente da entidade. Ele orienta o consumidor a desconfiar se os óculos forem muito baratos, se as armações tiverem rebarbas, manchas ou as lentes apresentarem riscos, por exemplo.
No Brasil, ainda não há uma recomendação oficial sobre a melhor idade para começar a usar os óculos de sol, mas o oftalmologista Leôncio Queiroz Neto – diretor do Instituto Penido Burnier, em São Paulo, membro do Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO), Associação Panamericana de Oftalmologia (PAAC) e consultor da Associação Brasileira de Indústrias Ópticas (Abiótica) – explica que os óculos de sol devem ser usados sim a partir dos 10 anos de idade, pelo menos, em ambientes onde haja exposição solar intensa.
Antes disso, acredita o especialista, não convém porque o escurecimento das imagens pode comprometer o desenvolvimento da visão das crianças, que só está completamente moldado após essa idade. Mas, entre os especialistas, há controversa sobre a melhor idade para começar a usar acessórios, ainda que a maioria concorde sobre a importância dos óculos de sol na prevenção de algumas doenças.
A Associação Espanhola de Pediatria (AEP) é uma das entidades que também insistem no uso de óculos de sol homologados para crianças para evitar graves problemas – como a perda da visão em longo prazo. Essa prevenção tem reflexos diretos na saúde pública do País, já que reduz significativamente, não apenas os casos de catarata, mas de outras doenças dos olhos, dentre elas, o pterígio, uma das mais comuns em países tropicais.